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Revista Cubana de Enfermería

versión On-line ISSN 1561-2961

Rev Cubana Enfermer vol.33 no.2 Ciudad de la Habana jun. 2017

 

ARTÍCULO ORIGINAL

 

Episódios de cuidado a mulheres com transtornos mentais na Atenção Básica

 

Episodes of caring for Women with mental disorders in primary care

 

Episodios de cuidado a mujeres con trastornos mentales en la atención primaria

 

 

Michele Cecília Silva Torrézio, Nadja Cristiane Lappann Botti

Universidade Federal de São João del Rei. Brasil.

 

 


RESUMO

Introdução: a reforma psiquiátrica reafirma a importância da articulação entre atenção básica e atenção especializada a fim de garantir melhoria do cuidado. O cuidado integral em saúde mental pressupõe atenção integral à saúde capaz de promover melhoria da qualidade de vida.
Objetivo: conhecer os episódios de cuidado a mulheres com transtornos mentais atendidas em uma Estratégia da Saúde da Família no município de Minas Gerais (Brasil).
Métodos: pesquisa de natureza qualitativa, do tipo documental. A coleta de dados ocorreu por meio da análise documental dos prontuários. O referencial teórico utilizado para análise e discussão foi a Classificação Internacional da Atenção Primária sob a ótica do cuidado compartilhado.
Resultados: verificou-se que a ansiedade generalizada foi atribuída a mais da metade das mulheres; em relação às queixas/sinais e sintomas psicológicos, a sensação de ansiedade/nervosismo/tensão foi o mais encontrado; a morbidade clínica mais comum foi a Hipertensão Arterial Sistêmica; as ações voltadas à saúde da mulher foram escassas.
Conclusões: há necessidade da implantação do apoio matricial na rede de atenção a fim de garantir uma assistência holística e de melhor qualidade às mulheres com transtorno mental.

Palavras chave: saúde mental; cuidado em saúde; saúde da família; classificação internacional da atenção primária.


RESUMEN

Introducción: la reforma psiquiátrica reafirma la importancia de la articulación entre la atención primaria y la atención secundaria con la finalidad de garantizar un mejor tratamiento. El cuidado integral de la salud mental presupone una mejoría en la calidad de vida.
Objetivo: conocer los episodios que acontecen a las mujeres con trastornos mentales atendidas en un Consultorio de la Familia en Minas Gerais.
Métodos: pesquisas de tipo cuantitativo y documental basado en la recolección de datos aportados a través del análisis de las historias clínicas individuales usando como referencia teórica la Clasificación Internacional de Atención Primaria sobre la óptica de los cuidados compartidos.
Resultados: se verificó que la ansiedad generalizada está presente en más de la mitad de las mujeres. En relación a las quejas y síntomas psicológicos, los de mayor incidencia fueron la sensación de ansiedad, nerviosismo y tensión, la morbilidad clínica más frecuente fue la hipertensión arterial sistémica; también se comprobó que las acciones dirigidas a la salud de la mujer fueron insuficientes.
Conclusiones: la necesidad de la implementación de apoyo en la atención primaria con la finalidad de una asistencia integral de calidad para la atención de las mujeres con trastornos mentales.

Palabra clave: salud mental; cuidados en salud; salud de la familia; clasificación internacional de la atención primaria.


ABSTRACT

Introduction: Psychiatric reform reaffirms the importance of linking primary care with secondary care in order to ensure better care delivery. The integral care of the mental health presupposes an improvement in the quality of life.
Objective: To know the episodes that occur to women with mental disorders attended at a Family Practice in Minas Gerais.
Methods: Quantitative and documentary research based on the collection of data provided through the analysis of individual clinical records using the International Classification of Primary Care on the perspective of shared care as a theoretical reference.
Results: Generalized anxiety was verified to be present in more than a half of women. In relation to the complaints and psychological symptoms, those of greater incidence were the sensation of anxiety, nervousness and tension, the most frequent clinical morbidity was systemic arterial hypertension. Actions directed at the health of women were found insufficient.
Conclusions: The need for the implementation of support in primary care with the aim of comprehensive quality assistance for the care of women with mental disorders.

