Introdução
O facto de, nos nossos dias, o mundo se confrontar com uma realidade demográfica marcada por um crescendo contínuo de população envelhecida, significa que, mais do que nunca, muitos indivíduos atingem a designada fase da velhice, evidenciando-se, assim, um aumento da longevidade humana. Efetivamente, a melhoria nos cuidados de nutrição, saúde, higiene, habitação, bem como das condições económicas e de sociabilidade, possibilitaram mais e melhores oportunidades de prolongar a qualidade de vida, bem-estar e saúde, contribuindo para uma verdadeira recontextualização da fase mais tardia da vida.
Esta viragem na forma de viver e compreender o processo de envelhecimento e a velhice deu origem, na base dos estudos de Rowe & Kahn (1987), ao denominado paradigma do envelhecimento bem-sucedido. A inovação do estudo de Rowe & Kahn (1987), evidencia-se no facto de revelar que o processo de envelhecimento, contrariamente a um visão mais tradicional que o caracteriza apenas como um processo patológico marcado por doenças, perdas e declínios, pode, efetivamente, revestir-se de mais duas tipologias: como um processo normal, ou seja, não se caracterizando como patológico apresentar alto risco de doença, ou pode, ainda, apresentar-se como um processo bem-sucedido, um processo de envelhecimento com baixo risco de doença e elevado nível de funcionamento motor e mental.
O desenvolvimento da investigação em busca dos critérios e determinantes do envelhecimento permitiu aos autores referidos, uma década após o seu primeiro estudo, apresentarem uma definição alargada e sustentada de envelhecimento bem-sucedido que pressupõe a conjugação de três fatores: baixo risco de doença e incapacidades relacionadas com a doença, elevado nível de funcionamento físico e mental e participação e envolvimento com a vida (Rowe & Kahn, 1997). Independentemente da designação que este novo paradigma de entender o processo de envelhecimento foi adquirindo (bem-sucedido; positivo; saudável; ativo, etc), foi consolidando um conjunto de ideias fundamentais consensualmente aceites pela grande maioria dos investigadores: a heterogeneidade e singularidade da forma como se evidencia o processo de envelhecimento; a sua multidimensionalidade integrando dimensões objetivas e subjetivas, evidenciar-se numa de três tipologias: patológico, normal ou bem-sucedido e a ideia de que um processo de envelhecimento bem-sucedido supõe a conjugação de três componentes: bom nível de saúde; elevado nível de funcionamento e participação ativa e envolvimento com a vida.
Fundamentalmente a partir de 2002, quando a World Health Organization define o envelhecimento ativo como “o processo de otimização de oportunidades para a saúde, participação e segurança, no sentido de aumentar a qualidade de vida durante o envelhecimento” (World Health Organization, 2002), que, de algum modo, reforça as ideias chave do paradigma do envelhecimento bem-sucedido que, entretanto tinha vindo a consolidar-se, começam a ser trabalhados de forma mais generalizada e sistemática um conjunto de fatores que contribuem para a manutenção da saúde, do funcionamento físico e cognitivo, de estilos de vida saudável e qualidade de vida. No âmbito desta tomada de consciência do papel que cada um tem na manutenção da sua saúde e da forma como as opções que cada um faz contribuem para o seu processo de envelhecimento, é, também, assumida definitivamente a diretriz que, no enquadramento do paradigma do envelhecimento bem-sucedido, refere o compromisso, a participação e o envolvimento social enquanto um dos componentes importantes do envelhecimento bem-sucedido. Muitos estudos entre os quais o de Inouye, et al. (2018), comprovam que a participação em atividades educativas, sociais e de lazer promovem o bem-estar e emoções positivas nos idosos, para além de comprovarem, também, as descobertas da Psicologia do Desenvolvimento de que a plasticidade neuronal e a capacidade de aprender se mantêm ao longo da vida. Efetivamente, a vasta plêiade de investigações levadas a cabo têm vindo a comprovar que a oferta de atividades, programas e projetos educativos para a terceira idade se evidencia como um fator fundamental para a promoção de um envelhecimento bem-sucedido.
