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Revista Cubana de Estomatología

versión impresa ISSN 0034-7507versión On-line ISSN 1561-297X

Rev Cubana Estomatol v.47 n.4 Ciudad de La Habana oct.-dic. 2010

 

ARTÍCULOS DE REVISIÓN

 

Síndrome da ardência bucal: uma revisão sobre aspectos clínicos, etiopatogenia e manejamento

 

Síndrome de ardor bucal: aspectos clínicos, etiopatogenia y tratamiento

 

Burning mouth syndrome: clinical characteristics, etiological factors and treatment

 

 

Frederico Omar Gleber NettoI; Ivana Márcia Alves DinizI; Soraya de Mattos Carmargo GrossmannII; Maria Auxiliadora Vieira do CarmoIII; Maria Cássia Ferreira de AguiarIII

IGraduação em Odontologia pela Faculdade de Odontologia da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Belo Horizonte, MG-Brasil.
IIDoutoranda em Odontologia pela Faculdade de Odontologia da UFMG. Belo Horizonte, MG-Brasil.
IIIProfessor Associado, Departamento de Clínica, Patologia e Cirurgia Odontológicas-Faculdade de Odontologia da UFMG. Belo Horizonte, MG-Brasil.

 

 


RESUMEN

El síndrome de boca ardiente (SBA) es una enfermedad crónica que se caracteriza por una sensación de quemazón de la mucosa bucal, que impresiona clínicamente normal. Es una entidad nosológica frecuente, sin embargo, los mecanismos implicados en su desarrollo en la actualidad son poco conocidos. El objetivo de este trabajo fue llevar a cabo una revisión de la literatura sobre dicho síndrome y se hizo énfasis en sus principales factores etiológicos y en el tratamiento de esta enfermedad. El SBA es una afección multifactorial compleja, debido a la diversidad de sus síntomas, dificultad en el tratamiento y las características psicológicas particulares de los pacientes. El diagnóstico correcto es el elemento principal para establecer el tratamiento. Es necesario realizar nuevas investigaciones para aclarar con precisión las causas del SAB, especialmente en la forma primaria.

Palabras clave: síndrome de boca ardiente, etiología, diagnóstico, tratamiento.


ABSTRACT

Burning mouth syndrome (BMS) is a chronic condition characterized by burning sensation on a clinic normal oral mucosa. BMS is not a rare condition, however, mechanisms involved in their development remains poorly understood. The aim of this paper was to carry out a review of literature about this syndrome, highlighting the main etiological factors as an approach to the management of this condition.

Key words: Burning mouth syndrome, etiology, diagnosis, treatment.


 

 

INTRODUÇÃO

Síndrome da ardência bucal (SAB) é uma condição crônica, caracterizada pela queixa de ardência em uma mucosa oral onde nenhuma lesão foi identificada.1 Apesar do grande número de publicações sobre esta patologia, sua patogênese e tratamento continuam pouco esclarecidos, bem como o seu conhecimento pelos profissionais de odontologia.2

Objetivo deste trabalho é caracterizar a SAB quanto às suas formas de apresentação e diagnóstico e realizar uma revisão sistematizada sobre a etiologia e tratamento desta alteração.


Epidemiologia e caracterização

A prevalência da SAB na literatura é variável, com taxas entre 3,7 % e 5,4 %, provavelmente devido à divergência de critérios utilizados para o diagnóstico da alteração.3,4 O sexo feminino é preferencialmente afetado, sendo que 86 % a 90 % das mulheres com os sintomas já passaram pela menopausa.3-7 Apesar de pessoas de meia idade e idosos serem alvos preferenciais da BMS, uma ampla faixa etária pode ser acometida. As variações de idade vão de 25 a 97 anos,8,9 e a idade média de acometimento encontra-se entre 54 a 71,2 anos.