Keywords: mental health; health care; family health; primary care international classification.


 

 

INTRODUÇÃO

No Brasil, a rede de atenção psicossocial (RAPS) passa a integrar o conjunto das redes indispensáveis na constituição das regiões de saúde.1 Neste contexto, a RAPS é uma rede de saúde mental integrada, articulada e efetiva que tem por objetivos ampliar o acesso, garantir a articulação e integração dos pontos das redes de saúde no território e qualificar o cuidado. A RAPS é formada pelos componentes: Atenção Básica em Saúde, Atenção Psicossocial Especializada, Atenção de Urgência e Emergência, Atenção Residencial de Caráter Transitório, Atenção Hospitalar, Estratégias de Desinstitucionalização e Reabilitação Psicossocial.2

A unidade básica de saúde, como ponto de atenção da RAPS tem a responsabilidade de desenvolver ações de promoção de saúde mental, prevenção e cuidado dos transtornos mentais, ações de redução de danos e cuidado a usuários de drogas, compartilhadas, sempre que necessário, com os demais pontos da rede.3 Ressalta-se que a Atenção Básica na RAPS deve operar de maneira articulada, a partir da noção de território, discussão dos casos, integração entre os profissionais intra e inter-serviços, supervisão clínico-institucional, tempo para os atendimentos e profissionais capacitados. Caso contrário, a ausência dessas condições é motivo de ruptura no acesso à saúde das pessoas que buscam ajuda, assim, não contribuindo para o processo da Reforma Psiquiátrica e contribuindo com a hospitalização psiquiátrica.4 Neste sentido a qualificação dos profissionais e organização da equipe é necessária para criar e fortalecer o vínculo, em virtude do usuário sentir-se acolhido, respeitado e com maior possibilidade de participar das ações na comunidade.5

Para que exista cuidado integral em saúde mental é preciso atenção integral à saúde capaz de promover melhoria da qualidade de vida pautada na ética social e coerente com os princípios da equidade, integralidade e universalidade.6 Caso contrário, a incorporação de práticas de cuidado descontinuadas, mediante a focalização de aspectos parciais do indivíduo compromete à produção do cuidado integral, podendo causar processo de desresponsabilização, de forma a deixar o usuário abandonado a si mesmo.1

Sabe-se que a Estratégia de Saúde da Família (ESF) tem o domicílio como espaço terapêutico e a assistência humanizada como instrumento facilitador para criação de vínculos e aproximação dos profissionais com o cotidiano das famílias. Dessa forma, a ESF tem potencial para o atendimento de pessoas com transtornos mentais em virtude de atuar na área de abrangência de suas famílias.7

Entre os dispositivos da política pública de saúde mental se reconhece o Apoio Matricial como prática em que profissionais especialistas oferecem suporte a equipes de saúde da família a fim de ampliar a resolubilidade e maior responsabilização no acompanhamento das pessoas transtornos mental e famílias.8 Este dispositivo permite realizar a construção conjunta sobre cada caso do território, monitorar, fazer classificação de risco e atendimentos compartilhados e construção de um Plano de Cuidado Compartilhado entre Atenção Primária e Equipe Especializada para a pessoa com transtorno mental.9 Deve-se cultivar a dialogicidade e a crítica diante das vivências e experiências diárias em um processo contínuo de educação em saúde junto aos sujeitos do cuidado.10

Entretanto alerta-se que o atendimento ao paciente com transtorno mental constitui um dos desafios que enfrentam os profissionais da Atenção Básica, pois a saúde mental, do ponto de vista formal, não é reconhecida pelo programa como alvo de sua atenção, já que as ações no âmbito da saúde mental nem sequer possuem espaço para os registros oficiais nos relatórios de produtividade.7

Entre os desafios também se coloca que os profissionais que lidam com demandas de saúde mental não devem trabalhar de forma unidirecional, mas empregar uma proposta compartilhada, ou seja, a educação e orientação devem se constituir em uma proposta de parceria para construção conjunta de intervenção a fim de promover a saúde e o bem-estar. Ressaltam ainda que a prática do cuidado depende da forma que o profissional atua dentro do seu espaço de trabalho e como concebe o cuidado e a relação com os usuários que estão à procura de um serviço.11

Entende-se como episódio de cuidado todo tipo de atenção prestada à determinada pessoa que apresente um problema de saúde, desde a primeira vez que a pessoa procura atenção devido àquele problema até o último encontro com o profissional por este motivo.12

Diante do desafio de cuidado a pacientes com transtornos mentais pela ESF e a fim de colaborar na construção do conhecimento e na implantação efetiva da política pública definiu-se como objetivo deste estudo conhecer os episódios de cuidado a mulheres com transtornos mentais atendidas na Estratégia da Saúde da Família.