Em Portugal, embora a educação na e para a terceira idade não faça parte da agenda das políticas públicas de educação, temos vindo a assistir a um crescendo da oferta de atividades, programas e projetos educativos para a população idosa, a grande maioria da responsabilidade de entidades civis. A intervenção educativa que está na base deste trabalho representa uma dessas modalidades: As Oficinas 55+. Enquanto um projeto de intervenção educativa não formal, as Oficinas 55+ têm como finalidade transformar o tempo livre dos adultos e adultos idosos em oportunidades de educação/aprendizagem e desenvolvimento humano. Estas oficinas têm vindo a afirmar-se como uma modalidade educativa que motiva e atrai a população adulta e idosa, na medida em que, enquanto uma intervenção educativa não formal, envolve os participantes em iniciativas e atividades educativas que vão ao encontro das suas necessidades e interesses, proporcionando a estimulação física e cognitiva, o reforço das relações interpessoais, o convívio e o lazer.
Esta é mais uma modalidade de intervenção educativa que, corroborando o pensamento de vários autores (Inouye, et al., 2018; Gitto, 2018) evidencia que a educação ao longo da vida é um elemento crucial num processo de envelhecimento saudável e ativo. O envolvimento e participação em atividades educativas, sociais ou de lazer, possibilita aos idosos, aproveitar e viver a vida de uma forma mais plena, útil e satisfatória, desencadeando uma verdadeira recontextualização das suas vidas na medida em que potencializa a reconstrução da autoestima e autoconfiança, a manutenção e, em alguns casos, o melhoramento do funcionamento físico e cognitivo, acompanhar novas realidades e os desenvolvimentos tecnológicos, adquirir novos conhecimentos e ter acesso a novas informações obtendo, assim, recursos que lhes permitem superar algumas perdas próprias da idade e, ganhar novas capacidades que ajudam a enfrentar os desafios de uma sociedade muito tecnologizada da qual não se sentem fazer parte (Martín, 2018), com vista a uma melhor integração e participação cultural e social, tornando possível manter uma maior sensação de satisfação e bem-estar (Marsilhas, et al, 2017; Flecha, 2019; Bermejo, et al, 2021; López, 2021).
O envolvimento em atividades favorece, ainda, a construção de novos relacionamentos interpessoais, contribuindo para o reforço das relações sociais e o convívio favorecendo o florescimento de emoções positivas (Inouye, et al, 2018). Esta nova forma de estar na vida, contribui, ainda, para amenizar os sentimentos de isolamento e solidão que geram emoções negativas e desagradáveis em qualquer fase da vida mas que na terceira idade afetam decisivamente a saúde e bem-estar como referido em alguns estudos (López & Díaz, 2018; Yanguas, et al., 2018; Pinazo, 2020).
As Oficinas 55+ têm-se revelado uma excelente resposta para os adultos idosos em idade de pré ou início de reforma que tendo mais tempo livre, pretendem continuar envolvidos em atividades de educação-aprendizagem. Os adultos idosos têm já uma vasta experiência de vida, assim como um conjunto de conhecimentos, crenças e valores e as razões pelo gosto e vontade de continuar a aprender, normalmente, relacionam-se com a sua própria história de vida. Neste sentido, as razões para continuar envolvidos em atividades educativas podem ser muito variadas: conhecer mais sobre determinados assuntos sobre saúde, segurança e outros; conhecer melhor o património, tradições e costumes do local onde vivem ou outros locais; realizar visitas, passeios e atividades artísticas; aprender sobre tecnologia; questões ambientais; assuntos sobre a sociedade moderna, etc. Efetivamente, todas estas atividades ajudam a manterem-se ativos e criativos e a adaptarem-se de forma mais ajustada e satisfatória à última fase da vida (Cachioni, et al., 2017; Marsilhas, et al, 2017; Barrio, et al, 2018).