O sintoma principal, e que caracteriza a SAB, é a sensação de ardência em uma mucosa sem lesões, no entanto, alguns pacientes podem relatar também calor, fisgadas, tremor, coceira, dor, inchaço, sensação de corpo estranho ou sensação de queimadura com líquido quente.6,7 Os sintomas podem estar restritos a um local específico da cavidade oral ou afetar várias regiões da mucosa, e embora os 2/3 anteriores da língua sejam mais afetados, qualquer sítio bucal pode estar envolvido.3,5-6,8

A intensidade da ardência na SAB é variável,3,6,7 e pode ser acompanhada por náusea, dores de cabeça e vertigem; aumentar com a tensão, fadiga, o ato de falar e consumo de comidas quentes; e diminuir com o sono, com a alimentação, com comidas frias, com o trabalho, com distrações e consumo de álcool.5

A partir da análise do período e duração da ardência e dor são descritos três tipos diferentes de manifestações para a SAB:10 O Tipo 1 é caracterizado pela ausência de sintomas pela manhã, ao acordar, mas com o transcorrer do dia a dor se inicia e aumenta progressivamente, atingindo seu ponto mais intenso no início da noite; no Tipo 2 há sensação contínua de queimação durante o dia, desde o momento que o indivíduo acorda; e o Tipo 3 é caracterizado por sintomas intermitentes, apresentando dias sem sintomas e acometimento de sítios menos comuns como o assoalho bucal e a garganta.10

Os sintomas dolorosos podem ser acompanhados pela queixa de boca seca e de alteração no paladar.11 O percentual de pacientes com sensação de boca seca varia bastante entre diferentes trabalhos (30 % a 75 %) e nem sempre este sintoma está associado à redução do fluxo salivar.3,6-8 Para alguns autores, a secura bucal em pacientes com SAB se deve a alterações locais ou sistêmicas, sem associação com a síndrome, tais como o uso de medicamentos, ansiedade e estresse.3,12

As alterações relacionadas ao paladar são relatadas entre 11 % até 69 % dos pacientes, em duas formas de apresentação: presença de um sabor persistente, amargo ou metálico; ou alteração na percepção do sabor com aumento da percepção para o sabor amargo e para o sabor ácido, e diminuição da percepção para o doce. Para o sabor salgado, metade dos pacientes relata aumento da percepção e a outra metade relata diminuição.3,5,6


Diagnóstico e etiología

Os critérios utilizados para o diagnóstico da SAB são variáveis, o que torna difícil a comparação entre os estudos. Muitos critérios foram propostos, entretanto, alguns são excessivamente excludentes.13 Em geral, o sintoma principal, caracterizado pela sensação de ardência (ou outra sensação dolorosa), deve ter as seguintes características: a sensação deve ser sentida profundamente na mucosa; deve estar presente há mais de 4-6 meses enquadrando-se em algum padrão de manifestação;10 não deve interferir com o sono; deve sofrer remissão durante a alimentação. Outros sintomas poderão ser identificados: sensação de boca seca; alterações no paladar; alterações sensoriais e alterações psicológicas como ansiedade e depressão.13

A presença desses sintomas deve ser comparada com a investigação clínica da mucosa oral do paciente. Na presença de quaisquer alterações na mucosa que possam estar relacionadas aos sintomas o diagnóstico de SAB é adiado até que se realize o tratamento da lesão de mucosa e se observe a remissão ou não dos sintomas. Se estes persistirem após a resolução da lesão, é feito o diagnóstico de SAB, ou SAB complicada.13 Todavia, se não houver alterações clínicas na mucosa desse paciente, o diagnóstico inicial de SAB é mantido.

O passo seguinte, após o diagnóstico, é a estratificação da doença em SAB primária ou SAB secundária.13 A SAB primária, também chamada de idiopática, é observada quando não se encontram fatores predisponentes associados ao desenvolvimento da síndrome. Já na SAB secundária é possível a identificação e associação com fatores predisponentes de diferentes categorias e na maioria das vezes, ela será sensível ao tratamento para a condição associada. Os fatores predisponentes que podem estar associados à SAB secundária são vários, mas em geral podem ser classificados em 5 grupos: locais, sistêmicos, medicamentosos, neurológicos e psicológicos. É comum, no desenvolvimento da doença a participação de causas de diferentes grupos.

