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Revista Cubana de Enfermería

versión On-line ISSN 1561-2961

Rev Cubana Enfermer vol.32 no.4 Ciudad de la Habana oct.-dic. 2016

 

ARTÍCULO ORIGINAL

 

Atuação do profissional de saúde junto à família com HIV/AIDS

 

Trabajo del profesional de la salud y la familia portadora de HIV/AIDS

 

The work of the health professional and the family carrying of HIV/AIDS

 

 

Társilla de Sales Amorim Lemos,I Eliane Ramos Pereira,I Daniela Chaves da Costa,I Rose Mary Costa Rosa Andrade Silva,I Marcos Andrade Silva,I Denize Cristina de OliveiraII

I Universidade Federal Fluminense. Niterói/RJ, Brasil.
II Universidade do Estado do Rio de Janeiro. Brasil.

 

 


RESUMO

Introdução: Mediante a complexidade inerente à AIDS é importanteque o cuidado dos profissionais de saúde seja estendido aos familiares das pessoas vivendo com HIV/AIDS, pois eles são esses os principais cuidadores dos pacientes em questão. Objetivo: analisar as perspectivas do cuidado de profissionais de saúde junto à família do portador de HIV/AIDS no contexto atual da epidemia.
Métodos: estudo descritivo qualitativo com respaldo na teoria das representações sociais. Foi utilizada a entrevista semiestruturada para coleta de dados com 28 profissionais de saúde, em sete ambulatórios de atendimento à pessoa com HIV/AIDS.
Resultados: a partir da análise de conteúdo, emergiram tais categorias: a família com HIV/AIDS; desafios no cuidado à família da pessoa vivendo com o vírus HIV; estratégias de atuação junto à família com HIV/AIDS.
Conclusões: a partir do estudo realizado, nota-se a importância do cuidado do profissional de saúde, tanto à pessoa vivendo com HIV/AIDS, quanto à sua família, emergindo, dessa forma, a necessidade destes profissionais estarem preparados para tal atuação.

Palavras chave: relações profissional-família; assistência à saúde; pessoal de saúde; Síndrome da Imunodeficiência Humana.


RESUMEN

Introducción: delante de la complejidad relacionada al SIDA, es importante que los cuidados de los profesionales de la salud estén al alcance de los familiares de personas portadoras del HIV/AIDS, puesto que son ellos los más importantes cuidadores en este caso.
Objetivo: analizar las perspectivas del cuidado de los profesionales de la salud junto con la familia del portador de HIV/AIDS dentro del contexto actual de la epidemia.
Métodos: estudio descriptivo cualitativo aportado en la teoría de las representaciones sociales. Ha sido utilizada la entrevista semiestructurada para recolección de datos de 28 profesionales de la salud, en siete puestos de atención a la persona portadora del HIV/AIDS.
Resultados: luego del análisis del contenido han surgido las siguientes categorías: la familia portadora del HIV/AIDS; desafíos en el cuidado de la familia del portador del HIV/AIDS y estrategias de trabajo junto a la familia portadora del HIV/AIDS.
Conclusiones: a partir del estudio realizado es posible percibir la importancia del cuidado del profesional de salud para con el portador del HIV/AIDS y para su familia, emergiendo así la necesidad de la preparación para que estos profesionales desarrollen su trabajo.

Palabras clave: relaciones profesional-familia, prestación de atención de salud personal de salud; Síndrome de La Inmunodeficiencia Adquirida.


ABSTRACT

Introduction: Before the complexity related with AIDS, it is important for the cares of the health professional to be reachable by the relatives of people carrying HIV/AIDS, since they are the most important caregivers in this case.
Objective: Analyze the perspectives on caring of the health professionals together with those of the family of the HIV/AIDS carrier within the current context of the epidemics.
Methods: Descriptive, qualitative study supported by the social representation theory. The semi-structured survey has been used to collect the data about 28 health professionals, at seven sites to attend the HIV-carrier.
Results: After analyzing the contents the following categories have appeared: HIV-carrying family, the family's challenges regarding the caregiving for the HIV-carrier, working strategies with the HIV-carrying family.
Conclusions: The study carried out permitted to perceive the importance of the health professional giving care to the HIV/-carried and the family, which outstands the need for capacity building in order for these professionals to do their job.

