Introdução
O Sistema de Informação de Imunizações (SII) do Brasil é uma inovação tecnológica gerencial com potencialidades para acelerar o avanço do Programa Nacional de Imunizações (PNI), pois permite o registro individual do vacinado e de suas procedências, o resgate de não vacinados, o fornecimento de dados de coberturas vacinais e de eventos adversos pós-vacinação (EAPV), a apuração e controle da validade de imunobiológicos utilizados na rede e o controle de estoque.1,2,3) O software é disponibilizado em duas versões, a desktop e a versão web (online).4) A versão desktop necessita instalação nos computadores e funciona offline e por isso, os dados precisam ser exportados pelos serviços municipais, para que posteriormente sejam incorporados a base de dados nacional. Já a versão online possui basicamente as mesmas funcionalidades da versão desktop, necessitando conectividade com a internet.4)
Para o desenvolvimento de um software existe uma série de passos e procedimentos necessários para que sejam efetivos, julgando-se o software como adequado diante de inúmeros testes, e que por fim os usuários possam ter a melhor experiência deste produto garantindo uma boa usabilidade. Diante disso, torna-se essencial que trabalhos possam ser feitos para avaliar a qualidade, e o quão útil são estas ferramentas no trabalho executado nas unidades de saúde.5,6)
Pressupõe-se de um lado, que os profissionais de saúde atuantes em salas de imunização ainda não têm conhecimento e habilidade suficientes para operacionalizar o SII e de outro, que esse sistema possui problemas de qualidade que pode influenciar a aprendizagem, a eficiência e a satisfação do profissional na sua utilização. A dificuldade de navegar nas páginas e menus e falta de otimização do tempo de navegação, por exemplo, são atributos não relacionados aos conhecimentos e habilidades que levam à insatisfação do usuário e com isso, a não adoção da tecnologia.7)
Portanto, deve-se considerar os padrões de qualidade das funcionalidades de sistemas de informação, como o SII web, visto que a primeira experiência do usuário é determinante para o seu retorno. Entre as funcionalidades de produtos tecnológicos, a usabilidade se configura em um atributo de qualidade que avalia a facilidade de utilização das interfaces do usuário a partir de componentes de qualidade.7,8,9 Estes são denominados de Heurísticas de Usabilidade,10) que significam alguns atalhos, regras ou métricas que permitem identificar problemas concretos na interação do usuário com o sistema.
A avaliação dos componentes da usabilidade é desenvolvida com foco no usuário, visando a qualidade das interações e levando em conta seus resultados para adequar a interface atual ou construir novas versões quando for necessário. Esta recomendação reduz falhas no sistema/software para que ele responda cada vez melhor às expectativas e necessidades dos usuários.11,12,13)
Atualmente, não há ainda uma avaliação publicizada sobre a usabilidade do SII web do Brasil. E, portanto, não se conhece os riscos associados ao seu quesito de segurança. Assim, este estudo teve como objetivo analisar as heurísticas de usabilidade do SII web do Brasil para buscar maior compreensão em relação aos fatores que necessitam de melhorias nas suas funcionalidades.
Os resultados deste estudo podem apoiar o desenvolvimento de novas versões do software disponibilizadas pelo Departamento de Informática do Sistema Único de Saúde (DATASUS), o que pode facilitar a interação e agilidade do usuário com o SII web, fornecendo uma experiência melhor para aqueles que usufruem desta tecnologia inovadora. Espera-se com o aprimoramento do software, a otimização do processo de trabalho nas salas de imunização, como a redução do tempo despendido com registros de vacinação, a administração de doses desnecessárias, a garantia da segurança em sala de imunização com o monitoramento de EAPV e o registro atualizado do vacinado. Ademais, os resultados servem de referência para pesquisas futuras sobre problemas recorrentes em relação a usabilidade em SIS.
