Introdução
A enfermagem é uma área do conhecimento inserida na produção científica brasileira que investiga problemas de saúde, e vem contribuindo para a fundamentação da prática baseada em evidências, bem como para a melhoria da saúde e da produtividade do trabalhador. Na perspectiva do cuidado amplo e continuado emerge a necessidade crescente de utilização de instrumentos de medida para diferentes grupos.1
No contexto das Ciências, a saúde do trabalhador apresenta necessidade emergente de discussão, visto que os brasileiros estão sujeitos a cargas excessivas de trabalho, que podem inferir em custos humanos como fadiga, estresse, doenças e acidentes, repercutindo na produtividade do trabalho.2
Acidentes de trabalho e doenças ocupacionais ocorrem habitualmente dentro de ambientes inapropriados, de forma abstrata implicando em processos de saúde complexos que exigirão maior tempo de recuperação. Fato percebido em estudo transversal realizado com equipe multiprofissional de saúde mental.3
Quanto às origens do adoecimento ocupacional em trabalhadores da saúde estão a sobrecarga de trabalho por fatores estruturais e o processo de trabalho.4 Fala-se do risco ocupacional, condição ambiental que pode interferir na saúde do trabalhador e repercutir em adoecimento mental e físico.5,6
O adoecimento pode ser identificado em muitos lugares como em um edifício. Neste contexto acontece a “Síndrome do Edifício Doente” (SED), que acontece quando a maioria dos trabalhadores ocupantes manifestam as mesmas queixas de adoecimento. Sendo interessante estabelecer uma visão global sobre todos os setores e funcionários do local do trabalho, para o diagnóstico e tratamento das doenças diagnosticadas.7
A SED é uma realidade de muitos países6-8 e o termo tem sido utilizado desde 1983 para descrever situações agudas de saúde e efeitos no bem-estar experimentados por ocupantes de um edifício, em relação ao tempo gasto dentro do mesmo, sem justificativas por doenças prévias ou causas específicas.9
Como modo de detecção precoce da SED, um grupo de profissionais do Centro Nacional sobre Condições de Trabalho (CNCT) no âmbito do Ministério do Trabalho e Assuntos Sociais da Espanha elaborou o Cuestionario para Detección del Síndrome del Edifício Enfermo no ano de 1991, de autoria principal da médica Maria Dolores Solé Gómez. Trata-se de um questionário autoaplicável cujo objetivo consiste em coletar as informações necessárias sobre as queixas levantadas pelos ocupantes do edifício patógeno procurando a definição precisa destas, assim como investigar a sua magnitude e distribuição.10
O instrumento é composto por 60 itens e inicia com a obtenção de uma série de dados gerais sobre o edifício e seus ocupantes. Assim, a abordagem permite a coleta de variáveis para a definição qualitativa e quantitativa dos sintomas relacionados à SED, dentro da realidade dos ocupantes do possível edifício patógeno.10
Estima-se contribuir para a detecção precoce da SED no Brasil, no cenário de Saúde do Trabalhador brasileiro. Logo, foi objetivo deste estudo traduzir e adaptar transculturalmente o Cuestionario para Detección del Síndrome del Edifício Enfermo para o contexto de trabalhadores de saúde brasileiros.
Métodos
Este artigo é oriundo de Dissertação de mestrado intitulada “Tradução e adaptação transcultural do Cuestionario para detección del Síndrome del Edifício enfermo para trabalhadores de saúde brasileiros” no âmbito do Programa de Pós-Graduação em Enfermagem da Universidade Federal do Piauí.