 

MÉTODOS

Realizada pesquisa do tipo documental por entender que este tipo de pesquisa preocupa-se em estudar as sequências específicas dos comportamentos interpessoais, nas quais as ações de cada pessoa são visualizadas em uma sequência interativa que depende das ações dos demais parceiros de interação. Estudando pequenas amostras, os estudos qualitativos privilegiam as regularidades e as singularidades nas análises.13 O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa em Seres Humanos da Universidade Federal de São João del Rei (parecer nº 819.928).

O estudo foi realizado em Divinópolis, cidade do Oeste de Minas Gerais (Brasil), que conta com 20 ESFs,14 Centros de Saúde e dois Programas de Agentes Comunitários de Saúde distribuídos em dez regiões sanitárias. A coleta de dados foi realizada na Estratégia de Saúde da Família localizada na região sanitária sudeste do município.

A coleta de dados ocorreu por meio da análise documental dos prontuários do serviço arquivados na própria unidade. Esse tipo de pesquisa é relevante por proporcionar melhor visão do problema de pesquisa e hipóteses que subsidiem a sua verificação por outras formas de pesquisa.14 Os critérios de seleção adotados para constituir a amostra dos prontuários foram: mulheres vinculadas ao serviço especializado de saúde mental e atenção básica e com histórico de atendimentos em ambos os serviços no ano de 2014. Foram identificados como elegíveis para estudo 13 prontuários, sendo portanto todos incluídos no estudo. A identificação dos prontuários foi realizada através de consulta ao Sistema de Informação em Saúde. Os dados foram coletados entre outubro de 2014 a março de 2015 a partir da análise documental dos prontuários do serviço. Para coleta de dados foi utilizado formulário construído especificamente para a pesquisa contendo dados sociodemográficos (sexo, estado civil, idade, escolaridade) e história dos episódios de cuidado (motivo da consulta, diagnóstico do problema percebido pelo profissional de saúde e intervenção resultante).

O referencial teórico utilizado para análise foi a Classificação Internacional da Atenção Primária (CIAP) sob a ótica do cuidado compartilhado. A CIAP trabalha com o conceito de episódio de cuidado e com a premissa registrar três aspectos do episódio de cuidado (motivo da consulta, diagnóstico do problema e intervenção). O motivo da consulta é elemento chave no registro devendo ser classificado tal como expresso pelo paciente.15 É o sistema de classificação mais adequado para uso na Atenção Básica12 e sua segunda edição (CIAP2) está organizada em 17 capítulos e 7 componentes e permite classificar os motivos da consulta e as respostas propostas pela equipe.16

O cuidado compartilhado é um processo permanente de pactuação que oferece melhor qualidade e coordenação de cuidados através da interface atenção primária-especialidade e envolve múltiplos atores no processo de cuidado.1 Os componentes básicos para o modelo de cuidados compartilhados são: abordagem sistemática de generalista e especialista com objetivos comuns de melhorar a saúde mental, modelo de tratamento coerente com as necessidades da população, abordagem clínica e monitoramento com revisão de especialistas, atenção para as necessidades da equipe e supervisão para apoiar o desenvolvimento e manutenção do modelo de tratamento e estrutura de governança clínica.17

 

RESULTADOS

Quanto à caracterização da população verifica-se há predominância do sexo feminino. Em relação às fases de vida da mulher observa-se que maioria das mulheres encontra-se na idade reprodutiva (10 a 49 anos). A idade varia entre 23 e 79 anos sendo a idade média de 45,7 anos. Quanto ao estado civil e escolaridade verifica-se que a maioria possui baixa escolaridade, são casadas e com filhos. A média é de 2,2 filhos por mulher. Todas apresentam morbidade psiquiátrica e a maioria delas possuem morbidade clínica associada, sendo a Hipertensão Arterial Sistêmica a doença mais comum. Dentre as morbidades psiquiátricas verifica-se que o diagnóstico de ansiedade generalizada foi atribuído a mais da metade das mulheres, seguido do diagnóstico de esquizofrenia não especificada e episódio depressivo moderado (tabela 1).