Métodos
Trata-se de um estudo descritivo, com abordagem qualitativa sobre a avaliação de usabilidade de um novo software sobre o programa nacional de imunizações, com base nas dez heurísticas de Nielsen.10)
Utilizou-se como referencial teórico a Avaliação Heurística, que é um método indireto de avaliação de usabilidade por inspeção proposto por Nielsen.10,14) Tal avaliação consiste na verificação de uma lista de 10 heurísticas (regras) pela lente de especialistas com expertise na área, podendo ser aplicado em qualquer fase do ciclo de desenvolvimento do software e visa de forma econômica, fácil e rápida, descobrir grandes problemas potenciais da interface. As Heurísticas propostas são descrita no quadro 1.
Heurísticas | Descrição | |
---|---|---|
H1 | Visibilidade ( |
O sistema deve sempre manter os usuários informados sobre o que está acontecendo, através de feedback apropriado dentro de um prazo razoável. |
H2 | Compatibilidade (correspondência entre sistema e mundo real) | O sistema deve falar a linguagem dos usuários, com palavras, frases e conceitos familiares, em vez de termos orientados pelo sistema. Siga as convenções do mundo real, fazendo as informações aparecerem em uma ordem natural e lógica. |
H3 | Controle e liberdade do usuário | Os usuários geralmente escolhem as funções do sistema por engano e precisarão de uma "saída de emergência" claramente marcada para deixar o estado indesejado sem ter que passar por um diálogo extenso. Suporte desfazer e refazer. |
H4 | Consistência e padrões | Os usuários não devem se perguntar se palavras, situações ou ações diferentes significam a mesma coisa. Siga as convenções da plataforma. |
H5 | Prevenção de erros | Ainda melhor do que boas mensagens de erro é um projeto cuidadoso que impede que um problema ocorra em primeiro lugar. Elimine as condições propensas a erros ou verifique-as e apresente aos usuários uma opção de confirmação antes de se comprometerem com a ação. |
H6 | Reconhecimento ao invés de memorização | Minimiza a carga de memória do usuário, tornando os objetos, ações e opções visíveis. O usuário não deve ter que lembrar informações de uma parte do diálogo para outra. As instruções de uso do sistema devem ser visíveis ou facilmente recuperáveis sempre que apropriado. |
H7 | Flexibilidade e eficiência de uso | Os aceleradores - nunca vistos pelo usuário iniciante - podem acelerar a interação do usuário especialista, de modo que o sistema possa atender a usuários inexperientes e experientes. Permitir que os usuários personalizem ações frequentes. |
H8 | Design estético minimalista | Os diálogos não devem conter informações irrelevantes ou raramente necessárias. Cada unidade extra de informação em um diálogo compete com as unidades relevantes de informação e diminui sua visibilidade relativa. |
H9 | Diagnóstico e correção de erros | As mensagens de erro devem ser expressas em linguagem simples (sem códigos), indicar precisamente o problema e sugerir construtivamente uma solução. |
H10 | Ajuda e documentação | Mesmo que seja melhor se o sistema puder ser usado sem documentação, pode ser necessário fornecê-la. Qualquer informação desse tipo deve ser fácil de pesquisar, focada na tarefa do usuário, listar etapas concretas a serem executadas e não deve ser muito grande. |
Foram convidados a participar da pesquisa, de forma intencional, quatro profissionais com formação em Tecnologia da Informação (TI), sendo dois mestres e dois especialistas, com conhecimento em usabilidade e sobre o SII do Brasil na versão web. Estes foram identificados com as denominações A1, A2, A3 e A4. É recomendado o uso de pelo menos dois avaliadores com conhecimentos em usabilidade,14) dada a subjetividade do método e a pouca aceitação dos resultados pelos projetistas da interface. A eficiência do método para 4 avaliadores fica em torno de 70 %. Na inspeção das heurísticas, os avaliadores examinam a interface simulando o papel dos usuários reais do software ou website avaliado.