Trata-se de um estudo metodológico, transversal, quantitativo, realizado na cidade de Teresina, Piauí, Brasil. Para o processo de adaptação transcultural do CDSEE, foram adotadas as etapas metodológicas descritas a seguir11,12 amplamente utilizadas em pesquisas nacionais e internacionais.13,14,15,16,17,18
Para o processo de adaptação transcultural do Cuestionario para detección del Síndrome del Edificio Enfermo, foram realizadas duas traduções para o português do Brasil, independentes por dois profissionais da linguística nativos do Brasil e bilíngues (português/espanhol). Após aprovação da versão síntese, a mesma foi direcionada a dois retrotradutores independentes, profissionais da linguística nativos de país de língua espanhola, bilíngues (fluentes no português). Em seguida houve a formação de um comitê de juízes, especialistas em áreas científicas, os quais foram selecionados a partir dos seus cadastros na Plataforma Lattes, sendo considerados critérios de seleção amplamente utilizados para adaptação transcultural e validação.11,12 As etapas de Tradução, Retrotradução e Comitê de Juízes aconteceram entre março e novembro de 2016.
O comitê de juízes foi constituído por um médico especialista em Saúde do Trabalhador; dois tradutores juramentos cuja língua materna é o espanhol, sendo bilíngues para o português do Brasil, uma pesquisadora, doutora em enfermagem, com atuação em Saúde do Trabalhador e estudo metodológico; e outra pesquisadora doutora em enfermagem com direcionamento científico a análise da situação do trabalho, sob a abordagem da ergonomia, morbimortalidade e riscos ocupacionais.
No mês de setembro de 2016, cada juiz recebeu o convite e esclarecimentos para participarem do estudo. Após o aceite, foram enviados um protocolo sobre a metodologia do estudo (adaptação transcultural), as versões traduzidas, síntese e retrotraduzidas, além de um instrumento contendo o comparativo entre a versão síntese e a versão original em espanhol, para a avaliação das equivalências semântica, idiomática, cultural e conceitual.
Após adaptação, o questionário foi aplicado em fase de Pré-teste a 37 trabalhadores de Saúde do hospital referência, os quais ocupavam o edifício há mais de seis meses da data da coleta de dados, regulamentados, com carga horária superior a 20 horas semanais. Foram profissionais de enfermagem (técnicos, auxiliares e enfermeiros), médicos, nutricionista, psicólogo e fisioterapeuta. Todos foram convidados a preencherem, individual e voluntariamente, o formulário de coleta de dados sociodemográficos, e logo o Questionário para Detecção da Síndrome do Edifício Doente (QDSED).
Após avaliação das equivalências, realizadas por um Comitê de Juízes, e adequações do pré-teste, os arquivos foram encaminhados para a autora do instrumento original na Espanha, obtendo-se parecer favorável a publicação.
Os dados coletados no formulário e nas questões 3, 5, 7 e 8 do instrumento, sobre idade, sexo, tempo no cargo e tempo de trabalho do QDSED sofreram processo de dupla digitação em Microsoft Excel e foram analisados no programa SPSS 23.0 (Statistical Package for Social Science). As variáveis numéricas foram abordadas por análise estatística descritiva univariada, utilizando-se tabelas de frequência para sumarizar os dados, bem como para representar as variáveis categóricas nominais.
Todo este processo ocorreu após a autorização da autora do CDSEE original, e também posterior a aprovação pelos Comitês de Ética em Pesquisa da Universidade Federal do Piauí, parecer número 1.618.475 em 01/07/2016, e do hospital Getúlio Vargas no Estado do Piauí, onde foi realizada a coleta de dados para o pré-teste, parecer 1.709.252 de 01/09/2016.
Resultados e Discussão
Após avaliação pelos membros do comitê, realizou-se uma revisão de todas as anotações e pontuações obtidas em cada item, considerando a alteração dos itens que com pontuação entre 1 e 4, o que culminou em uma versão brasileira consensual.
Destaca-se que houve convergência de opiniões entre os juízes, em alguns itens, como: Você trabalha em (...), Você se senta a menos de 5m da janela, na substituição da palavra barulho por ruído, e no intercâmbio de conceitos, Ar parado ao invés de ar estagnado. Ao todo, 45 sugestões foram aceitas, como: Grau de instrução substituído por estudos realizados, antiguidade no posto por tempo de serviço. Os juízes especialistas divergiram em 3 itens, sendo necessário consenso entre os mesmos e as pesquisadoras deste estudo. O item 6, apesar das divergências, possibilitou um arranjo de alterações que contemplaram ideias de 3 juízes: trabalhadores especializados.
