INTRODUÇÃO
De acordo com o Censo da Sociedade Brasileira de Nefrologia (SBN), em 2013, havia 658 unidades renais ativas e cadastradas, porém, apenas 50,8 % responderam ao formulário disponibilizado. Nas 334 unidades participantes, havia 50 961 pessoas em terapia renal substitutiva, sendo que dessas, 15 914 aguardavam em uma fila para o transplante renal, indo de encontro com as estimativas pré-estabelecidas que eram de 31 351.1
Com essas informações, destaca-se que o transplante renal ocasiona um impacto positivo na vida das pessoas que têm a oportunidade de vivenciá-lo, fato apontado em um estudo longitudinal com 63 pessoas que estavam em tratamento ambulatorial na região Nordeste do Brasil. Na pesquisa foi evidenciado que posteriormente ao transplante, as pessoas consideraram um aumento na percepção da qualidade de vida, e também, uma melhora nos domínios físico, psicológico, social e ambiental.2
Por outro lado, a partir de um estudo da trajetória de vida das pessoas que haviam sido transplantadas, notou-se que a perda da função dos rins e o transplante influenciavam drasticamente na vida delas. Os autores ainda pontuaram que as pessoas transplantadas não tiveram vivências positivas com o enxerto em consequência do sofrimento psíquico pela falta da equipe, dos colegas de tratamento e da própria independência da máquina dialisadora, suscitando na recusa do rim transplantado.3
Diante dessa magnitude, ao cuidar de pessoas com a Doença Renal Crônica (DRC), percebe-se a necessidade de discutir a respeito de suas preocupações, seus medos e anseios, suas escolhas, suas prioridades e suas perspectivas de cuidados futuros. Desse modo, é preciso mudar o paradigma de atenção: do foco na doença para um modelo que seja baseado em cuidados holísticos, a fim de atender às necessidades das pessoas que vivenciam essa doença.4
Sendo assim, compreender a experiência das pessoas transplantadas renais permite entender o contexto de luta pelo viver, possibilitando, dessa maneira, reestruturar as ações de enfermagem diante das necessidades existentes. Ao prestar um cuidado individualizado, sabe-se que cada pessoa pode vivenciar diferentemente a doença e o tratamento.3
Nesse contexto, conhecer o significado do transplante renal para as pessoas que o vivenciam pode constituir uma oportunidade de “dar voz” a elas e desmistificar conceitos pré-estabelecidos pela comunidade, pelos profissionais, dentre outros, já que essa modalidade terapêutica não é considerada a cura da DRC, mas a possibilidade para retomar, em parte, a vida que possuíam anteriormente a doença. Diante da contextualização apresentada, este estudo tem por objetivo apresentar o significado do transplante renal para as pessoas transplantadas.
MÉTODOS
Estudo qualitativo, do tipo descritivo. Foram entrevistadas 20 pessoas que realizaram o transplante renal e se enquadraram nos critérios de inclusão: idade igual ou superior a 18 anos; disposição em participar do estudo; concordar com a gravação das entrevistas; aceitar a divulgação dos dados nos meios científicos; estar com suas faculdades mentais preservadas; não apresentar dificuldades de comunicação verbal; estiver vinculada ao serviço de nefrologia; ter, no mínimo, um ano de realização do transplante renal e ter sido submetida a algum tratamento dialítico anterior.
O período da coleta de dados foi de maio a julho de 2013. A primeira abordagem à pessoa transplantada foi por meio do contato telefônico, após o recebimento da relação de transplantados, cedida pelos serviços de nefrologia de um município localizado na região Sul do Brasil. Ao receber o aceite, a data, o horário e o local das entrevistas foram acordados, conforme a disponibilidade do entrevistado. Somente se cessou a coleta de dados quando o material obtido começou a apresentar redundância nas informações prestadas.
Durante as entrevistas, utilizou-se roteiro com perguntas semiestruturadas, para a obtenção de dados subjetivos sobre a vivência da pessoa com a DRC após o transplante renal. Os dados foram gravados e transcritos, para posterior análise, conforme a proposta Operativa seguindo as etapas: ordenação, classificação dos dados e análise final.5
Para seguir os princípios éticos de pesquisa com seres humanos, o projeto do estudo foi encaminhado a um Comitê de Ética em Pesquisa, emitindo o parecer de aprovação sob o nº 192/2013, além de respeitar a Resolução 196/96 que estava em vigor no momento do aceite.6 Cada entrevistado foi identificado por um código, a saber, E de entrevistado, seguido do número arábico, conforme a sequência das entrevistas, acrescidos da idade (por exemplo, E1, 43 anos).