Para a coleta de dados foi utilizado o formulário para Avaliação Heurística adaptado,15) contendo as 10 heurísticas propostas por Nielsen,14) entre novembro a dezembro de 2018. Os especialistas seguiram todas as fases da inspeção heurística, que incluem: preparação da instrução específica do SII; acompanhamento da execução do teste; consolidação da lista de problemas anotados na sessão de avaliação; e análise dos problemas encontrados segundo o grau de severidade, documentação e apresentação dos resultados. (10,14
O formulário permitiu ao especialista, ao realizar a inspeção da interface, descrever de forma subjetiva, em campos determinados, qual o problema de usabilidade verificado, a causa que propicia o problema, o efeito sobre o usuário, o efeito sobre a tarefa e a correção possível de possíveis alterações no sistema. O formulário permite ainda, classificar a natureza do problema de usabilidade, podendo ser uma barreira, um obstáculo ou um ruído e assinalar na sua percepção, em qual grau de severidade cada heurística se enquadra.14) Contudo, estes dados não foram analisados neste estudo, pelo tipo de abordagem adotada na análise.
Todos os textos descritos nos formulários foram transcritos e tratados pela análise de Conteúdo, na modalidade Temático-Categorial.16) Para a autora, a Análise de Conteúdo compreende técnicas de pesquisa que permitem, de forma sistemática, a descrição das mensagens e das atitudes atreladas ao contexto da enunciação, bem como as inferências sobre os dados coletados.
A operacionalização da análise de conteúdo, decorre da pré-análise, da exploração do material e do tratamento dos resultados obtidos e da interpretação. Na descrição dos dados as opiniões dos especialistas devem ser preservadas da maneira mais fiel possível; na análise procura-se ir para além do que é descrito e na interpretação das informações é preciso: a) buscar a lógica interna dos fatos, dos relatos e das observações; b) situar os fatos, os relatos e as observações no contexto dos atores; c) produzir um relato dos fatos em que seus atores nele se reconheçam; d) articular as informações com a literatura.16
Nessa pesquisa, inicialmente foi feita uma leitura exaustiva dos formulários, no sentido de identificar as questões a serem respondidas e de organizar o material segundo alguns critérios de validade, como a exaustividade (contemplando todos os aspectos contidos no roteiro), a representatividade (a representação do universo), a homogeneidade (que sejam obedecidos os critérios de escolha em relação a temas, técnicas e interlocutores) e a pertinência (os documentos que forem analisados devem adequar-se aos objetivos do trabalho).16)
Os fragmentos (unidades de registro) identificados foram agrupados segundo as heurísticas avaliadas no formulário: Visibilidade; Compatibilidade; Controle e liberdade do usuário; Consistência e padrões; Prevenção de erros; Reconhecimento ao invés de relembrança; Flexibilidade e eficiência de uso; Design estético minimalista; Diagnóstico e correção de erros; Ajuda e documentação.
Isto possibilitou identificar as ideias (unidades de sentido) e a partir delas, construir as categorias empíricas que foram confrontados segundo os problemas de qualidade existentes na usabilidade do SII Web. Foram elas: Localização dentro do sistema; Identidade Visual/Padronização Páginas (Tamanho de fontes, Estrutura de menus); Permissão Usuário; Geração de Relatórios /consultas e Campos obrigatórios; Ajuda do Sistema.
De acordo com Bardin,16) as categorias podem ser criadas a priori ou a posteriori, isto é, a partir apenas da teoria ou após a coleta de dados. Desta forma, as categorias foram definidas a priori, obedecendo o método indireto (Avaliação Heurística), utilizado no estudo. Quando as categorias são definidas a priori, a validade ou pertinência pode ser construída a partir de um fundamento teórico.16)
Por fim, o tratamento dos resultados (inferência e interpretação), foi realizada de forma a torná-los significativos e válidos, respeitando a inferência dos fragmentos e a interpretação de conceitos e proposições.
Este projeto foi aprovado sob o parecer no 2.035.176 e CAAE 65656017.6.0000.5545, pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal de São João del-Rei (UFSJ), e obedeceu todos os preceitos éticos da Resolução nº 466/2012, do Conselho Nacional de Ética em Pesquisa (CONEP), que trata sobre pesquisa envolvendo seres humanos.