Fatores locais - Infecções por Candida albicans e Helicobacter pylori, na mucosa bucal podem se manifestar de forma sub-clínica e produzir sintomas de ardência bucal sem promover alterações clínicas.14,15 A ocorrência destas infecções pode ser facilitada pela ocorrência de xerostomia ou alterações na composição salivar,7 ou até mesmo pela presença de diabetes mellitus descompensada.15 A relação entre o uso de prótese dentária e a SAB já foi bastante abordada;10,16 mas uma atenção maior tem sido dada aos casos em que a prótese se encontra mal adaptada, seja alterando a dimensão vertical de oclusão ou comprometendo o espaço lingual. As más-adaptações induzirão alterações musculares e hábitos parafuncionais, que podem culminar com alterações neuropáticas dolorosas na cavidade oral.17

Fatores sistêmicos - As alterações sistêmicas que causam sintomas de ardência bucal sem promover alterações clínicas locais são muitas, serão abordadas aqui apenas as principais. Pacientes com SAB são 3,58 vezes mais propensos a desenvolver problemas gastrointestinais do que pessoas sem SAB principalmente gastrite, refluxo esofágico e flatulência.4,7,9,17,18 Entretanto, uma clara relação entre essas alterações ainda não foi descrita. A ocorrência de infecção por Helicobacter pylori na mucosa gástrica e na mucosa oral, concomitantemente, tem sido estudada e cogitada como uma possível causa da ardência bucal.4,14


A diabetes mellitus (DM) tem sido constantemente relacionada à SAB.10,15,16 A avaliação de pacientes com DM e SAB em comparação à pacientes com DM que não apresentavam a SAB, mostrou que os primeiros, além de serem preferencialmente do sexo feminino, apresentavam uma neuropatia periférica relacionada ao diabetes. Esta neuropatia denominada polineuropatia simétrica distal, foi considerada a causa da SAB nesses pacientes.19

Muitos pacientes com alterações tireoidianas apresentam sintomas semelhantes aos da SAB. Os hormônios tireoidianos atuam na maturação das papilas gustativas, assim em pacientes com hipofunção ou disfunção tireoidiana o paladar fica comprometido. Essa alteração ocorre principalmente em grupo específico de indivíduos denominados de supertasters, que são pessoas que apresentam um número aumentado de papilas gustativas. Em situações normais, as fibras nervosas do paladar e as fibras nociceptivas conectadas ao SNC inibem a área do cérebro que recebe estímulos álgicos. Nas alterações tireoidianas, a inibição das fibras nervosas aferentes do paladar pode desencadear um aumento da sensibilidade dos tecidos orais ao tato, a estímulos térmicos e a estímulos dolorosos, tendo como resultado final a dor, queimação e inchaço na mucosa oral.19-21

A prevalência de SAB entre pacientes com doença de Parkinson foi considerada maior do que entre a população em geral principalmente entre aqueles que estavam em tratamento com levodopa como possível efeito colateral deste medicamento.22 A dopamina possua um papel inibidor na modulação central da dor, outros autores23 atribuíram os sintomas da SAB nestes pacientes há uma diminuição dos níveis de dopamina endógena. Nenhuma das duas hipóteses, até o momento, foi confirmada.

O climatério tem sido relacionado à SAB há muito tempo, sendo o desconforto oral uma queixa comum entre as pacientes.16 A entrada prematura na menopausa pode ser um predisponente ao desenvolvimento da SAB.9

Fatores medicamentosos: Alguns medicamentos têm sido relacionados à ocorrência de sintomas semelhantes aos da SAB.3,4,7,24 entre eles, o efavirenz; antiretroviral utilizado contra o HIV; medicamentos para reposição hormonal; antidepressivos como a fluoxetina, sertralina e venlafaxina; clonazepam e principalmente os antihipertensivos.25 Dentre as diversas classes de anti-hipertensivos, apenas os inibidores do sistema renina-angiotensina (captopril, enalapril e lisinopril) e os antagonistas do receptor de angiotensina II (eprosartan e candesartan), foram relacionados com o surgimento da SAB.24,25 O uso de inibidores da enzima conversora de angiotensina, além dos sintomas de ardência também induziu disgeusia.24 A associação da SAB com o uso de diuréticos também é relatada.7