RESULTADOS
Ao perguntar aos entrevistados qual foi a reação quando receberam o transplante renal, esses manifestaram sentimento de alegria, como afirmado por E1.
Como eu reagi? Com muita alegria. Não dá para descrever o contentamento que a gente fica (E1, 66 anos).
Sobre o significado que o transplante renal acarretou para as pessoas, houve relação com a vida e de renascimento.
Ele me devolveu a vida, me devolveu a vontade de viver. Com certeza, apesar de todos os pesares, devolveu. Se não fosse isso, eu não estava mais aqui (E11, 54 anos).
Eu acho que o transplante para quem está precisando e vem acontecer, é uma nova vida. Tu renasces de novo, porque eu acho que sem ele, nós não teríamos muito tempo de vida. Ele vem fazer com que a gente consiga viver mais, viver melhor (E20, 63 anos).
Como pode ser observado no depoimento de E20, o transplante renal foi visto como uma nova vida. Assim, percebe-se que muitas pessoas corroboram com esse sentimento de renovação ao serem indagadas sobre o significado do transplante.
Vida nova. Vida nova (E1, 66 anos).
É uma nova vida, muda tudo (E2, 53 anos).
Vida e felicidade, só isso (E7, 58 anos).
O que o transplante significa? Vida. Vida, viver de novo (E10, 46 anos).
O transplante, o que eu posso dizer, que é outra vida. Uma vida nova (E15, 39 anos).
O transplante representa a vida para ti. Representa a minha vida de volta (E16, 40 anos).
É outra vida (E17, 40 anos).
Uma vida nova (E18, 55 anos).
Já para outros entrevistados, o transplante renal significou algo positivo em suas vidas.
Tudo de bom. Maravilhoso. É como se diz, “sem palavras”. É muito bom. Maravilhoso (E19, 52 anos).
Para saber o significado de vida nova, os entrevistados deram a seguinte explicação, sendo que alguns relacionaram com o tratamento hemodialítico.
Uma nova vida porque tu não tens mais aquele negócio de dizer que eu tenho obrigação com a hemodiálise. Não tem aquela prisão (E2, 53 anos).
Vida normal é não depender mais da máquina. É ter autonomia para fazer o que eu quiser, porque isso aqui [hemodiálise] a gente tem que vir três vezes por semana, ficar quatro horas plugado numa máquina (E3, 40 anos).
Vida normal é levantar de manhã, caminhar, sair a hora que quer. Não depender de doença, que antes era brabo (E4, 55 anos).
De poder valorizar a nossa vida. Dar valor a tudo o que a gente tem quando está normal, se cuidar para não ficar doente, apesar que é uma doença silenciosa [DRC]. Quando eu percebi, eu já estava doente, sem ter nenhum sintoma (E10, 46 anos).
Vida nova, que eu estou bem em vista do que estava antes [na época da hemodiálise]. [...] Vamos dizer, uma coisa que eu não posso é trabalhar, mas o resto eu posso andar. É uma vida solta, uma vida tranquila em casa (E12, 45 anos).
Uma nova chance. Assim, tu teres uma vida melhor, uma qualidade de vida bem melhor. É como se fosse, eu não sei te explicar direito, mas é como se fosse um sonho. É como quando tu recebes um presente que tu tens que cuidar aquilo ali com todo o carinho para conservar. Eu não sei me expressar assim, mas é nessa parte, eu considero o rim como quase que tu acertar na loteria, porque tu passaste por aquele trabalho [lista de espera], processo todo e vai lá e consegue (E14, 41 anos)
Uma vida nova, porque começa a viver de novo. Bom, tu não estás na diálise, tu já tens bastante tempo de fazer várias coisas, não precisas estar pensando “eu tenho que levantar cedo amanhã para ir para a diálise, aí tu já perdes cinco horas no dia a dia, quando tu passas mal e às vezes não dá certo”. Então, eu comecei a andar de bicicleta, caminhar, até jogar bola eu jogo (E15, 39 anos).
Quanto à explicação do significado de bom, os entrevistados responderam.
No sentido de me trazer bastante liberdade. Eu acho que para mim, foi o ponto chave da coisa. Não me senti mais preso (E5, 30 anos).
Bom, o ótimo para mim é me sentir bem. Fazer as coisas que eu quero fazer. Sabe, nas condições que eu posso fazer (E15, 39 anos).