Quanto ao tempo de vinculação observa-se que as mulheres apresentam maior tempo médio de vinculação com a ESF (1508,77 dias) quando comparados com a vinculação no CAPS III (650,85 dias), portanto 4,13 anos na ESF e 1,78 anos no CAPS III. Esta diferença aumenta quando observado o número médio de consultas na ESF e CAPS III, onde as mulheres tiveram em média 26,08 consultas na ESF quando comparadas com 4,46 consultas no CAPS, sendo, portanto cinco vezes maior o número de consultas no serviço de Atenção Básica que no Serviço de Saúde Mental.

Quanto aos principais sintomas e queixas durante os atendimentos registrados nos prontuários verifica-se que a grande maioria das mulheres apresenta queixas psicológicas, seguido de queixas relacionadas ao sistema cardiocirculatório e músculo esquelético. Os demais sintomas e queixas menos presentes referem-se ao sistema tegumentar, genital feminino, digestivo, neurológico, endócrino, problemas sociais e geral e inespecífico. Dentre os sintomas e queixas psicológicas registrados nos prontuários verifica-se que a sensação de ansiedade/nervosismo/tensão é o mais presente entre as mulheres, seguindo da tristeza/sensação de depressão. Dentre as mulheres que receberam diagnóstico médico de ansiedade generalizada no serviço especializado, grande parte delas apresentaram na consulta da Atenção Básica queixas/sinais e sintomas de sensação de ansiedade/nervosismo/tensão e distúrbio ansioso/estado de ansiedade. Mais da metade das mulheres também apresentaram queixas relacionadas ao sistema cardiocirculatório (tabela 2).

Tabela 2. Queixas e sintomas mais frequentes dos três principais capítulos da CIAP 2 entre as mulheres com transtornos mentais atendidas na ESF e CAPS III

Código

Capítulo: Queixas e Sintomas da CIAP2

M1

Psicológico: distúrbio ansioso/estado de ansiedade(3); sinais e sintomas psicológicos/outros(2); tristeza/sensação de depressão(1); perturbação do sono(1)

Gravidez, parto e planejamento familiar: gravidez(1); outros problemas da gravidez/parto(1); contracepção/outros(1)

Problemas sociais: perda/falecimento familiar(1); problemas de relacionamento com familiares(1)

M2

Endócrino, Metabólico e Nutricional: Diabetes insulino-dependente(4)

Músculo esquelético: Sinais/sintomas da região lombar(4)

Psicológico: Tristeza/sensação de depressão(1); Outras perturbações psicológicas(1)

M3

Psicológico: Sensação de ansiedade/nervosismo/tensão(5); Abuso de medicação(3); Sinais/sintomas psicológicos, outros(2); Tristeza/sensação de depressão(2); Perturbação do sono(1); Abuso do tabaco(1)

Circulatório: Hipertensão sem complicações(14)

Endócrino, Metabólico e Nutricional: Perda de apetite(3)

M4

Psicológico: Tristeza/sensação de depressão(3); Sensação de ansiedade/nervosismo/tensão(2); Outras perturbações psicológicas(1); Sinais/sintomas psicológicos, outros(1)

Circulatório: Dor atribuída ao coração(2); Sensação de pressão/aperto atribuída ao coração(2); Palpitações/percepção dos batimentos cardíacos(1)

Músculo esquelético: Sinais/sintomas do joelho(2); Sinais/sintomas da região lombar(1); Sinais/sintomas dos ombros(1)

M5

Circulatório: Outras doenças do aparelho circulatório(2); Tornozelos inchados/edema(1); Insuficiência cardíaca (1); Trombose/acidente vascular cerebral(1)