Sobre o termo Edifício, considerou-se manter a palavra em detrimento de Prédio, a fim de conseguir a similaridade entre as versões original e brasileira, não observando prejuízos de algum valor, já que as palavras são utilizadas na língua portuguesa (Brasil), possuindo significado semelhantes.19
Os itens 12 e 13 estiveram em cheque quanto a sua retirada, pois tratam do fumo no local de trabalho, atividade proibida no país por Lei constitucional nº 9.294/1996.20 Considerou-se manter os itens com vistas ao diagnóstico precoce da prática tabagista.
No item 17, considerou-se excluir os termos máquina de franquear e máquina de escrever, pois são pouco utilizados no contexto brasileiro. Outras contribuições foram sugeridas/aderidas (em negrito) e estão descritas junto à avaliação das equivalências (pontuadas entre +1: equivale /0: indeciso /-1: não equivale) por juiz, identificado conforme iniciais do nome (Quadro 1).
Item | SUGESTÕES | S | I | E | C | AD |
---|---|---|---|---|---|---|
1 | Juiz 1. No Brasil é mais usual setor | 0 | 0 | 0 | 0 | x |
4 | Juiz 1. |
-1 | -1 | -1 | 0 | x |
6 | Juiz 2. Serventes, |
1 | -1 | -1 | -1 | x |
7 | Juiz 1. Antiguidade por |
-1 | -1 | -1 | -1 | x |
8 | Juiz 3. A palavra prédio acho que ficaria mais adequada | 1 | -1 | 1 | 1 | |
Juiz 4. Incluir o pronome |
0 | 1 | 1 | 1 | x | |
9 | Juiz 4. Substituir lugar por |
0 | 0 | 1 | 1 | |
10 | Juiz 4. Quais dias da semana |
0 | 1 | 1 | 1 | x |
11 | Juiz 4. Quantas horas |
0 | 1 | 1 | 1 | x |
12 | Juiz 1. Você fuma em seu local de trabalho? | -1 | -1 | -1 | -1 | |
17 | Juiz 1. Substituir máquina de franquear por |
-1 | -1 | 0 | 1 | |
19 | Juiz 1. Ar estagnado não é um termo compreensível normalmente pelos trabalhadores | -1 | -1 | 0 | 0 | x |
Juiz 2 |
1 | -1 | -1 | 1 | x | |
24 | Juiz 1. Trocar falta de intimidade por |
-1 | -1 | -1 | -1 | x |
Juiz 2. |
-1 | -1 | -1 | -1 | x | |
28 | Juiz 3 |
1 | -1 | 1 | 1 | x |
Juiz 2. Não tem sentido a última questão. O que tem a ver o ritmo do trabalho com “poderia ser feito mais coisas”? | -1 | -1 | -1 | -1 | ||
Juiz 5. Erro semântico - correto |
-1 | -1 | -1 | -1 | x | |
42 | Juiz 1. Fixo - por tempo determinado Fixo - permanente / |
-1 | -1 | -1 | -1 | x |
54 | Juiz 2. |
-1 | -1 | -1 | -1 | x |
57 | Juiz 2. |
-1 | -1 | -1 | -1 | x |
58 | Juiz 2. |
-1 | -1 | -1 | -1 | x |
S -Semântica; I -Idiomática; E -Experiencial; C -Conceitual; AD-Sugestão aderida.