Que eu não tenho que estar naquelas máquinas [hemodiálise], que a pior coisa é estar naquelas máquinas. Eu não tendo que viajar três vezes por semana, eu não tenho que estar naquelas máquinas, é tudo de bom (E19, 52 anos).
Os entrevistados também manifestaram sobre o que o transplante renal gerou em suas vidas, ao fazer comparação com o tratamento dialítico realizado anteriormente.
Eu senti uma vida renovada por causa que a gente fica normal e na diálise é difícil. Não tem como o transplante, o transplante é muito bom. Tem que existir mais transplante, mais doador para o pessoal sair fora daquilo, da diálise (E1, 66 anos).
Saber que os dias que eu tinha diálise, eu posso fazer outra coisa. Resumindo, é uma vida nova porque tu tens a rotina da medicação, mas tu tiras a rotina da máquina, que a máquina é tu ficares quatro horas, que quatro horas tu ficas ligado, mas tu chegas, tu tens que esperar ser ligado, depois tu sai, tu tens que esperar a fístula parar de sangrar, então, é mais de quatro horas na realidade. Quatro horas é a sessão de hemodiálise, mas a realidade é mais. Então, só não ter essa rotina. Tem a rotina dos remédios, tem horário para tomar, mas tanto tu tomas em casa, tu vais sair, tu carregas a medicação contigo, toma aonde tiver, não tem mais aquela coisa de tu estares na máquina. Para mim, resumindo, seria uma vida nova (E3, 40 anos)
Até vou te dizer uma coisa, eu não posso acreditar numa pessoa que já fez diálise, que fez um transplante e recebeu uma vida nova, dizer que o transplante é negativo (E7, 58 anos).
A gente nasce de novo, porque no momento que tu estás numa hemodiálise, tu sabes que é para o resto da vida ou a não ser que aparece um transplante. Se não aparecer, qual é a tendência que tem? O rim não volta a funcionar. Eu mesmo que já tinha dez anos já de problema [DRC], então assim, a gente nasce de novo. É uma nova vida que a gente tem (E18, 55 anos).
Até em pequenas atividades rotineiras, como a vida social e a alimentação, o transplante foi um diferenciador na vida das pessoas acometidas pela DRC.
De poder assim, como eu falei, de sair (E17, 40 anos).
É poder fazer tudo, eu acho, comer (E20, 63 anos).
Apesar da positividade gerada pelo transplante renal para as pessoas com a DRC, os entrevistados E12 e E16 ainda abordaram a possibilidade da falência do órgão transplantado, havendo a necessidade de retornar para a hemodiálise.
Ele significa uma vida nova para mim, uma coisa boa para mim, porque se eu tivesse que ir lá [serviço de nefrologia], onde eu estava, era mais difícil. Então, o transplante para mim, é uma vida nova. Para mim, uma coisa que eu mesmo não esperava que um dia eles iriam me chamar ou que um dia eu fosse fazer, que isso iria dar certo. Sempre pensando: Será que eu vou sair de lá? Será que eles irão me chamar? Se me chamar, será que vai dar certo? Sempre pensando aquilo ali, até hoje às vezes eu penso. Mas será que isso um dia pode até parar de funcionar o meu rim. Às vezes eu penso isso também, vamos dizer, um dia eu posso ter que voltar para as máquinas [hemodiálise] de novo, mas tomara que não (E12, 45 anos).
Eu acho que para quem tem problema renal, o transplante não é a solução, mas é uma sobrevida para ti. É como tu nascer de novo. O transplante é como tu nascer de novo para várias coisas da vida. Não para todas, mas para várias coisas da vida. Sabe, eu não consigo me imaginar hoje, voltar para uma máquina [hemodiálise]. Eu sei que essa realidade é bem possível, mas eu procuro não pensar muito nisso. Porque o transplante, depois que tu consegues viver com ele, tu aprendes a viver com ele, ele te proporciona tudo de volta. Então o transplante é tudo para mim. Seria muito difícil e a gente sempre pensa nessa possibilidade de voltar para a hemodiálise, seria muito complicado (E16, 40 anos).
Um dos entrevistados também abordou o conhecimento adquirido por meio televisivo sobre o tratamento que recebeu após o transplante renal.
Depois que eu transplantei, eu vi um programa na TV que dizia os médicos que o transplante não é a cura da doença [DRC], é apenas a melhor forma de tratamento, porque o rim transplantado, ele tem uma vida. Não sei se é vida útil que se chama, não sei se é esse termo que se dá, mas ele tem um tempo. Ele pode durar mais, pode durar menos. Os próprios médicos não consideram como cura, e sim, uma melhor forma de tratamento para a doença renal (E3, 40 anos).