Keywords: relationships professional-family; health caregiving; health personnel; acquired immunodeficiency syndrome.


 

 

INTRODUÇÃO

No Brasil, desde o início da epidemia até junho de 2014, foram registrados 757 042 casos de AIDS, mostrando, dessa forma, a proporção atingida pela doença no país. Estima-se que existam aproximadamente 734 mil pessoas vivendo com HIV/AIDS no Brasil no ano de 2014, correspondendo a uma prevalência de 0,4 %, que se mostra ainda elevada.1

Com a criação do Programa Nacional de AIDS, em 1985, diversas políticas públicas de saúde foram criadas, o esforço do governo federal foi notável, iniciando-se após o governo do Estado de São Paulo implementar seu programa destinado aos paciente portadores do vírus HIV. O interesse das políticas públicas mostrou contemplar a melhoria das condições de assistência à saúde das pessoas com HIV/AIDS, em que fosse assegurado o exercício amplo do direito à saúde por todos os indivíduos.2 Esses esforços mostram então seus resultados positivos, trazendo uma redução da mortalidade e melhoria na qualidade de vida dos indivíduos acometidos pela doença.

Na terceira década, desde o surgimento da AIDS, verifica-se a cronicidade da doença, além de se configurar como debilitante e contagiosa, que trouxe a necessidade de reformular o cuidado prestado às pessoas vivendo com HIV/AIDS, com o intuito de ofertar uma assistência de melhor qualidade.3

Desta forma, desde o surgimento da epidemia do HIV, vê-se um esforço das autoridades e profissionais de saúde em conter sua transmissão, reduzir a mortalidade e ofertar um tratamento. Nesse processo, muito se descobriu em relação à doença e ao cuidado em saúde de forma geral.

A AIDS trouxe à tona a importância do profissional de saúde estar preparado para lidar com questões renegadas em segundo plano, como a sexualidade dos pacientes, as relações afetivas e sociais dos mesmos e também com suas perdas e até mesmo com a morte.3

Sabe-se que hoje o risco de infecção está mais associado a questões sociais do que individuais, sendo importante considerar os diversos aspectos responsáveis pelo adoecimento, resultante de um conjunto de fatores que tornam o indivíduo mais vulnerável à infecção.4

As implicações da doença vão além do acometimento físico e biológico, afetando também, o psicológico, o social e o econômico. Assim, considera-se importante o envolvimento da família no tratamento da pessoa vivendo com HIV/AIDS.

Isso porque os indivíduos pertencentes à família constituem-se como os principais cuidadores da pessoa que apresenta algum comprometimento de saúde, já que os familiares se mostram fundamentais na promoção, prevenção e assistência.5 Nesse sentido, a família também vivencia o HIV/AIDS, pois todos sofrem o impacto e o reflexo que a doença acarreta, além das mudanças psicoemocionais e sociais frente às limitações do familiar infectado.

Assim sendo, o apoio familiar se mostra fundamental para a adesão do paciente com HIV/AIDS ao tratamento, visto que a doença traz mudanças na rotina diária do indivíduo, tendo este que se readaptar e enfrentar as diversas dificuldades impostas pela doença, como o tomar a medicação todos os dias e acostumar-se com seus efeitos colaterais.6

Portanto, à vista do cuidado e adesão das pessoas vivendo com HIV/AIDS ao tratamento para o efetivo controle da epidemia, tem-se a família como sujeito importante nesse contexto, e para isso o profissional de saúde deve estar capacitado para tal perspectiva de atuação.