Após aprovação da versão brasileira consensual, foi elaborada a versão pré-final, a qual foi aplicada em teste piloto junto a um formulário sociodemográfico. A amostra de 37 participantes desta etapa foi composta por adultos jovens, entre 22 e 35 anos (51,35 %), com predominância do sexo feminino (67,56 %), procedentes do Piauí (81,08 %) e estados fronteiriços. Os técnicos de enfermagem (40,54 %) constituíram a maior categoria profissional, seguidos de enfermeiros (24,32 %) e médicos (13,51 %). Grande parte referiu estado civil casado (43,24 %) e praticarem a religião católica (62,16 %), sendo considerados de classe média com renda familiar entre 3.600 e 5.000 reais (37,83 %), Tabela 1.
Sobre o tema Síndrome do Edifício Doente, apenas dois participantes (5,41 %) manifestaram conhecimento. Quase todos preocupavam-se com a saúde durante o trabalho (94,59 %), contudo boa parte (29,73 %) já sofreu problema de saúde de origem física, relacionado ao trabalho. Quase metade dos profissionais possuem tempo de serviço entre 2 e 20 anos (21,62 %), sendo esta experiência comum dentro do mesmo edifício hospitalar em estudo (54,06 %) (Tabela 1).
Variáveis | N | % |
---|---|---|
Já ouviu falar sobre *SED? | ||
Sim | 2,0 | 5,41 |
Não | 35,0 | 94,59 |
Preocupa-se com sua saúde durante o trabalho? | ||
Sim | 35,0 | 94,59 |
Não | 2,0 | 5,41 |
Sofreu algum problema de saúde (Físico ou Mental) por causa do trabalho? | ||
Físico | 11 | 29,73 |
Mental | 2 | 5,41 |
Físico e Mental | 5 | 13,51 |
Não sofreu problema de saúde | 19 | 51,35 |
Tempo de Serviço | ||
6 meses a 1 ano | 6 | 16,21 |
2 a 20 anos | 21 | 56,76 |
21 a 40 anos | 9 | 24,32 |
Não Informado | 1 | 2,70 |
Tempo que trabalha no mesmo edifício | ||
6 meses a 1 ano | 8 | 21,62 |
2 a 20 anos | 20 | 54,06 |
21 a 40 anos | 7 | 18,91 |
Não Informado | 2 | 5,41 |
Total | 37 | 100,00 |
N: Número de frequência absoluta.
Por meio da aplicação do pré-teste, foi possível identificar palavras ou expressões que poderiam causar dúvidas. Além disso, os profissionais de saúde contribuíram ao serem questionados em relação à compreensão e clareza do instrumento e sugerirem alterações/ complementação na escrita. Este momento ocorreu mediado por perguntas abertas, e pela identificação de dúvidas durante o preenchimento do questionário, as quais foram anotadas e discutidas pelas entrevistadoras. A partir das sugestões da população alvo, realizaram-se modificações nos itens 7, 10, 11, 14, 17, 18, 23, 37 e 40.
Os questionários foram preenchidos de forma auto-administrada, e os formulários por entrevistas. O tempo médio deste processo durou 8 minutos, e as entrevistadoras permaneceram próximas para sanar possíveis dúvidas e perceberem as dificuldades de clareza e coesão do questionário. No geral, o instrumento foi respondido sem dificuldades.
A proposta foi avaliar o nível de compreensão dos itens pelos participantes (trabalhadores de saúde), considerando as sugestões de mudanças de alguns deles. Assim, alguns julgaram necessário simplificar a escrita do instrumento, elaborando linguagem mais inteligível que contemplasse diferentes grupos alvos. Por exemplo, remover a palavra escritório dos itens 14 e 18.
Considerando o regime de trabalho dos participantes, os mesmos sentiram dificuldades em responder ao item 10, sugerindo abolir que fossem marcados os dias da semana em detrimento de um quantitativo de dias de trabalho por semana. Esta ideia foi considerada aceitável e interessante aos objetivos desse estudo. Alguns participantes referiram pouco tempo para se dedicar a proposta em estudo, porém, após responderem o questionário, sentiram-se estimulados a reflexão sobre suas condições de vida e trabalho, bem como satisfeitos pela contribuição que deram ao estudo.