Desenvolvimento
No âmbito do quadro teórico enunciado, foi desenvolvido um projeto de educação/intervenção, através da criação e dinamização de uma Oficina 55+ numa Junta de Freguesia de um concelho do norte de Portugal que integrou 13 adultos idosos com idades compreendidas entre os 56 e os 77 anos de idade, cuja finalidade se centrou na promoção de um envelhecimento bem-sucedido (Tabela 1).
Participantes
Idoso | Idade | Género | Estado Civil | Habilitações literárias | Profissão exercida | Problemas de saúde |
1 | 61 | Feminino | Viúva | 4º ano | Técnica de Eletrónica | Não Apresenta |
2 | 70 | Masculino | Casado | 4º ano | Técnico de Eletrónica | Não Apresenta |
3 | 64 | Feminino | Casado | 4º ano | Empregada de Limpeza | Não Apresenta |
4 | 71 | Masculino | Casado | 4º ano | Serralheiro | Não Apresenta |
5 | 73 | Masculino | Casado | 4º ano | Serralheiro | Não Apresenta |
6 | 73 | Feminino | Viúva | Ensino Secundário (Novas Oportunidades) | Responsável de Quiosque | Não Apresenta |
7 | 62 | Masculino | Casado | Ensino Secundário (Novas Oportunidades) | Segurança Privado | Não Apresenta |
8 | 64 | Feminino | Casada | 9º ano | Não Respondeu | Não Respondeu |
9 | 56 | Feminino | Solteira | 6º ano | Não Respondeu | Doença Oncológica |
10 | 66 | Feminino | Casada | 4º ano | Operária Fabril | Doença Renal |
11 | 73 | Feminino | Viúva | 4º ano | Operária Fabril | Diabetes |
12 | 77 | Feminino | Casada | 4º ano | Não Respondeu | Não Respondeu |
13 | 71 | Masculino | Casado | 4º ano | Chapeiro | Não Apresenta |
Método e Instrumentos de Recolha de Dados
O projeto de investigação/intervenção desenvolveu-se no enquadramento do paradigma qualitativo interpretativo/hermenêutico, que se caracteriza por se centrar mais no processo do que nos resultados e primar pela obtenção de dados descritivos mediante o contacto direto do investigador com os agentes sociais e as situações a serem estudadas, desenvolvendo-se o trabalho de investigação dando especial relevância à perspetiva dos participantes. No projeto que se descreve pretendeu-se, efetivamente, compreender o processo de construção social, estudar e fazer a recolha de dados no contexto em que os acontecimentos ocorriam, observando, descrevendo e compreendendo detalhadamente as ações, comportamentos e atitudes dos participantes do projeto a partir das perceções deles próprios, com vista ao desenho e implementação de um projeto de (trans)formação, capacitação e desenvolvimento humano adequado às suas necessidades, interesses e potencialidades (Aires, 2015).
O desenvolvimento do processo de investigação/intervenção fez-se por recurso à investigação-ação-participativa, enquanto procedimento metodológico cujo objeto se foca em situações concretas da realidade social e pressupõe a participação e o envolvimento ativo dos agentes sociais que, trabalhando conjuntamente com o investigador, procuram identificar os problemas e adquirir conhecimentos e recursos para os ultrapassar participando, assim, ativamente no processo de investigação e de intervenção promotor da (trans)formação da situação ou realidade existente e melhoramento das condições de vida (Ander-Egg, 1990).
Relativamente às técnicas de recolha de dados, fez-se recurso de várias técnicas de investigação qualitativa, tais como: análise documental; pesquisa bibliográfica; observação participante; conversas informais; notas de campo e inquérito por questionário.
Quanto às técnicas de intervenção, o plano de ação sustentou-se na animação sociocultural e, segundo a categorização de Ander-Egg (2000), foram utilizadas as técnicas grupais, com destaque para as técnicas de coesão grupal e técnicas de produção grupal; as técnicas de informação-comunicação tendo sido utilizadas as técnicas de comunicação oral e exposições; e técnicas para a realização de atividades lúdicas.