O estudo é relevante frente ao contexto atual da AIDS e consequente impacto que a mesma incide no cuidado do profissional de saúde às pessoas e sua família vivendo com HIV/AIDS, visto que é importante que os familiares desses pacientes sejam preparados para a convivência com o membro soropositivo.6

Frente ao exposto, o estudo objetiva analisar as perspectivas do cuidado à família da pessoa vivendo com HIV/AIDS a partir das representações sociais de profissionais de saúde.

 

MÉTODOS

Trata-se de um estudo descritivo de abordagem qualitativa, realizado a partir de projeto multicêntrico "As transformações do cuidado de saúde e enfermagem em tempo de AIDS: representações sociais e memórias de enfermeiros e profissionais de saúde no Brasil". Este projeto foi realizado em 11 cidades do Brasil, sendo Niterói a cidade investigada por este estudo.

O campo de realização da pesquisa foi constituído por sete Serviços Ambulatoriais Especializados em HIV/AIDS, situados no Município de Niterói, RJ, dentre os quais, quatro Policlínicas e três hospitais (universitário, estadual, e outro municipal).

Para a coleta de dados optou-se pela técnica de entrevista semiestruturada, utilizando-se como instrumento de pesquisa um Roteiro de Entrevista com perguntas abertas. Estas são as perguntas utilizadas, "você acredita que a relação paciente-família interfere na adesão ao tratamento?", emocionalmente, como eram as relações dos profissionais com os pacientes e sua família?" Em seu serviço existe a abordagem e o atendimento à família?"

Utilizou-se também a aplicação de um questionário sóciodemográfico como instrumento para obtenção dos dados de identificação, contendo informações sobre profissão, sexo, idade, formação e tempo de trabalho junto às pessoas com HIV/AIDS, o que possibilitou a caracterização dos sujeitos entrevistados.

Os critérios de inclusão para este estudo foram os profissionais de saúde que atuam no Programa Nacional de DST/AIDS, com um tempo nesse programa igual ou superior a três anos, com atuação direta com pacientes com HIV/AIDS. O tempo de atuação maior que três anos, foi determinante no estudo, devido à importância de se entrevistar profissionais com experiência no cuidado aos pacientes portadores do vírus HIV.

Os critérios de exclusão foram os profissionais que eram residentes e também aqueles que atuam somente com crianças. Essa exclusão deve-se ao fato de haver, no programa HIV/AIDS, apenas um profissional, odontólogo, que cuida unicamente de crianças, o que poderia acarretar viés, nos resultados em função de que os demais profissionais que atuam no programa cuidam exclusivamente de adultos.

Assim, os participantes do estudo totalizaram 28 profissionais de saúde.Inicialmente foi esclarecida, aos entrevistados, a motivação dos pesquisadores acerca da pesquisa, a qual partiu do interesse acerca das perspectivas e dificuldades vivenciadas pelos profissionais de saúde atuantes nos programas destinados às pessoas vivendo com HIV/AIDS.

A investigação se deu em dois momentos, um para a coleta de dados sóciodemográficos e o segundo para realização da entrevista. Os profissionais de saúde que participaram do estudo foram entrevistados pessoalmente em seus locais de trabalho, em ambiente fechado e calmo, no período de outubro a dezembro de 2012, os encontros foram previamente agendados. Utilizou-se nesta segunda fase da entrevista, a gravação de áudio, através de um aparelho mp4, em que a mesma apresentou duração de 40 a 60 minutos.As entrevistas foram realizadas pessoalmente por três pesquisadores do curso de enfermagem, participantes do núcleo de pesquisa.

O material obtido pelas entrevistas foi organizado em temas, de forma a condensar os conteúdos considerados importantes para o estudo. Inicialmente as entrevistas foram transcritas na íntegra e foi realizada a análise de conteúdo que consiste na organização e catalogação dos dados e em seguida houve sua interpretação.

O estudo teve como respaldo a teoria das representações sociais (TRS) preconizada por Denise Jodelet, no que concerne às concepções de experiências vividas no cuidado à família e do conhecimento do senso comum, que são compartilhados socialmente e que permite a construção de uma realidade comum aos indivíduos pertencentes à sociedade.