Resultados
A descrição detalhada da inspeção das Heurísticas é imprescindível para analisar com profundidade os requisitos tecnológicos que influenciam a usabilidade do SII web do Brasil. A seguir são apresentados os resultados de acordo com as categorias analíticas identificadas.
Na categoria analítica “Localização dentro do sistema” as observações mostraram que o SII web apresenta falhas tanto na percepção de localização do usuário quanto no percurso feito dentro do próprio sistema. A falta de padronização das tabelas geradas também foi identificada:
“[...] quando o usuário acessa algum item do menu superior e a página referente é carregada, não é possível saber em qual item o usuário clicou, pois não é exibido uma referência exata de sua localização dentro do sistema. O título da página aberta não é igual ao item clicado no menu [...] quando o usuário acessa uma opção do menu, ele precisa lembrar o caminho que fez para chegar até a página acessada [...]” (A2).
“[...] Em qualquer tela do site, usuário não tem como saber onde está... o site não disponibiliza o breadcrumb, que é algo muito fácil de implementar e que facilita muito a vida do usuário [...] os menus não são intuitivos, gerando confusão, desorientação e ainda inconsistência na realização da tarefa [...]” (A4).
“[...] algumas tabelas (grids), como por exemplo a lista de pacientes, são apresentadas sem resultados por padrão, passando a impressão de que não existem dados cadastrados [...]” (A1).
O aumento da fonte dos títulos do SII, o acréscimo do recurso de breadcrumb, componente de interface cujo SII web demonstraria o trajeto feito pelo usuário dentro do próprio sistema, e a padronização das tabelas foram apresentados como soluções para os erros evidenciados. Além destes pontos, a identificação da página inicial acrescida de atalhos para as principais funções do SII também foi mencionada pelos especialistas como solução favorável para direcionar o percurso do usuário dentro do sistema. É importante ressaltar que as ponderações feitas com relação aos erros nessa categoria, apesar de gerar confusão ao usuário, não o atrapalha na execução de uma tarefa dentro do SII.
Na categoria analítica “Identidade visual - Padronização de páginas” fica evidenciado que o SII apresenta entraves em relação a padronização, suas páginas possuem padrão visual diferente entre as diversas páginas, gerando desconforto e breve desorientação aos usuários, além disso, o tamanho das letras, a disposição de textos em suas páginas e a duplicidade de comandos dificultam o acesso às informações:
“[...] A ordem de apresentação dos itens do menu é confusa, causando dificuldade para leitura e acesso às opções do sistema, gerando perda de tempo para encontrar a informação desejada [...] O tamanho da fonte utilizada e espaçamento entre os itens de menu dificulta a visualização da informação e o acesso para o usuário com problema de visão e pouca habilidade com computação [...]” (A2).
“[...] em qualquer página do sistema, o menu principal é poluído com itens que não fazem parte da função principal do sistema, causando confusão ao usuário [...]” (A1).
“[...] na aba “sair” existe apenas uma opção, que se denomina logout, isso causa duplicidade de informação, uma vez que as duas palavras têm o mesmo sentido e consequentemente o mesmo efeito, gerando confusão nos usuários [...] ao entrar em abas que possuem tabelas, as mesmas ora possuem legenda, ora não, mostrando uma falta de padrão [...]” (A3).
Foi evidenciando também que a função de auto completar, responsável por agilizar o cadastro do paciente, é presente somente para o item “município”, o mesmo não ocorre para o campo de seleção de Unidade Federativa - “UF”, fazendo com que o usuário gaste mais tempo para selecionar a UF durante a digitação dos dados, aconselhando-se então, a padronização dos campos de seleção para apresentarem a opção de auto complete.
Recomendações dos especialistas, como o aumento da fonte e espaçamento do texto, bem como um melhoramento da ordem de apresentação dos menus, com destaque para os itens mais utilizados pelos usuários, e a junção dos menus que trazem informações textuais em um menu denominado “informações” possibilitariam uma melhor fluidez das funcionalidades, e consequentemente, permitiria agilizar a execução das tarefas.