Pele: Outra lesão cutânea(4)

Psicológico: Outras perturbações psicológicas(2)

M6

Digestivo: Dores abdominais, epigástricas(2); Diarreia(2)

Genital feminino: Sinais/sintomas da vulva(1); Sinais/sintomas do aparelho genital femini­no, outra(1) Candidíase genital feminina(1); Esfregaço de Papanicolau/colpocitologia oncótica anormal(1)

Circulatório: Dor atribuída ao coração(1); Sensação de pressão/aperto atribuída ao coração(1); Hipertensão sem complicações(1)

M7

Psicológico: Outras perturbações psicológicas (3); Sensação de ansiedade/nervosismo/tensão(1); Distúrbio ansioso/estado de ansiedade(1)

Pele: Prurido(1); Infecção dos dedos das mãos/pés(1); Furúnculo/carbúnculo(1); Pediculose/outras infecções da pele(1)

Digestivo: Dores abdominais, epigástricas(1)

M8

Psicológico: Sinais/sintomas psicológicos, outros (5); Outras perturbações psicológicas(4)Sensação de ansiedade/nervosismo/tensão(2); Abuso do tabaco(2); Abuso de drogas(2); Abuso de medicação(1); Somatização(1)

Problemas sociais: Problema comportamental do parceiro/companheiro(5); Problema de relacionamento com parceiro/conjugal(3); Problema de relacionamento com familiares(3); Problema comportamental de familiar(2)

Circulatório: Dor atribuída ao coração(3); Sensação de pressão/aperto atribuída ao coração(3); Dores atribuídas ao aparelho circulatório(3);Hipertensão sem complicações(2)

M9

Circulatório: Hipertensão sem complicações(11)

Pele: Infecção pós-traumática da pele(2); Sinais/sintomas da pele, outros(2); Prurido(1); Alterações da cor da pele(1); Traumatismo/contusão(1)

Neurológico: Vertigens/tonturas(2); Paralisia/fraqueza(2)

Psicológico: Esquizofrenia(2)

M10

Genital Feminino: Esfregaço de Papanicolau/colpocitologia oncótica anormal(2); Sinais/sintomas da mama feminina, outros(1)

Circulatório: Tornozelos inchados/edema(1); Outras doenças do aparelho circulatório(1)

Músculo Esquelético: Sinais/sintomas do pescoço(1); Outros sinais/sintomas do aparelho músculo esquelético(1)

M11

Psicológico: Sensação de ansiedade/nervosismo/tensão(3); Tristeza/sensação de depressão(1); Sinais/sintomas psicológicos, outros(2); Outras perturbações psicológicas(1)

Circulatório: Febre reumática/cardiopatia(4); Dor atribuída ao coração(1)

Geral e Inespecífico: Dor generalizada/múltipla(1); Debilidade/cansaço geral/fadiga(1); Desmaio/síncope(1); Problemas de sudorese(1)

M12

Músculo Esquelético: Sinais/sintomas do pé/dedos pé(4); Dores musculares(2)

Psicológico: Sensação de ansiedade/nervosismo/tensão(2)

Circulatório: Tornozelos inchados/edema(1); trombose/acidente vascular cerebral(1)

M13

Geral e Inespecífico: Dor generalizada/múltipla (2); Febre(1); Dengue e outras doenças virais(1); Lesão traumática/acidente(1)

Genital Feminino: Esfregaço de Papanicolau/colpocitologia oncótica anormal(3); Relação sexual dolorosa na mulher(1)

Psicológico: Tristeza/sensação de depressão(1); Perturbação do sono(1)

 

É possível observar que ações voltadas à saúde da mulher registradas nos prontuários foram escassas. Apenas quatro dentre as treze mulheres tiveram atendimentos direcionados à saúde da mulher e somente em três prontuários havia registro da realização de exame preventivo do câncer do colo do útero. Os demais atendimentos foram direcionados à gestação e sinais/sintomas do aparelho genital feminino.