No que concerne ao procedimento de tratamento de dados fez-se recurso de técnicas e instrumentos de caráter qualitativo e quantitativo, de forma a viabilizar toda a informação recolhida através da triangulação dos dados. Os dados quantitativos relativos às questões fechadas dos inquéritos por questionário da avaliação de diagnóstico, da avaliação contínua e da avaliação final foram tratados através da análise estatística descritiva simples, dado esta técnica permitir observar, recolher, registar, classificar apresentar, analisar e interpretar as características principais dos participantes. Os dados qualitativos relativos às questões abertas do questionário e dos testemunhos dos participantes registados nas notas de campo foram analisados e tratados segundo a análise de conteúdo, enquanto uma técnica que permite organizar e dividir as informações recolhidas de forma a encontrar padrões que permitem a descoberta de factos importantes. A organização, sistematização e interpretação da informação recolhida foi norteada seguindo as orientações de análise de conteúdo de Bardin (2014).
Procedimentos
O projeto de investigação/intervenção que se descreve decorreu ao longo de três fases, cada uma delas com procedimentos vários, como a seguir se enuncia:
Inserção no contexto e avaliação de diagnóstico - Esta 1ª fase decorreu ao longo de dois meses e centrou-se, num primeiro momento, na apresentação do projeto aos participantes, bem como na clarificação das questões éticas a ele inerentes, nomeadamente, a garantia do caráter voluntário da participação no estudo, a salvaguarda da identidade, a confidencialidade dos dados recolhidos e a divulgação (anónima) dos resultados. Num segundo momento, o foco desta primeira fase, foi a integração e compreensão do contexto e da população alvo da intervenção, estabelecer uma aproximação relacional com os participantes, criar um ambiente de familiaridade e confiança para mais facilmente, através de observação participante, conversas informais e inquérito por questionário, se proceder à identificação das necessidades, interesses, motivações e expectativas dos participantes.
Planeamento e implementação da intervenção. Esta 2ª fase, centrou-se no planeamento e desenvolvimento da intervenção, desenvolvendo-se ao longo de dez meses. Dado os resultados obtidos na avaliação de diagnóstico levada a cabo na fase anterior, cujos interesses e motivações dos participantes se orientavam para a aquisição de informação/formação no âmbito da educação e promoção da saúde; para o desenvolvimento de atividades de expressão artística e lúdica e atividades de caráter social e ambiental procedeu-se ao desenho e planeamento de uma intervenção adequada às motivações evidenciadas, que se concretizou na dinamização de várias oficinas como refere a tabela 2:
OFICINAS E ATIVIDADES DESENVOLVIDAS | |
Objetivos: Consciencializar para as doenças associadas à terceira idade; Sensibilizar para a importância de hábitos de vida saudável. |
Esta Oficina tinha como finalidade a sensibilização para a adoção de um estilo de vida saudável. Atividades: Colesterol; Diabetes; Hipertensão; Alimentação Saudável; Prevenção de quedas na terceira idade. A realização das atividades desta oficina fez recurso das técnicas de animação sociocultural, fundamentalmente, das técnicas de informação-comunicação (Ander-Egg, 2000) nas suas três vertentes: técnicas de comunicação oral, (exposição seguida de debate sobre as várias temáticas abordadas); técnicas de exposição (imagens e vídeos explicativos e de sensibilização) e técnicas de comunicação social (oral e audiovisual - projeção de imagens, vídeos e PowerPoint) para ajudar a uma melhor compreensão . Os participantes mostraram bastante interesse e motivação em participar nas atividades desenvolvidas nesta oficina participando ativamente nas sessões, quer partilhando as suas experiência e problemas de saúde, quer questionando no sentido de adquirir novos conhecimentos e novas noções relativamente aos temas abordados em prol da aquisição de comportamentos e atitudes de vida mais saudáveis. |
Objetivos: Capacitar para o uso das novas tecnologias; Construir um portefólio autobiográfico reflexivo; Promover o relacionamento interpessoal e o convívio. |