No campo das RS abordamos o sujeito, principalmente, em sua dimensão física e cognitiva, em que é referido a reflexividade por indagação e posicionamento diante da experiência, do saber e do conhecimento. A RS então toma forma diante das ações e expressões dos indivíduos, além dos seus comportamentos, formas de viver a vida, na troca de informações e pensamentos entre si e nos conflitos e aflições vividos.7

A TRS se mostra bastante apropriada ao estudo, visto que a AIDS é uma doença que acomete o indivíduo em todas as suas dimensões, perpassa o aspecto psicossocial dos profissionais. As representações sociais buscam também clarificar a relação do sujeito com o objeto, sendo neste caso, a relação entre os profissionais de saúde e o cuidado à família das pessoas vivendo com HIV/AIDS. Nesse sentido, o entendimento desta relação permite apreender, com base nas representações sociais dos profissionais de saúde, os modos de pensar que regem suas ações no que concerne à família da pessoa vivendo com HIV/AIDS.

A pesquisa foi aprovada no Comitê de Ética e Pesquisa do Hospital Universitário Antônio Pedro, mediante CEP-CMM/HUAP 222/1, parecer 053/2012; CONEP registro 16755, tendo aquiescência das instituições participantes, de acordo com a Resolução 466/2012 do Conselho Nacional de Saúde, e foram respeitados os aspectos éticos acerca dos sujeitos envolvidos na pesquisa.

 

RESULTADOS

A população estudada foi composta por 30 profissionais da saúde, atuantes no programa DST/AIDS do município de Niterói, destes foram 28 entrevistados, devido recusa de dois profissionais em responder as perguntas.

Dentre os 28 profissionais entrevistados, verificamos que as entrevistas foram respondidas, em sua maioria, por médicos, totalizando 09 (32,1 %), seguido por 05 enfermeiros (17,8 %). A relação de sexo entre esses profissionais apresenta o sexo feminino como maioria (78,5 %). No quesito idade, os entrevistados têm em sua maioria entre 51 a 60 anos (39,3 %); Com relação a formação, a maioria dos profissionais relatam ter especialização (46,4 %) e por fim, o tempo de atuação dos profissionais de saúde com HIV/AIDS é, em sua maioria, de 6 a 25 anos (Tabela 1).

A análise das entrevistas intencionou capturar as perspectivas do cuidado à família das pessoas vivendo com HIV/AIDS, no contexto das ações desenvolvidas no programa, que visam os familiares desses pacientes e as contribuições dos profissionais em relação ao programa e ao cuidado.

1.A família com HIV/AIDS: importante foco do cuidado em saúde

Quanto à interação da equipe junto à família, os profissionais relatam a importância da integração dos familiares no tratamento do paciente, pois estes atuam como o porto seguro e como cuidador domiciliar da pessoa doente. O atendimento aos familiares, realizado pelos profissionais, tem o intuito de sanar suas dúvidas e dar suporte emocional e psicológico.

"Acho que existe bastante preocupação da equipe de saúde que trabalham aqui em relação a garantir bom atendimento (...), em relação a estender o atendimento aos familiares". E1 (assistente social).

"Aqui, é muito bom, é realmente um serviço muito bom, sabe eles acompanham assim, a mulher, o marido, os filhos, todo mundo aqui tem tratamento, não é excludente, (...) trata a família, não tem exclusão de ninguém da família". E9 (odontólogo).

"Família é extremamente importante porque a gente tem que dar um porto seguro pra esse paciente". E8 (enfermeiro).

  • Envolvimento da família no cuidado à pessoa com HIV/AIDS

A relação emocional dos profissionais de saúde com os familiares das pessoas vivendo com HIV/AIDS, no geral, são descritas como próximas e desenvolvidas com sensibilidade, criando-se um vínculo entre a equipe e os usuários do programa.

"(...) eu não vejo a AIDS como um problema pessoal, individual, a AIDS é uma doença que atinge a família daquela pessoa com HIV/AIDS, o trabalho tem que estar sempre voltado para a pessoa com HIV/AIDS e sua família, não consigo desvincular, por isso essa relação é sempre próxima (...)" E2 (enfermeiro).