Após avaliação final pela autora do instrumento original em espanhol, a mesma sugeriu adicionar ao processo mais uma retrotradução do instrumento adaptado para o português do Brasil, afim de que retornasse a língua mãe (espanhol castelhano) mais uma vez. Assim, o procedimento foi executado por um nativo da língua espanhola que residia na Espanha, professor de línguas e bilíngue para o português do Brasil. O resultado da retrotradução foi satisfatório, sendo adicionados por consenso entre as autoras, os ajustes:
Na questão 6, o termo trabalhadores foi mantido e substituiu profissionais, pois faz parte da categorização brasileira do trabalho em grandes.21
Na questão 23, considerou-se retirar o termo carpetes, pois no contexto dos edifícios hospitalares brasileiros não são utilizados, conforme regulamentações sobre o piso de ambientes hospitalares ser liso e de fácil limpeza.22 Por fim, a questão 42, foi adequada ao Ministério Público do Trabalho brasileiro, onde foram verificados os tipos de contratos por limites de tempo:21Fixo, por tempo determinado (2 anos); Fixo, por tempo indeterminado; Eventual, por experiência (3 meses); Eventual, temporário (3 meses).
Em seguida a autora do instrumento original emitiu parecer favorável à versão traduzida e adaptada ao português do Brasil para trabalhadores de saúde, do Questionário para detecção da Síndrome do Edifício Doente.
A tradução e adaptação de instrumentos como o CDSEE, de reconhecimento internacional é importante para a Enfermagem, enquanto atividade profissional e ciência em Saúde, além de permitir intercâmbio e comparação entre variáveis comuns e realidades contextuais distintas.
Para adaptar transculturalmente o Cuestionario para Detección del Síndrome del Edifício Enfermo (CDSEE) ao contexto de trabalhadores de saúde brasileiros, este estudo seguiu etapas confiáveis com a realização do Comitê de juízes especialistas prévia ao pré-teste.11-12 Cada etapa foi realizada com rigor metodológico, uma vez que foram muitas as recomendações dos tradutores e juízes, junto as quais as pesquisadoras necessitaram consenso. Assim obteve-se equivalência semântica, idiomática, cultural e conceitual entre a versão sintetizada das traduções e a original (em espanhol). Devido às disparidades culturais entre Espanha e Brasil, alguns verbos e substantivos necessitaram adequações.
A fundamentação teórica do instrumento na versão original foi importante. Esta possui como raiz do construto original conceitos desenvolvidos pela Organização Mundial de Saúde que em 1982 onde a SED foi definida como conjunto de doenças originadas ou estimuladas pela contaminação do ar em espaços fechados que produzem sintomas característicos em pelo menos 20 % dos ocupantes: sequidão e irritação das vias aéreas respiratórias, pele e olhos; cefaleias, fadiga mental, resfriados persistentes e hipersensibilidades inespecíficas, sem causas definidas.23 Posteriormente, este conceito foi ampliado para as demais fontes de adoecimento no trabalho.10
A adaptação transcultural de instrumentos para mensuração de fenômenos em saúde é de recente interesse para os pesquisadores brasileiros.24,25,26,27 Em contrapartida, a correta tradução e adaptação cultural de um questionário nem sempre garante a preservação de suas propriedades psicométricas, sendo necessária a validação para o idioma de destino.11
A possibilidade de identificação de fenômenos em saúde considerados emergentes em diferentes culturas e espaços geográficos torna os processos de tradução e adaptação transcultural de instrumentos uma vertente bastante utilizada na atualidade como demonstrado nos estudos citados.