Esta Oficina tinha como finalidade a transformação dos tempos livres em tempos de aprendizagem prazerosa. Atividades: Introdução ao Microsoft Word - Copiar textos como prática de escrita; formatar textos através da exploração das ferramentas da “Base”; Introdução à Internet - Compreender o que é uma ferramenta de busca e proceder a pesquisas na Internet; Elaboração de um portefólio autobiográfico reflexivo; Visita à Universidade do Minho; Quem quer ser educado; Dia da Criança; Elaboração de pasta de papel reciclado; Elaboração de um livro de receitas em papel reciclado; Confeção das bolachas para o Dia da Freguesia; Dia da Freguesia; Almoço Convívio. A realização das atividades desta oficina fez recurso das técnicas de animação sociocultural, fundamentalmente, das técnicas de coesão grupal (Ander-Egg, 2000), através das atividades que promoviam partilha de experiências e ideias e incitavam a interação do grupo; das técnicas de informação-comunicação na vertente de comunicação oral seguida de operacionalização das aprendizagens pelos participantes; técnicas de comunicação social do tipo oral e audiovisual, com recurso a materiais informáticos, como a projeção de imagens, vídeos e música; técnicas para a realização de atividades artísticas e técnicas para a realização de atividades lúdicas que promoveram momentos de socialização, convívio e bem-estar. Ao longo do decorrer desta oficina foram desenvolvidas atividades muito variadas que permitiram descobertas e novos conhecimentos em áreas diversificadas, desde música; expressões artísticas; reciclagem; TIC; culinária; visitas, etc que promoveram a estimulação cognitiva e física dos participantes de um forma lúdica contribuindo para o aumento de emoções positivas e bem-estar. A adesão e satisfação na participação das atividades desta oficina foram muito positivas e expressivas. |
OFICINA DO PROJETO BIOMASSA A CIRCULAR E LOJA SOCIAL
Objetivos: Implementar o *Projeto Biomassa a Circular Implementar a Loja Social Valorizar os saberes dos participantes |
Esta oficina tinha como finalidade a implementação de um projeto de caráter ambiental - Projeto Biomassa a Circular que tinha como objetivo primordial a redução do lixo produzido no espaço comunitário da freguesia através da valorização dos resíduos. A junta de Freguesia tinha à disposição dos habitantes um conjunto de máquinas e ferramentas agrícolas que os habitantes poderiam requisitar para tratar dos jardins e cujos resíduos eram destinados à compostagem que ficaria disponível para quem necessitasse desta biomassa para fertilização. Em troca deste empréstimo as pessoas doavam bens que se destinavam a uma Loja Social a criar e cujos bens ficariam à disposição das famílias mais carenciadas. Atividades: Apresentação Pública do Projeto Biomassa a Circular à população da freguesia; Apresentação Pública do Projeto Biomassa a Circular no Evento A realização das atividades desta Oficina fez recurso das técnicas de animação sociocultural de acordo com Ander-Egg (2000) das técnicas de coesão grupal, através das atividades que promoviam a partilha de experiências e saberes e incitavam a interação do grupo; e técnicas para a realização de atividades artísticas e lúdicas em prol de trabalho comunitário voluntário caracterizado por momentos de convívio, alegria e bem-estar. Os resultados e o impacto desta oficina na vida dos participantes e na comunidade local foi muito relevante. Por um lado, permitiu a todos os habitantes da freguesia contribuir para um reaproveitamento dos resíduos verdes dos seus jardins, transformando-os em fertilizantes que ficavam à disposição de todos os que deles necessitavam, participando assim ativamente num projeto de desenvolvimento ambiental sustentável. Por outro lado, a construção da Loja Social teve, também, um grande impacto na medida em que passou a ser um centro de apoio à comunidade, particularmente, das famílias mais fragilizadas tendo ao seu dispor bens essenciais de que necessitavam a custo zero; associando, assim, práticas de sustentabilidade ambiental a práticas comunitári de economia circular. |
Avaliação. A fase da avaliação acompanhou todo o decurso do projeto, tendo decorrido ao longo de doze meses e ajustando-se a cada uma das fases, desempenhou a função de avaliação diagnóstica, avaliação de acompanhamento e avaliação final. A avaliação de diagnóstico foi realizada através de observação participante, conversas informais, notas de campo e inquérito por questionário e procurou conhecer o contexto e os participantes, os contornos dos seus problemas, as suas necessidades, potencialidades e expectativas. A avaliação contínua, realizada através de conversas informais e inquérito por questionário foi permitindo avaliar uma a uma todas as atividades desenvolvidas, bem como o impacto e grau de satisfação provocado nos participantes constituindo um importante mecanismo de autocontrolo e autocorreção, permitindo alterar planos de ação ou procedimentos e introduzir estratégias de melhoramento sempre que se evidenciou necessário. A avaliação final, realizada através de um inquérito por questionário aos participantes, procurou averiguar se a intervenção tinha desencadeado mudanças significativas, apresentando os resultados e impacto do projeto.