"(...) Acho que acabamos em situações sendo um pouco amigas, como se fosse alguém da família, porque eles vêm em situações que aqui no programa de AIDS as pessoas se envolvem, a família de uma forma geral, então eu vejo uma boa receptividade à queixa do outro, pelo menos é o que eu tenho visto e procuro também agir dessa forma." E4 (técnico de enfermagem).

  • A família na adesão ao tratamento

Em relação à adesão ao tratamento, a equipe relatou que o bom relacionamento entre as pessoas vivendo com HIV/AIDS e sua família interfere positivamente na continuidade do uso da terapia medicamentosa.

"A pessoa com HIV/AIDS que tem uma participação e apoio da família tem outra inserção da AIDS, outro olhar. A família que dá colinho, a pessoa com HIV/AIDS é outro." E12 (assistente social).

"(...) O que eu vejo é uma análise muito positiva, porque como é um programa de longo acompanhamento, você conhece todos esses atores que estão postos pra cada uma dessas famílias, transmitindo muito mais segurança. Um bom relacionamento da equipe com os familiares é um dos fatores que influencia a adesão ao tratamento." E3 (enfermeiro).

2. Desafios no cuidado à família de pessoa vivendo com HIV/AIDS

  • Limites relacionados ao sigilo proposto pela pessoa com HIV/AIDS

O atendimento ao familiar, através das falas dos profissionais de saúde, acontece apenas quando há autorização dos pacientes, pois alguns escondem de seus familiares sua infecção pelo vírus do HIV.

"Com relação à família, depende porque há um sigilo, então nem todo paciente conta para a sua família. Aquele que conta a gente presta um atendimento também a família, (...)." E5 (nutricionista).

"Eu sei que há familiares que acompanham nas consultas e eu também atendo familiares desde que haja um consentimento dessa pessoa." E11 (assistente social).

  • Limitações relacionadas à capacitação no atendimento à família

Os profissionais entrevistados relataram não terem sido capacitados ou não receberam as atualizações oferecidas pelo governo, apontando assim uma dificuldade no cuidar, sabendo que a AIDS teve muitos avanços nos últimos 30 anos.

"Eu nunca, ninguém me capacitou não, ninguém nunca chegou aqui e perguntou, a você quer fazer um curso de capacitação?" E9 (odontólogo).

"Se você quiser capacitação, você que se vire, nem para médico é dado, você pague do seu bolso se quiser fazer capacitação, antigamente não era assim, era diferente, os próprios laboratórios farmacêuticos faziam reuniões, congressos, levavam médico, enfermeiro, pessoal da farmácia, nutrição, agora não fazem mais isso." E27 (médico).

"Não, a gente não tem isso, as capacitações são individuais durante jornadas e a prefeitura paga pra algumas pessoas e não pra todos (...)." E16 (médico).

3. Estratégias de melhor atuação junto à família com HIV/AIDS

Foram propostas estratégias para melhoria do serviço e consequente melhoria à assistência às pessoas com a doença.

  • Formação de grupos de apoio à família com HIV/AIDS

Esta questão apresentada fala sobre a formação de grupos com os usuários do serviço, pois desta forma atinge um maior número de indivíduos e os mesmos, entre si, podem trocar experiências, compartilhar dúvidas, conhecimentos, se apoiar emocionalmente. Eles abordam também a reunião entre a equipe para a troca de informação, discussão de casos, atualização.

"Um trabalho interessante seria um grupo que nós já tentamos fazer esse trabalho, que eu acredito que num grupo a gente consiga atingir um maior numero de pessoas e as próprias experiências que as pessoas relatam, pessoas que estão há muito mais tempo no programa. Acredito que o trabalho desenvolvido em grupo." E1 (assistente social).

"Fazemos sempre reuniões semanais, em grupos e individuais, trazendo toda informação nova, em relação à medicação, ao tratamento, estamos sempre os informando em grupos ou individualmente, fazendo o nosso aconselhamento." E28 (nutricionista).