Os especialistas ressaltaram também que usuários com pouca afinidade com computadores podem ter dificuldades em manusear o SII em detrimento da falta de padronização de suas páginas e a ausência de ícones intuitivos:
“[...] o usuário iniciante ou com pouco conhecimento em informática quando acessa o sistema para realização de alguma tarefa, tem dificuldade para aprender as funcionalidades do sistema, pois os menus não são organizados de forma intuitiva [...]” (A2).
“[...] O sistema apresenta vários itens de menu para acesso, porém alguns menus não agrupam informações de forma lógica e intuitiva para o usuário, causando perda de tempo para encontrar a opção desejada [...]” (A4).
“[...] Os ícones também não seguem um padrão, apesar de que possam ser alterados por ícones mais intuitivos [...]” (A1) [...] O ideal seria padronizar os ícones das páginas [...]” (A2).
Quanto à categoria “Permissão ao usuário”, identificou-se problemas no acesso a áreas do sistema. O usuário no sistema que não tem acesso a todas as funcionalidades do SII web, ao clicar em um menu sem permissão gera uma mensagem de acesso não permitido. Embora este erro tenha leve impacto sobre o usuário e no funcionamento do sistema, as opções em que o usuário não possui permissão de acesso poderiam ser desabilitadas do menu, potencializando o desempenho das tarefas:
“[...] quando o usuário tenta acessar uma funcionalidade que não possui permissão de acesso, é visualizado as opções que não possui permissão de acesso e só é impedido pelo sistema ao clicar sobre ela [...]” (A2).
“[...] ao clicar em uma aba inacessível para o usuário, é aberta uma nova página identificando um erro com a mensagem: “Atenção! O usuário logado não tem acesso a página”, e após alguns segundos, retorna à página inicial [...]” (A3).
“[...] isso é um erro que o desenvolvedor pode evitar e que causa aos usuários desconforto e desorientação temporária, gerando ainda atraso no desempenho das tarefas [...]” (A4).
Na categoria analítica “Geração de relatórios - Consultas e campos obrigatórios”, problemas foram apontados com relação aos filtros nos relatórios e nos campos obrigatórios que se não forem preenchidos, ficam vermelhos, mas não evidenciam seu caráter obrigatório. Neste quesito foi recomendado a adição mensagens acerca dos campos de preenchimento obrigatório:
“[...] Nota-se que o filtro por coluna disponibilizado na tabela está travando, e retorna dados de acordo com o texto digitado para pesquisa, causando frustração aos usuários, pois não é possível realizar um filtro por coluna para localizar o lote rapidamente. Aconselha-se corrigir a funcionalidade de filtro por coluna na tabela de lotes [...]” (A2).
“[...] o não preenchimento de todos os campos obrigatórios, contendo asterisco (*), gera um retângulo em vermelho, impossibilitando o progresso na conclusão do cadastro. Usuários iniciantes, com pouco conhecimento do sistema, podem ficar confusos ao deparar com este erro e não saber do que se refere, gerando atraso no término das tarefas [...]” (A1).
Outros problemas no tratamento de erros na geração de relatórios também são evidenciados, causando no usuário desorientação e confusão, além de impedir a realização da tarefa ou entendimento do problema. Um exemplo disso é percebido no relatório individualizado do paciente:
“[...] ao consultar ou alterar o registro do vacinado na aba “registro de vacinação individualizado” de um paciente que não possui dados vacinais no SII web o sistema é redirecionado para uma página de erro, isso é um problema de script [...]” (A3).
É necessária a correção do erro de código script encontrado durante a avaliação conforme descrito anteriormente, bem como a disponibilização de uma mensagem que consiga orientar corretamente o usuário sobre o problema ocorrido, impactando na usabilidade do SII. E por último, a categoria analítica “Ajuda do sistema” também apresentou problemas. A construção de um material de apoio que possibilite o manuseio do SII foi sugerida como forma de resolução de entraves:
“[...] sugere-se então, construir documentação ilustrativa das funcionalidades do sistema ensinando como fazer os lançamentos relacionados à vacinação, emitir relatórios etc. A opção de “dúvidas” e “suporte técnico” poderiam ser agrupadas em um único menu “ajuda” e serem adicionadas as orientações para realização das demais funcionalidades do sistema [...]” (A2).