Apresentação e Discussão dos Resultados
Nesta secção do trabalho apresentam-se e discutem-se os resultados da avaliação final, obtidos através de um inquérito por questionário de questões abertas, dirigido de forma presencial ou online aos participantes da oficina 55+ no final da intervenção. Importa assinalar que as informações recolhidas e analisadas foram organizadas e sistematizadas em função das três categorias que emergiram dos testemunhos dos participantes relativamente às suas opiniões quanto ao impacto do projeto: “Aprendizagem”, “Convívio e Otimização dos Tempos Livres” e “Amenização da Solidão e Aumento de Bem-estar”.
Aprendizagens
Um dos mais significativos benefícios do projeto, sendo referido na grande maioria dos testemunhos dos participantes, foi a possibilidade que proporcionou de aquisição de novas “aprendizagens” como revelam os testemunhos seguintes:
[Participar na oficina permitiu] “melhorar a minha cultura” (p. 11); “ganhar novos conhecimentos na perspetiva de perceber e levar uma vida mais próxima e adequada à idade... por exemplo aprendi a fazer pasta de papel reciclado e aprendi muito com o Projeto da Biomassa” (p. 9); “aprender e conhecer mais... tanto a nível cultural como várias visitas que fizemos foi tudo muito instrutivo” (P. 2); “adquiri novas ideias... aprendi a fazer reciclarem de papel não fazia ideia, foi uma boa experiência” (P. 5); “cada vez aprender melhor” (p. 6); “Aprendizagem de novos conhecimentos, ao nível de visitas... aprendi a fazer papel reciclado que nem imaginava como era feito, e muitas mais coisas, mas esta deu-me muito jeito” (p. 4); “Mesmo não sabendo ler consegui aprender muitas coisas...estou sempre a horas para vir para o espaço sénior. Sinto-me bem em aprender algo nas atividades que fazemos” (p.10); “Adquiri conhecimentos novos e desenvolvi alguns que já conhecia... a ter em conta a doença da diabetes” (p.8). [Aprendi sobre] culinária, trabalhos manuais, reciclagem e TIC.” (p. 1); “Aprendi a trabalhar no computador” (p.7); [Aprendi] nas visitas que fizemos a vários locais que ainda não tinha visitado e gostei” (p.13); “Aprendi várias coisas e visitei alguns monumentos da nossa cidade que não conhecia”. (p.11)
Os testemunhos dos participantes parecem ir claramente ao encontro do novo paradigma de envelhecimento, referido no quadro teórico, alicerçado numa conceção de ser humano enquanto um ser cujo potencial de desenvolvimento humano se mantém ao longo da vida, pois apesar do avanço da idade as faculdades cognitivas continuam a funcionar, proporcionando a possibilidade de continuar a aprender durante a idade madura e a velhice. Os resultados do nosso estudo parecem alinhar-se, também, com os princípios da atual conceção de educação ao longo da vida, emergindo a educação como um instrumento incontornável e, mais que um direito, a chave para viver e compreender o mundo no século XXI, proporcionando instrumentos, técnicas, informações e conhecimentos que possibilitem, em cada fase da vida, responder às necessidades de desenvolvimento humano, de autorrealização individual e de participação na vida da comunidade. Neste enquadramento, a intervenção educativa na terceira idade proporciona o desenvolvimento de mecanismos (aprendizagens, informações, habilidades comportamentais e sociais) que permitem uma melhor adequação às condições específicas desta fase da vida e a uma nova forma de ver e estar no mundo mais orientada numa perspetiva digital e tecnológica que não faz parte do seu universo cultural e social (Martín, 2018), funcionando como um fator que pode compensar as limitações e perdas próprias da idade, contribuindo para um maior equilíbrio entre ganhos e perdas segundo o qual se processa o mecanismo de desenvolvimento humano. Os testemunhos dos participantes do nosso estudo parecem corroborar muitos autores que evidenciam que a participação dos idosos em atividades educativas, sociais e recreativas potencia ou favorece uma melhoria do nível de funcionamento físico, cognitivo e social (Marsilhas, et al, 2017; Gitto, 2018; Flecha, 2019; Bastos, et al, 2020; Bermejo, et al, 2021; López, 2021).