Um estudo caso controle mostrou que indivíduos com SAB consumiam mais ansiolíticos do que os do grupo controle.4 Entretanto, é difícil determinar se o consumo deste tipo de medicamento é a causa da SAB, ou se os sintomas crônicos da SAB estão promovendo alterações psicológicas que requerem consumo desse tipo de medicação. Além destes, um consumo significantemente maior de L-tiroxinas utilizadas no tratamento de hipotiroidismo foi detectado em pacientes com SAB reforçando a associação apresentada anteriormente.4,20,21

Fatores neurológicos: Dor em forma de queimação é característica de várias condições crônicas associadas a danos neurais. Dores crônicas podem também estar associadas a alterações no sistema nervoso simpático induzindo mudanças no fluxo sangüíneo e no funcionamento de glândulas sudoríparas.2 Entretanto, evidências de que alterações neurológicas são fatores causadores da SAB surgiram em um período relativamente recente. Experimentos em pacientes com SAB, envolven a estimulação elétrica dos neurônios trigeminais envolvidos no reflexo de piscar, demonstraram alterações caracterizadas por limiares sensórios aumentados e distúrbios na comunicação das fibras nervosas com o sistema nervoso central.26

Outros autores,27 também avalian o reflexo de piscar em pacientes com SAB, encontraram entre as alterações, neuropatia de fibras de pequeno diâmetro ou de grande diâmetro e aumento da excitabilidade do sistema trigeminal. Esses resultados evidenciaram que há uma anormalidade generalizada, possivelmente em múltiplos níveis, no processamento da informação somatosensória nestes pacientes.

As fibras nervosas também foram avaliadas a partir de biópsia da língua de pacientes com a SAB e estudo imunoistoquímico. Os resultados demonstraram que pacientes com SAB persistente possuem uma neuropatia sensória das fibras pequenas trigeminais, caracterizada pela perda significante das fibras nervosas epiteliais e sub-papilares. Também foi observado que havia uma diminuição da densidade das fibras nervosas amielínicas no epitélio, assim como um desarranjo difuso dos axônios. A densidade das fibras nervosas epidermais mostrou associação negativa com a duração da neuropatia, quanto maior a duração dos sintomas menor era a densidade nervosa. Além disso, foi observado que as fibras nervosas epiteliais são amielínicas, sugerindo uma função semelhante a nociceptores polimodais. Essas fibras nervosas epiteliais possuem interações sinápticas com botões gustativos das papilas fungiformes, e assim, sua estimulação pode induzir uma sensação de queimação e afetar a percepção gustativa. Isso poderia explicar porque a disgeusia é um sintoma freqüente na SAB. Além disso, a degeneração axonal pode induzir uma sensibilização da fibra nervosa e ser responsável pela hiperalgesia persistente. Os autores sugerem que a biópsia de língua possa ser utilizada como auxiliar no diagnóstico da SAB.28

Outros estudos29 demonstraram que o fluxo sangüíneo da mucosa bucal de pacientes com SAB, frente a um estímulo térmico, era maior do que nos pacientes sadios, principalmente no palato. Estes resultados sugerem que distúrbios na regulação da circulação mucosa possam fazer parte do espectro da SAB, podendo ter íntima relação com alterações na inervação autônoma da cavidade oral.

Fatores psicológicos: Alterações psicológicas são constantemente encontradas em pacientes com SAB,3,9,11,30,31 entre essas alterações podemos destacar a ansiedade, depressão, obsessão, somatização e hostilidade.31 Além disso, o consumo de medicamentos psicotrópicos parece ser significativamente maior entre estes pacientes quando comparados a indivíduos sem SAB.3,8,9 Embora diversos autores tenham sugerido que a SAB poderia ser um sintoma decorrente dessas desordens,31,32 o contrário também é possível e as alterações psicológicas podem ser decorrentes da situação crônica de dor provocada pela SAB, pelas dificuldades no tratamento ou até mesmo pela incerteza do diagnóstico.4,30 Em outras alterações neuropáticas crônicas os achados de alterações psicológicas são comuns, e estes são considerados efeitos da dor.2,13