 

DISCUSSÃO

Para o cuidado integral ao paciente com transtorno mental na Atenção Básica é imprescindível que o acolhimento e o vínculo sejam os eixos norteadores na assistência. Autores 18 destacam que enfermeiros devem entender os processos históricos da Reforma Psiquiátrica para que direcionem suas ações frente ao que é preconizado, sejam inseridos nos CAPS ou nas Unidades de Saúde da Família. E o cuidado de Enfermagem deve envolver comunidade, família, serviços substitutivos e demais profissionais da equipe, no acolhimento aos indivíduos com transtorno mental, dentro das demandas espontânea ou programada e busca ativa.

Os resultados mostram que além de morbidade psiquiátrica a maioria das mulheres também apresenta morbidade clínica associada e maior tempo de vinculação e número de consultas no serviço de Atenção Básica que no Serviço de Saúde Mental especializado. Estudos19 enfatizam que os serviços e ações de saúde mental devem estar organizados em rede e devem funcionar de forma articulada. Os profissionais devem estar aptos a responder cotidianamente às diferentes demandas de atendimento, considerando a particularidade de cada caso sem negligenciar as diretrizes públicas de saúde mental, tendo em vista que quem procura atendimento apresenta uma demanda para alívio de um sofrimento. Neste sentido a Atenção Básica é reconhecida como a porta de entrada das mulheres com transtorno mental, referenciando os casos especiais para o CAPS, mas mantendo a corresponsabilidade e a continuidade do cuidado dos pacientes adscritos.20

A diversidade de sintomas e queixas das mulheres de ordem psicológica e social e de vários sistemas (cardiocirculatório, músculo esquelético, tegumentar, genital feminino, digestivo, neurológico e endócrino) revela o desafio do cuidado. Fato que torna imprescindível os profissionais estabelecerem parcerias com a rede de cuidado. Neste sentido, surge o apoio matricial como ferramenta para o trabalho de descentralização em saúde mental. Essa metodologia articula-se aos princípios do SUS ao contemplar o acesso universal, integralidade e equidade e demanda abordagem inter e/ou transdisciplinar, mediante o diagnóstico, formulação de projetos terapêuticos e abordagem conjunta, mediados pela comunicação e pelas relações estabelecidas entre diferentes profissionais.21

Autores22 referem que embora a utilização do apoio matricial especializado como instrumento cotidiano de trabalho pressupõe certo grau de transformação na organização e funcionamento dos serviços e sistemas de saúde, a Saúde da Família representa uma estratégia para tornar a Atenção Básica um componente estruturante da transformação do modelo de atenção em saúde no Brasil.

A fim de possibilitar maior aprofundamento às informações necessárias para a Atenção Básica, a CIAP categoriza o motivo de consulta a partir da demanda do usuário e, portanto do episódio de cuidado e pode ser utilizada por profissionais não médicos.23 Ressalta-se que entre as dimensões requeridas para as mudanças no modelo de atenção à saúde é a transição de uma atenção prescritiva e centrada na doença para uma atenção colaborativa e centrada na pessoa e na família.24

Verificou-se a ocorrência de doenças cardiovasculares entre as mulheres com transtornos mentais atendidas na ESF, sendo a HAS a doença clínica associada mais encontrada, neste sentido estudos 25 refere em seu estudo à correlação entre transtornos mentais e determinadas doenças como diabetes, obesidade e em maior número as doenças cardiovasculares. Também se encontrou expressiva presença de queixas relacionadas ao Transtorno de Ansiedade Generalizada (TAG) entre as mulheres com transtornos mentais atendidas na ESF, apoiando estudos que descrevem a relação entre TAG e outros transtornos mentais e HAS. O TAG se caracteriza por preocupação excessiva, persistente e de difícil controle, gerando desconforto significativo incluindo irritabilidade, distúrbios do sono e sintomas físicos, como náusea, sudorese, taquicardia, fadiga e tensão muscular.26 Afeta duas vezes mais as mulheres em relação aos homens e impacta significativamente na qualidade de vida e funcionamento geral do organismo.27 Alguns autores28 ao considerarem em seu estudo o aspecto neurobiológico, apontam a relação entre o funcionamento do sistema nervoso simpático (SNS), as emoções e a hipertensão arterial, havendo assim, associação entre distúrbios emocionais e alterações nas funções viscerais.