Quanto ao instrumento em questão, o CDSEE vem sendo utilizado na Espanha e em outros países de língua espanhola. Na Venezuela, foi meio para avaliar os efeitos das condições ambientais na saúde dos trabalhadores de um hospital de emergência. Foram detectados sintomas oculares e dor lombar que estariam associados à iluminação incorreta e riscos ergonômicos.28 Já em um hospital terciário de Madri, o CDSEE identificou 92 casos de trabalhadores com sintomas da Síndrome do Edifício Doente, os quais apresentavam pouco mais de 3 anos de trabalho no mesmo edifício com média de 7 horas de atividade por dia.29 Assim, observa-se a relevância diagnóstica do questionário em estudo, considerando os resultados dos estudos citados em diferentes contextos culturais.
O pré-teste, realizado com 37 trabalhadores de saúde de variadas formações, trouxe conceitos específicos a serem explorados, diagnóstico de problemas de saúde relacionados a turnos prolongados e a tomada de decisão do trabalhador. Entretanto, ao contemplar um grupo específico, o QDSED limita-se em abranger as especificidades de profissionais de outros setores que não o da saúde, onde alguns estudos com o mesmo questionário na versão original já tem investigado sintomas da SED.30
De forma global, a Saúde do Trabalhador prática deve iniciar com o autocuidado, direcionada a própria percepção do trabalhador sobre seu cotidiano, ritmo e condições de trabalho. Para isso o processo de adaptação transcultural propicia a mensuração de caracteres específicos a contextos culturais diferenciados, permitindo, ao mesmo tempo, uma análise ampla do problema. Logo, os trabalhadores na Espanha e no Brasil terão domínio sobre a ferramenta Questionário para detecção da Síndrome do Edifício Doente, de forma igualitária, porém específica às suas realidades.
Destacam-se benefícios relacionados a Ascenção da Qualidade de Vida no Trabalho de Enfermagem, a qual pode ser repensada após os achados deste estudo, e considerada como determinante social em saúde do grupo de trabalhadores. Assim, além de evidências quantitativas, o estudo traz inquietações filosóficas sobre o tema, que perpassam os trabalhadores, sujeitos do cenário, bem como pesquisadores e gestores.
Finalmente, foram seguidos rigorosamente os processos internacionalmente aceitos de tradução e adaptação cultural. Frente aos resultados aqui encontrados, a versão adaptada do CDSEE para o português do Brasil, no contexto dos trabalhadores brasileiros pode ser utilizada para mensurar a síndrome do edifício doente.
O questionário foi utilizado inicialmente na Espanha com amostra de trabalhadores em diversas áreas, portanto possui questões pertinentes ao trabalhador, porém generalistas. A proposta de adaptação cultural para trabalhadores de saúde brasileiros esteve relacionada ao fato de que esta área apresenta alto risco para insalubridade física e psíquica, conforme demonstrado no referencial teórico deste estudo, sendo necessário contemplar a saúde do trabalhador na perspectiva, também, da qualidade da assistência.
Em conclusão, os resultados mostram que a versão adaptada do CDSEE, no contexto dos trabalhadores brasileiros, pode ser utilizada para mensurar a SEE. Os juízes contribuíram para a comparação entre as equivalências do questionário original e do questionário traduzido para o português do Brasil. Esta etapa foi essencial para a fidedignidade das ideias chaves do instrumento original de modo a homogeneizar as versões.
Os Trabalhadores de Saúde entrevistados foram adultos-jovens, com tempo prolongado de trabalho no mesmo edifício, o que configurava critério relevante para o alcance dos objetivos propostos. Os mesmos fizeram sugestões para mudanças no instrumento, as quais foram adequadas a atual realidade saúde brasileira. Também manifestaram preocupação com o exercício saudável do trabalho.
Por fim, o estudo implica em produção do conhecimento científico acerca da temática, bem como possibilita a avaliação da Saúde do trabalhador brasileiro ao disponibilizar o instrumento para o uso da comunidade científica.
Limitações
Como limitações, destaca-se a escassez de literatura nacional e internacional sobre a temática, bem como a resistência de alguns profissionais que participaram do pré-teste em relatar possíveis problemas de saúde relacionados ao exercício da atividade laboral.