“[...] nota-se que para todo sistema, quando o usuário tem dificuldades, não existe ajuda nem manual de como executar tal tarefa [...]” (A4).
Contudo, ainda não existe uma documentação ilustrativa das funcionalidades do SII web, de como, por exemplo, fazer os lançamentos relacionados a vacinação, emitir relatórios, dentre outras como recomendado pelos avaliadores, pois mesmo o sistema possuindo um manual no menu “downloads”, este é direcionado para a versão desktop do SII, não sendo possível operar a versão web utilizando este manual.
No quadro 2 os resultados são sintetizados demonstrando o processo de categorização. Na coluna de “Unidades de sentido” são destacadas as interpretações dos pesquisadores a partir das unidades de registros. Na segunda coluna de “Heurística associada” é apresentada a associação entre as unidades de sentido e a heurística respectiva. Por fim, na terceira coluna “Categorias”, as heurísticas, por convergência, geraram as categorias empíricas.
Unidades de sentido | Heurística associada | Categorias empíricas |
---|---|---|
Falhas no SII (localização do usuário e no percurso feito). | Flexibilidade e eficiência de uso (H7) | Localização dentro do sistema |
Menus não intuitivos, sem padronização quanto a sua organização, tamanho de fontes variados. | Visibilidade (H1) | Identidade visual - Padronização páginas |
Falhas na padronização (páginas com padrões visuais diferentes). | Consistência e padrões (H4) | |
Tamanho das letras e disposição de textos dificultando o acesso à informação. | Design estético minimalista (H8) | |
Duplicidade de comandos dificultando o acesso à informação. | Compatibilidade (H2) | |
Menus sem permissão: gerando uma mensagem de “acesso não permitido”. | Controle e liberdade do usuário (H3) | Permissão ao usuário |
Mensagens desnecessárias e geração de loops durante processamento. | Prevenção de erros (H5) | Geração de relatórios - Consultas e campos obrigatórios |
Campos obrigatórios não evidenciando seu caráter obrigatório. | Diagnóstico e correção de erros (H9) | |
Percursos precisam ser lembrados em sua totalidade para alcançar determinada uncionalidade. | Reconhecimento ao invés de memorização (H6) | Ajuda do Sistema |
Ausência de documentação ilustrativa das funcionalidades do SII Web. | Ajuda e documentação (H10) |
Fonte: Elaborado pelos autores, 2020.
Discussão
Softwares web proporcionam aos usuários uma potencialização de seu uso, além de uma disponibilidade de recursos ao qual ele pode usufruir efetivamente, tendo por base a facilidade de acessibilidade e a rapidez da disseminação de informações, de maneira útil e confiável.17) Tendo por base o SII web do Brasil, verifica-se que, a aceitação e o uso de um SII, deve considerar a complexidade do software, da tecnologia e a sua relação com a usabilidade.18) A avaliação da usabilidade deve ser desenvolvida com foco no usuário, visando a qualidade das interações e levando em conta seus resultados para adequar a interface atual ou construir novas versões quando for necessário, respondendo cada vez mais às expectativas e necessidades dos usuários.11-12
A dificuldade de navegar nas páginas e menus, assim como a ausência de otimização do tempo durante a navegação são atributos que levam à insatisfação do usuário e, consequentemente, a não adoção do software.7) O SII web apresenta falhas no que tange a localização, como a ausência do recurso breadcrumb que demonstraria o trajeto realizado pelo usuário dentro do software. Assim, menus bem estruturados são fundamentais, além do mais, a maioria das informações e soluções que podem auxiliar o usuário, durante o uso do software, estão contidas nestas ferramentas.19)
Na visão dos especialistas há preocupação quanto à parte visual e padronização de softwares, onde quanto mais padronizados mais facilitam a utilização e o aprendizado de seus usuários, resultando na sua adoção. Situação oposta encontrada na avaliação do SII web, com páginas com padrões visuais distintos, propiciando transtornos durante sua utilização. Os softwares devem ser consistentes, de fácil aprendizagem e que induzem o processo de memorização, fazendo com que o usuário assimile informações durante o uso, facilitando a interatividade.20
A identidade visual dos softwares relaciona-se com a estética do mesmo, sendo responsável por fornecer um aspecto primeiramente visual e posteriormente para que facilite o uso, e para isso, relaciona-se cores adequadas e posicionamento dos componentes na tela, quesitos que facilitam o uso das ferramentas de qualquer software.21) Percebe-se que o SII web apresenta tamanho das letras e uma disposição de textos que intrincam nas realizações das tarefas, tornando-o pouco atrativo, contexto diferente do esperado para sua adoção e viabilização de seu uso.