Tratamento

Após o diagnóstico da SAB, antes de iniciar o tratamento, é necessária a estratificação da doença em SAB primária ou SAB secundária. Esta estratificação se baseia na identificação de quaisquer fatores predisponentes, descritos anteriormente, passo fundamental para a determinação da forma terapêutica a ser empregada. Para os casos de SAB secundária o tratamento muitas deverá ser feito por uma equipe multiprofissional, considerando que fatores locais e sistêmicos podem atuar conjuntamente e problemas psicológicos decorrentes dos sintomas crônicos podem estar presentes. Algumas vezes, o tratamento específico para a alteração indutora da SAB secundária, pode não resultar em cura dos sintomas sugerindo que o fator predisponente pode ter induzido alterações neuropáticas irreversíveis, e requerendo que o paciente receba uma terapia específica que atue na resolução de danos neuropáticos.13

O tratamento da SAB primária é uma tarefa mais difícil, uma vez que a causa da alteração é desconhecida. Neste caso, é feito o tratamento sintomático da síndrome, visando tratar ou aliviar os sintomas dolorosos. Na literatura são diversas as opções terapêuticas, apresentaremos aqui as mais comuns:

Ácido alfa lipóico: O ácido alfa-lipóico atua na estimulação de fatores de crescimento de nervos, possui efeito neuroprotetor e tem sido usado em estudos laboratoriais e clínicos que avaliam a reparação de danos neurais, especialmente em casos de polineuropatia diabética.33 A utilização do ácido alfa-lipóico via oral em pacientes com SAB primária levou a uma melhora dos sintomas em 76 % dos pacientes, embora nenhum caso apresentasse resolução completa dos sintomas.33 Estudo posterior com alteração da posologia e período de tratamento levou à resolução completa dos sintomas em 13 % dos pacientes, e em 74 % ocorreu grande melhora. Um acompanhamento de 12 meses demonstrou que a melhora obtida foi mantida em 73 % dos pacientes.34 Pacientes com SAB e com distúrbios psicológicos previamente submetidos a tratamento com tranqüilizantes não obtiveram melhora satisfatória de seus sintomas com o tratamento com ácido alfa lipóico podendo ser necessária a associação com a terapia cognitiva.35 Embora não se conheça ainda o exato mecanismo de ação desta medicação na SAB, sabe-se que o ácido alfa-lipóico eleva os níveis celulares de glutationa. Baixos níveis de glutationa podem causar estresse oxidativo, inflamações e dano neural, induzindo o desenvolvimento de um quadro de neuropatia periférica. Como a SAB pode se desenvolver a partir de uma neuropatia relacionada à produção de radicais livres e baixos níveis de glutationa intracelular, o ácido alfa-lipóico pode ser benéfico pelo menos para alguns destes pacientes.33-35

Capsaicina: A aplicação da capsaicina tópica em pacientes com neuropatias faciais é eficiente na melhora nos sintomas,36 entretanto, o uso do creme de capsaicina pode ter limitações quando usado na cavidade oral, devido às dificuldades inerentes à aplicação, manutenção da medicação no local e a presença do sabor amargo da capsaicina tópica. Com o uso da capsaicina sistêmica (0,25 % via oral por 1 mês) em pacientes com SAB primária houve redução significativa dos sintomas.37 Os efeitos adversos da capsaicina se apresentaram na forma de desconforto gástrico que aumentava progressivamente com o decorrer do tratamento. A eficácia da capsaicina em vários pacientes corrobora com a idéia da neuropatia na origem da SAB.