Convívio e Otimização dos Tempos Livres
A análise dos dados, revela que o projeto teve, também, um impacto muito positivo na promoção do “Convívio e Otimização dos Tempos Livres” como atestam os testemunhos seguintes:
A participação na oficina permitiu “Passar tempo com amigos e conviver com eles” (p. 13); “O convívio.. colaborar na nossa feirinha, conhecer novos amigos e não estar em casa a pensar em coisas más” (p. 4); “O Espírito de grupo... viver em comunidade. E as atividades de grupo, foi muito bom, pelos conhecimentos que tive pela camaradagem e pelo bom ambiente” (P.1); “ocupação de tempos livres” (P. 12); “Aqui passo melhor o tempo e gosto principalmente que me ensinem... prefiro estar aqui que ir para um centro de dia. Aqui o tempo passa, não penso nas doenças nem problemas da vida” (p.10); [A oficina] “ajudou-me a sair de casa e participar em coisas novas... para mim é um bom passatempo” (p. 5). “Ocupar os tempos livres e adquirir novos conhecimentos”. (p. 2).
Dos testemunhos dos participantes sobressai a ideia de que a participação em atividades educativas transformou os seus tempos livres em momentos agradáveis de aprendizagem, socialização e convívio, corroborando os resultados de outros estudos entre os quais o de Barrio, et al. (2018), que evidenciam que a intervenção educativa pode constituir uma dinâmica muito significativa na adaptação dos idosos a esta nova fase da vida, possibilitando a aquisição de novos desempenhos e objetivos de vida.
Evidenciando, claramente, a perceção de um impacto muito positivo da intervenção na promoção do convívio e otimização dos tempos livres, contribuindo de forma muito significativa para uma melhoria do reforço da rede relacional e da melhoria da qualidade do seu dia a dia, que se traduz numa melhoria do bem-estar, os testemunhos dos participantes, corroboram, de algum modo, os resultados de outros estudos que sinalizam a ressocialização, a convivialidade e a consequente perceção de aumento de bem-estar como um dos mais significativos impactos da participação dos idosos em atividades educativas, sociais e lúdicas (Barrio, et al., 2018; Bastos, et al., 2020; López; 2021).
Amenização da Solidão e Aumento do Bem-Estar
O projeto teve, ainda, efeitos muito benéficos na amenização da solidão e aumento do bem-estar, como evidenciam os testemunhos que seguem:
“Veio dar mais força para andar, para não estar em casa sozinha, se não sair de casa não falo com ninguém, aqui é um bom momento de convívio” (p.10); “Sair da rotina caseira, ou seja, sair da solidão” (p. 4); “Ajudou-me a sair de casa e participar em coisas novas” (p. 5); “Muito mais comunicativa, mais alegre comigo própria e com quem me acompanha” (p.3); “Além de ter mais conhecimentos ajudou a sair da solidão” (p.4); “O espírito de grupo foi muito bom” (p.1).