Consideramos como fortaleza deste estudo, a escolha do método Avaliação Heurística, que pode ser utilizado em qualquer fase do ciclo de desenvolvimento de um software e é adequado para apoiar o desenvolvimento de projetos em andamento, revisões/ajustes/customização em produtos acabados, definir a aceitação ou não, de projetos encomendados e comparar o desempenho efetivo de softwares interativos.15) Ademais, como resultado da avaliação por este método obtém-se sugestões para correção dos problemas identificados.
O desenvolvimento de softwares inovadores, como o SII web, culmina com uma melhor usabilidade do usuário, facilitando a interatividade e agilidade nas tarefas.19) Na inspeção das heurísticas, os avaliadores examinam a interface simulando o papel dos usuários do software avaliado. Portanto, o avaliador deve entender não só de usabilidade do seu ponto de vista, mas também do domínio do software e do usuário.
As limitações deste estudo estão relacionadas ao objeto de análise e as características dos avaliadores. Por se tratar de inovação tecnológica em constante evolução, o SII web foi avaliado em sua versão disponível em produção considerando um recorte temporal transversal de poucos meses. Desta forma, conforme foi possível perceber correções para alguns problemas identificados durante a avaliação, pode ocorrer que novas mudanças introduzam novos problemas. Além disso, é necessário levar em consideração as características dos pesquisadores, reflexividade e mitigação de vieses durante a avaliação. Os principais avaliadores neste estudo são especialistas com formação em Tecnologia da Informação (TI), embora também contando com treinamento e atuando profissionalmente na área da saúde. Os preconceitos inerentes estão relacionados à interação desses pesquisadores com usuários reais do sistema analisado, que os procuram como fonte de apoio na resolução de suas dificuldades. Para mitigar o viés, na etapa de análise de conteúdo e consolidação, o estudo contou com pesquisadores com formação e atuação na área de avaliação de sistemas de saúde e vacinação.
Conclusões
A análise das heurísticas de usabilidade, que influenciaram as funcionalidades do SII web do Brasil, mostrou-se de grande relevância, pois permitiram identificar problemas concretos na interação do usuário com o software. Os resultados desta análise poderão embasar melhorias, bem como atualizações do SII, levando em consideração o quão útil esta inovação tecnológica pode ser para as atividades de imunização nos serviços locais.
A conjectura do SII, enquanto um software web, proporciona uma facilidade de acesso aos usuários, podendo ser acessado de qualquer lugar e momento, desde que tenha conectividade com a internet, além de acesso aos dados lançados na base nacional, fato que propicia a geração de relatórios para tomadas de decisão. Contudo, é imprescindível garantir a qualidade das funcionalidades para manter a eficiência e a qualidade da tecnologia, capazes de funcionar adequadamente em dispositivos móveis (smarpthones, computadores desktop) e de prover interfaces voltadas para suporte a decisões com alta capacidade analítica, considerando um volume de dados gigantesco (big data), do porte de um sistema de gestão nacional de um país continental como o Brasil.