Já outro falou que os médicos não informam muito sobre o tratamento.
Eu acho que os médicos, eles pecam muito em não te dar todas as realidades e a gente na ânsia de sair daquele problema [tratamento hemodialítico], tu também não pesquisas. Os médicos disseram “Tu botas o rim do teu irmão, aí tu vais ter uma vida normal, o rim não vai te incomodar mais”. Mas não é assim que funciona, a gente sabe que o transplante não é a cura, o transplante é um tratamento. Aprendi com o tempo que existem vários tratamentos como a hemodiálise, a diálise peritoneal e o transplante que é o melhor deles (E11, 54 anos).
Apesar das informações recebidas ainda serem limitadas em algumas situações, um entrevistado desafiou a diferença do transplante como tratamento para a DRC, se for perguntado a uma pessoa com a doença renal que ainda não foi transplantada, mas que está em tratamento dialítico.
Para nós, é a melhor coisa que tem. Conversa com uma pessoa que não foi transplantada e conversa com um transplantado para ver a diferença. Tu tens conversado com eles ou não? Conversa com um que não foi transplantado para ver o que ele vai te dizer (E4, 55 anos).
Fica implícita pelo depoimento de E4 que o transplante renal é a expectativa de futuro para as pessoas com a DRC em tratamento dialítico, sendo reiterado por ele que essa terapêutica é a melhor existente em sua concepção.
DISCUSSÃO
O transplante de órgãos busca uma melhor qualidade de vida e uma redução do risco de mortalidade.7) Entretanto, é importante ressaltar que o processo de transplantação renal na DRC é um tratamento e não uma cura, de modo que a pessoa submetida ao mesmo precisa compreender isso e ter responsabilidade e comprometimento com o autocuidado para que o impacto da terapia substitutiva seja o mais positivo possível.
Como observado neste estudo, a literatura aponta que a principal atribuição dada ao transplante é a possibilidade de vida nova, recomeço ou ressignificação da vida. Diante disso, os sentimentos acerca de todo o contexto, desde o diagnóstico até a transplantação, tendem a ser contraditórios, pois de um lado há a ansiedade da espera, as dúvidas envoltas de tal tratamento e o medo do desconhecido e da morte, enquanto do outro, há a esperança, a satisfação, a liberdade e a felicidade sentida.8
Tal modalidade terapêutica é colocada como a forma de libertação do tratamento hemodialítico, que permite à pessoa acreditar na renovação, na continuidade da vida e na normalização da mesma, pois é restituída a sensação de controle e de autonomia, elementos antes limitados.7) Assim, é visto que a maioria dos sentimentos está relacionada ao período anterior ao transplante, quando todas as ações das pessoas eram baseadas na hemodiálise. Ou seja, há uma mudança no panorama de vida ao longo de todo o processo.
Embora as pessoas transplantadas saibam que esse é um tratamento que visa à melhora da qualidade de vida e não a cura da doença, elas o colocam como restituidor de vida, pois após o procedimento acreditam que ela volta a ser como era antes da doença, como se tivessem ganhado a chance de viver novamente, de forma digna.9) Além disso, é de conhecimento das mesmas, como afirmou E15 o qual citou em um depoimento esta expressão “nas condições que eu posso fazer” que, por não haver recuperação integral da saúde, limitações cotidianas podem ser vivenciadas. No entanto, ainda consideram a “nova vida” como normal, pois respeitam tais limitações para manterem a saúde.
Ademais, a pessoa com o transplante renal está ciente de não estar livre da necessidade de cuidados, pois é preciso manter uma rotina como o uso das medicações, 9) exemplo esse apresentado pelo E3. Ainda assim, há uma nova perspectiva, sem a dependência de máquinas, em que há esperança e todos os dias podem ser vividos. Essa independência é vista no momento em que há diminuição de manifestações clínicas e limitações da doença. Desse modo, a colocação de vida normal é feita devido à retomada de muitos hábitos e funções.10
Situação essa expressada pelos entrevistados, deste estudo, quando apontam poder sair na hora que querem, caminhar, andar de bicicleta, jogar futebol, dentre outras atividades, sejam de lazer ou sociais. Isto é, a autonomia é retomada, assim como o poder de decisão de ir e vir, a sensação de liberdade e a independência. Dados esses que corroboram com uma pesquisa que, perante os resultados, abordou a existência da possibilidade de acesso ao lazer, praticar atividades físicas e ter uma vida social com a família e os amigos.9) Assim, a realização de atividades como essas representam o poder de escolha que as pessoas com o transplante renal passam a possuir.