Os testemunhos revelam, também, que a participação em atividades educativas promoveu a (re)integração e participação na vida social e comunitária, amenizando os sentimentos de isolamento e solidão, corroborando os resultados de outros autores como (López, 2021) que evidenciam a importância da intervenção educativa enquanto fator de amenização de sentimentos e emoções negativas, muito em especial, o isolamento e solidão muito comuns, nesta fase da vida, e muito prejudiciais à saúde e bem-estar, sendo mesmo considerados fatores de risco para a saúde (López & Díaz, 2018; Yanguas, et al., 2018; Pinazo, 2020).
É importante referir, ainda, que da generalidade dos testemunhos dos participantes parece podermos percecionar um aumento de emoções positivas e de bem-estar, um aspeto também referido noutros estudos (Cachioni, et al., 2017; Inouye, et al, 2018). Efetivamente, a participação em programas ou atividades educativas, sociais e de lazer, estimulando o funcionamento físico e cognitivo, promovendo a socialização e a convivialidade e potenciando a redefinição de objetivos, tarefas, atividades e papéis a desempenhar contribui para um efetivo aumento de emoções positivas e de bem-estar no quotidiano da população idosa.
Conclusões
Os resultados deste projeto de investigação/intervenção, não permitem generalizações dado representarem uma amostra reduzida e referirem um contexto específico e um período temporal limitado, no entanto parecem enquadrar-se na literatura que refere e evidencia o impacto positivo da educação de adultos e adultos idosos e o envolvimento e participação em atividades educativas, sociais e de lazer, na promoção de um processo de envelhecimento bem-sucedido.
Os testemunhos dos participantes evidenciam que as experiências de aprendizagem tiveram um impacto muito positivo na vida dos participantes, tendo-se revelado um fator fundamental na continuidade dos seus processos de desenvolvimento humano. A participação nas atividades permitiu a aquisição de novos conhecimentos em temas como saúde, segurança, reciclagem, sustentabilidade ambiental, culinária, trabalhos manuais, tecnologia, cultura geral, entre outros, que contribuíram para uma maior autoestima, autoconfiança e sentimento de pertença, participação e satisfação com a vida, contribuindo para uma visão do mundo a partir de uma nova perspetiva - mais dinâmica, mais positiva e mais entusiasta. A análise fenomenológica da linguagem verbal, e particularmente, da linguagem não verbal, aquando dos seus testemunhos conduz a uma clara perceção de que a participação e o envolvimento nas atividades estão diretamente relacionadas com um significativo aumento de emoções positivas que resultam num maior entusiasmo, alegria e satisfação com a vida.
Indo ao encontro de evidências também encontradas noutros estudos, os testemunhos dos participantes permitem constatar que a participação em atividades educativas e de lazer promoveu o convívio e a otimização dos tempos livres. A participação em atividades promove a partilha de experiências com os outros, potencializando o relacionamento interpessoal, a socialização e a convivialidade, abrindo novas possibilidades para um renascer de novos objetivos, sentidos e significados para a vida, dado possibilitar a reconstrução da rede de suporte relacional, social e emocional.
O projeto evidencia, também, benefícios ao nível da amenização da solidão e aumento de bem-estar. Corroborando resultados evidenciados noutros estudos, os testemunhos dos participantes referem, explicitamente, que a participação nas atividades amenizou o sentimento de solidão, bem como promoveu um aumento de emoções positivas e bem-estar, confirmando a ideia base de que o envolvimento e participação ativa constitui um dos aspetos principais do envelhecimento bem-sucedido.
Considerando os critérios do envelhecimento bem-sucedido que pressupõem baixa probabilidade de doença, elevado nível de funcionamento físico e cognitivo e envolvimento com a vida, os resultados da intervenção educativa, que de algum modo corroboram as evidencias de outros estudos, parece apresentarem consequências muito positivas no âmbito da promoção de um envelhecimento saudável e bem-sucedido, facto que deveria ser levado em conta pelos decisores das políticas públicas, quer de educação, quer de saúde, na medida em que, para além de um processo de envelhecimento mais saudável e mais digno, este tipo de intervenção contribui, também, para uma redução dos custos em saúde.