"(...) a família vinha muito desejosa de informação e o lado emocional também carente e eles não davam conta nas consultas, além da parte da consulta clínica, o tratamento, de dar esse suporte, eles pediam que também organizássemos um grupo de atendimento aos familiares e nós abrimos essa frente de trabalho, de atendimento às famílias das pessoas com HIV/AIDS." E12 (assistente social).

  • Estratégias educativas junto aos familiares

Em relação ao risco de um possível contágio do vírus HIV por parte dos cuidadores desses pacientes, os profissionais de saúde mostram ter um cuidado especial em relação a isso, promovendo orientação e reunião com os familiares, onde é explicado o que é o vírus, a forma de transmissão para que possam entender os reais riscos e reais exposições, e também quanto às doenças oportunistas.

"Existe, há palestras e assistência profissional para os familiares." E23 (técnico de enfermagem)

"Os familiares são orientados pela enfermagem sobre os cuidados que devem ter com o paciente, uso de mascaras, luvas, manuseio. E18(assistente social)

Então a gente acalma e tranquiliza esse familiar, que não precisa adotar nenhuma medida de segurança, a não ser que ele venha a ter tuberculose, herpes, algumas coisas que a gente precise falar com esse acompanhante." E28 (nutricionista).

 

DISCUSSÃO

O cuidado é considerado como essencial para a existência e coexistência do ser humano, devendo ser praticado com ética, independente do estado de saúde da pessoa a ser atendida e de sua sorologia.8 Desta forma, é de extrema importância que a equipe multiprofissional envolvida no processo de cuidar da pessoa vivendo com HIV/AIDS e da sua família promova a assistência de qualidade, priorizando o cuidado integral e a atenção individualizada de toda a clientela.9

Um aspecto importante e que complementa a atenção integral e individualizada das pessoas vivendo com HIV/AIDS é o atendimento também aos seus familiares.

A família representa uma instituição essencial para a existência e sobrevivência do ser humano no mundo, pois a mesma é responsável pelo acolhimento, proteção e cuidado de cada indivíduo nascido e também pela função biológica, psicológica, social, educacional, cultural e afetiva.5

O apoio social e familiar se mostra fundamental, pois ameniza o sofrimento e os estresses de determinadas experiências vividas por um indivíduo. Por outro lado, o distanciamento da rede de apoio afeta negativamente essas pessoas, podendo gerar sentimentos como depressão e desesperança, repercutindo consequentemente de forma desfavorável na adesão ao tratamento.10

Compreendendo a importância da participação da família no tratamento do paciente soropositivo, os profissionais da saúde relatam haver em seus serviços o atendimento aos cuidadores com intuito, principal, de sanar suas dúvidas e dar suporte psicológico e emocional aos mesmos. Além disso, as falas revelam que os profissionais têm um relacionamento próximo com a família, criando muitas vezes um vínculo entre a equipe, os pacientes e a rede de apoio dessa clientela.

Este vínculo criado se faz bastante relevante, pois quando há uma relação acolhedora entre profissionais de saúde e os pacientes, estes se sentem valorizados e fortalecidos para dar continuidade tanto à vida quanto ao tratamento.11

Através das falas apreendidas neste estudo em questão, vemos que a relação paciente-família-equipe de saúde traz resultados positivos no tratamento e maior adesão.

A adesão ao tratamento significa tomar as medicações na dose e frequência correta, além de realizar os exames e seguir as consultas solicitadas. A não adesão ao tratamento é uma das principais causas de falha terapêutica.12 O não seguimento dotratamento como prescrito pode levar à supressão do sistema imune e, consequente, contração de doenças oportunistas.

Quando o paciente não autoriza a revelação do diagnóstico, e consecutivamente a relação família-equipe de saúde, os profissionais como descritos nas falas, não podem se relacionar com a rede de apoio. Esse fator pode dificultar o tratamento, pois a pessoa vivendo com HIV/AIDS precisa de um cuidador para ajudá-la e, não tê-lo, pode provocar a não adesão ao tratamento.