Percebe-se expressiva relação entre mulheres com TAG e maior demanda de atendimento na Atenção Básica quando comparado ao serviço especializado de saúde mental, sendo 6,3 vezes maior, podendo indicar baixa resolubilidade de referência destas pacientes para o serviço especializado reforçando a necessidade do apoio matricial para melhoria da qualidade do serviço e continuidade do cuidado. Neste aspecto ressalta-se que os usuários acompanhados por serviços especializados da RAPS devem continuar sendo acompanhados pela rede básica de saúde, já que, além de demandas psiquiátricas e psíquicas, esse usuário precisa ser assistido em suas necessidades clínicas.1

Fato importante identificado refere-se à escassa quantidade de registros de atendimentos voltados à saúde da mulher, onde apenas 3 dentre as 13 mulheres haviam realizado exame preventivo do câncer do colo do útero e atendimentos relacionados à gestação e sinais/sintomas do aparelho genital feminino. A atual Política Nacional de Atenção à Saúde da Mulher propõe que sejam introduzidas, na rede pública de saúde, ações voltadas a pessoas excluídas da atenção, em especial as mulheres com transtorno mental. Nas diretrizes dessa política o cuidado deverá ser norteado pelo respeito às diferenças, sem discriminação e sem imposição de valores e crenças pessoais.20

Conforme verificado há poucas abordagens relacionadas à saúde da mulher de caráter preventivo significando que a grande maioria das mulheres deste estudo não está sendo acolhida de maneira holística. Além disso, verifica-se que 10 dentre as 13 mulheres tem filhos, corroborando com estudo20 realizado em 2012 relata, na prática dos serviços de saúde tal clientela não recebe atenção adequada no campo da saúde sexual e reprodutiva, sendo ignorados as especificidades e o cumprimento de seus direitos nessa área do cuidado, devido geralmente a dificuldade em apreender as informações necessárias à tomada de decisão e autonomia relacionado a prática sexual. Com isso, tais mulheres podem ficar suscetíveis a gravidez não planejada e teratogenicidade devido ao uso de psicotrópicos.20 Neste sentido, é importante envolver o companheiro e/ou outros familiares na tomada de decisão, principalmente quanto ao planejamento familiar abordando a relação gravidez/transtorno mental como direito sexual e reprodutivo.29

Na atual política nacional o CAPS é responsável pela atenção em saúde mental das pessoas com transtorno mental para tal é necessário que promova articulação social e intersetorial, principalmente no que se refere à Estratégia Saúde da Família, oferecendo suporte ao atendimento em saúde mental na Atenção Básica, incluindo, por exemplo, o planejamento familiar para as mulheres com transtorno mental.30

Em conclusão, este estudo permitiu conhecer os episódios de cuidado em saúde a mulheres com transtornos mentais na atenção primária e especializada de Divinópolis. Conforme identificado, alerta-se para a demanda recorrente de queixas e sinais/sintomas psicológicos destas mulheres durante procura pelo atendimento na ESF, tendo em vista que as mesmas são acompanhadas também pelo serviço especializado em saúde mental, podendo indicar assim que muitas destas demandas não estão sendo totalmente acolhidas e resolvidas em ambos os serviços. Observa-se também a escassa abordagem quanto a outros aspectos da vida, em especial ações de prevenção e promoção voltadas à saúde da mulher como sexualidade, planejamento familiar, mamografia e coleta de material para exame citopatológico, além de consulta direcionada a prevenção e controle das doenças crônicas não transmissíveis.

Assim, entende-se que, a partir dos preceitos da Reforma Psiquiátrica que apresenta a articulação entre Atenção Básica e saúde mental, há necessidade da implantação do apoio matricial na rede de atenção a fim de garantir assistência holística e de melhor qualidade às mulheres com transtorno mental. Ademais, considerando que o estudo foi realizado em uma ESF, que traz peculiaridades locais em sua forma de organização, sugere-se que outros estudos sejam realizados de forma a contemplar outras realidades.

 

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Recibido: 21-09-2015.
Aprobado: 17-02-2016.

 

 

Michele Cecília Silva Torrézio. Universidade Federal de São João del Rei. Dirección electrónica: michelitorrezio@yahoo.com.br

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