Com o retorno da vida social, que diante da realização da diálise, sofre prejuízo devido o tempo dentro de uma unidade nefrológica e das limitações causadas pelo tratamento, é visto que, embora os transplantados possam regressar às atividades, nas laborais é baixo o índice dos que retornam.8 Situação essa observada no depoimento de E12, em que afirma não poder trabalhar. Nesse sentido, as pessoas precisam seguir uma rotina de cuidados para garantir a sobrevida do órgão transplantado, como o uso contínuo das medicações imunossupressoras nos horários estabelecidos, a frequente realização de exames laboratoriais, bem como, o acompanhamento médico periódico para avaliação do estado de saúde.
Ademais, o significado de ser bom para os participantes deste estudo consiste em haver o distanciamento da terapia hemodialítica e da máquina dialisadora. Para eles, o transplante incidiu em um novo viver, com um sentido especial de libertação e de renascimento. Desse modo, reforçam em diversos momentos da entrevista este pensamento: o de estar livre e de possuir uma vida nova. Esse significado decorre das vivências na hemodiálise como o penoso tempo de tratamento e o medo da morte.11) Reiterando, autores descrevem que presenciam em sua prática profissional a melhora da qualidade de vida das pessoas transplantadas renais, por meio da libertação do convívio cotidiano com a hemodiálise.3) Assim, as pessoas que realizaram o transplante acreditam que essa terapêutica modificou suas vidas para melhor, a partir da maior liberdade, da tranquilidade e do bem-estar adquirido.7
Ainda, o transplante renal possibilitou aos participantes do estudo um “andar livremente” e uma alimentação menos regrada. Dado semelhante foi encontrado em estudo desenvolvido em um hospital universitário na região Sul do Brasil, com 16 transplantados e 14 profissionais da saúde, em que os entrevistados relataram liberdade no que diz respeito à vida, à alimentação, à ingestão de líquidos e à convivência social.12
Apesar de o transplante renal trazer muitos benefícios no viver dos participantes deste estudo, existem medos em que essas pessoas necessitam conviver, como a dúvida em relação à durabilidade do enxerto e a possibilidade de falência do órgão, com o possível retorno para a hemodiálise. Também, eles percebem que o transplante não é a solução total para os problemas advindos do adoecimento dos rins, mas um aumento na sobrevida. O processo de transplante renal pode trazer consigo consequências negativas, pois, apesar da perspectiva de melhora na condição do viver e da saúde, o medo, o receio da morte e a possibilidade de rejeição fazem parte do cotidiano de quem o experiencia.11
Outro aspecto salientado neste estudo foi a construção do conhecimento dos participantes em relação ao transplante renal a partir da mídia e dos profissionais da saúde, com destaque para o profissional médico. Nos depoimentos encontrados, ficou evidente que as pessoas transplantadas carecem de informações claras e concisas para entenderem a terapêutica estabelecida anteriormente ao procedimento cirúrgico, principalmente, o fato do transplante ser um tratamento e não a cura da DRC.
Em muitas situações, as pessoas com a DRC não têm conhecimento a respeito das diferentes modalidades terapêuticas, sobretudo, do transplante renal. Nesse sentido, percebe-se a necessidade de serem orientadas para que possam ser sujeitos ativos nos processos decisórios sobre a sua saúde/doença. Assim, a comunicação e a oferta de orientações, de acordo com as singularidades de cada, tornam-se essenciais a fim de possibilitar o esclarecimento da condição de saúde/doença para as pessoas que vivenciam a DRC e o transplante.13
Em conclusão, a partir das entrevistas, pode-se perceber que o significado do transplante renal foi prioritariamente positivo na vida das pessoas que o realizaram, sobretudo, pela aproximação com o viver “normal”. Assim, aspectos relacionados a possuir uma nova vida, realizar diversas atividades e melhoria na qualidade de vida podem superar toda a ilusão de cura da DRC dada ao tratamento.
Por outro lado, os entrevistados também manifestaram relatos que significaram aspectos negativos, como por exemplo, o deparar-se com o temor da rejeição do enxerto. Fator esse que leva a repensar no viver das pessoas após o transplante renal. Assim, profissionais da saúde, em especial a área da Enfermagem, pode contribuir no cuidado biopsicossocial por meio de orientações para o enfrentamento da DRC que persiste e do tratamento realizado.