Outro aspecto que limita o atendimento de qualidade do profissional de saúde à pessoa vivendo com HIV/AIDS e sua família é a capacitação e o treinamento do mesmo.

A formação em serviço é uma abordagem estratégica fundamental para enfrentar a grave carência de profissionais de saúde em muitos países.13 No entanto, vemos através das falas da própria equipe de trabalhadores que essa capacitação não está sendo oferecida.

A abordagem aos cuidadores é fundamental, pois quando o paciente perde sua autonomia para o autocuidado ou para promover seu próprio atendimento, é a rede de apoio e os familiares que assumem esse papel, promovendo o cuidado do mesmo, segundo as necessidades do tratamento.14

Em relação à importância do cuidado à família da pessoa vivendo com HIV/AIDS, vemos um resultado muito positivo do grupo estudado, onde eles demonstram entender exatamente a importância da extensão do seu atendimento a esse grupo e promover ações com os mesmos. São realizadas reuniões com esses familiares para que seja explicada a fisiopatologia da doença, além de orientações, apoio e uma escuta ativa.

Estratégias para melhoria do cuidado

A formação de grupos de apoio, formado tanto pelos pacientes como por seus familiares, é um método eficiente para o cuidado dessa clientela. Esses grupos promovem uma aproximação entre equipe de saúde e usuários do sistema, levando-os a uma integração geral, permitindo o entendimento quanto a determinado problema por qual cada indivíduo passa.

O grupo de apoio, além disso, se mostra como uma estratégia que vai possibilitar o encontro das pessoas vivendo com HIV/AIDS, promovendo um espaço onde os mesmos possam compartilhar suas experiências, indicar soluções que os ajudaram a outros que estão passando pelas mesmas dificuldades. Esse cuidado facilita o enfrentamento da doença.15

Desta forma, os profissionais entrevistados apontam o grupo de apoio como uma boa estratégia que poderia ser utilizada em seu local de trabalho para o melhor atendimento de seus pacientes.

Outro ponto apontado pelo grupo entrevistado que em suas opiniões trariam um melhor atendimento, seria uma melhor formação e treinamento dos profissionais contratados para trabalhar com HIV/AIDS.

Além disso, é apontada a importância do envolvimento dos gestores para que estes promovam e facilitem encontros entre os profissionais atuantes, para que possam trocar informações e discussões de casos, trazendo novamente a tona o conceito de multidisciplinaridade e a importância da mesma.

Em conclusão, a família demonstra ter um papel fundamental na vida do ser humano, pois são estes indivíduos que geram, ensinam, criam e ajudam na formação de seus filhos, além disso, dá toda uma estrutura emocional de que todos os seus componentes necessitam. Por isso são estes que se apresentam como os principais cuidadores no processo saúde-doença.

Os profissionais da saúde demonstraram, através do estudo, compreender a importância em integrar a família no tratamento, sabendo que este é um fator que interfere positivamente na adesão das pessoas vivendo com HIV/AIDS ao tratamento.

Sabendo disso, a criação do grupo de apoio, as palestras e as orientações oferecidas pelos profissionais de saúde são apresentadas como medidas para melhorar o atendimento à família do paciente, amenizando suas dúvidas e anseios e compreendendo melhor suas dificuldades.

Estas mostram-se como ações que todos os ambulatório e programas destinados ao cuidado à pessoa vivendo com HIV/AIDS devem apresentar e oferecer à sua clientela, visando maior adesão ao tratamento e melhoria da qualidade de vida dos pacientes.

 

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Recibido: 2015-09-09.
Aprobado: 2016-03-16.

 

 

Társilla de Sales Amorim Lemos. Enfermeira. Mestranda do Programa de Pós-Graduação em Ciências do Cuidado em Saúde da Escola de Enfermagem. Universidade Federal Fluminense, Niterói/RJ, Brasil.

 

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