Benzodiazepínicos: Os benzodiazepínicos têm sido empregados no tratamento de condições dolorosas incluindo a neuralgia trigeminal e neuropatia diabética. Os principais benzodiazepínicos utilizados são o clordiazepóxido (Libruim) e o clonazepam. Estes medicamentos são agonistas do receptor GABA e se ligam centralmente ou perifericamente, promovendo inibição da dor.38 A utilização do clonazepam no tratamento de pacientes com SAB levou a uma redução dos sintomas dolorosos em 70 % dos pacientes, e surpreendentemente houve redução na queixa de distúrbios do paladar. A medicação foi mais eficaz quando empregada em baixas doses, principalmente em indivíduos jovens e em pacientes que apresentavam os sintomas há pouco tempo. Efeitos colaterais caracterizados por sonolência e alterações de humor influenciaram a interrupção do tratamento em alguns pacientes. Esses efeitos colaterais eram mais sentidos quando altas doses do medicamento eram requeridas para reduzir a queimação oral.38 A posologia empregada consistiu em: 0,25 mg antes de dormir por 1 semana. A dose máxima por dia não deveria ultrapassar 3 doses de 1 mg. O clordiazepóxido em doses de 5 a 10 mg 3 vezes ao dia levou a uma completa remissão dos sintomas em 14 % dos pacientes e 64 % do total apresentou alguma melhora no quadro clínico. O prolongamento do tratamento em casos não responsivos não teve nenhum efeito. Em alguns pacientes os benefícios do tratamento persistiram após a interrupção da terapia, em outros, entretanto, um tratamento contínuo ou intermitente foi necessário. Os resultados obtidos com o diazepam 6 a 15 mg por dia, foram semelhantes aos resultados encontrados para o clordiazepóxido.8 Apesar da eficácia dos benzodiazepínicos no tratamento da dor, o seu uso durante longos períodos de tempo é questionável devido aos seus efeitos colaterais, entre eles a dependência química e a indução ou agravamento de estados depressivos. Portanto, ansiolíticos só devem ser usados em pacientes que respondem bem ao tratamento, não devem ser prescritos em grandes quantidades, impedindo assim o abuso no uso da droga e o profissional deve avaliar constantemente o surgimento de efeitos colaterais, diminuindo ou descontinuando o tratamento nesses casos.2

Antidepressivos: Inicialmente os antidepressivos foram introduzidos no tratamento da SAB devido a constante ocorrência de distúrbios psicológicos associados. Evidências sugerem que esses medicamentos produzem analgesia independentemente da sua ação sobre a depressão. O efeito sobre a dor é sentido tanto com altas quanto com baixas doses do medicamento. A literatura recomenda o uso de antidepressivos para o tratamento de dores crônicas não-malignas, apenas quando todas as outras opções terapêuticas falharam ou quando distúrbios psicológicos, como a depressão, acompanham a dor. Dentre os antidepressivos, os tricíclicos, como a amitriptilina, parecem ser os mais eficazes no tratamento da SAB.2 Baixas doses de amitriptilina (25 a 75 mg por dia) podem ser administradas inicialmente em pacientes não deprimidos. Entretanto, a quantidade administrada deve ser ajustada de acordo com a resposta de cada paciente.13 Doses, com efeito, antidepressor, devem ser reservadas apenas para pacientes deprimidos, e devem ser prescritas em conjunto com o médico psiquiatra.2

Terapia cognitiva: O insucesso no tratamento de pacientes com SAB primária, através da terapia medicamentosa, pode indicar a necessidade de implementação da terapia cognitiva. O objetivo desta técnica é permitir a cada paciente compreender as causas dos seus sintomas. Assim, os pacientes são encorajados a refletir sobre a possibilidade de que esses sintomas sejam uma forma de se protegerem contra os seus problemas emocionais.13 Alguns autores acreditam que nos casos em que as terapias convencionais não tenham surtido efeito, o profissional pode lançar mão dessa opção terapêutica, entretanto, essa não deve ser a primeira opção no tratamento.32


Alguns trabalhos39,40 têm sugerido outras opções terapêuticas como o cloridrato de benzidamina e a lafutidina, entretanto uma quantidade maior de evidências é necessária para comprovar a eficácia desses medicamentos na SAB.

Ainda que entre os pacientes com SAB, a maioria não apresente redução do fluxo salivar, recomenda-se que o paciente seja submetido à mensuração do fluxo para a exclusão de alterações que estejam ocorrendo concomitantemente a SAB, e para que quando necessário, seja implementada alguma terapia de restabelecimento do fluxo salivar normal.

 

CONCLUSÃO

A SAB é uma doença complexa devido a diversidade de sintomas, multifatoriedade, dificuldade de tratamento e devido a características psicológicas particulares desses pacientes. O diagnóstico correto é o passo principal para o sucesso na terapia. Novas pesquisas são necessárias para elucidar, com precisão, as causas da SAB, em especial a forma primária. O conhecimento da alteração pelo profissional de saúde é a conduta mais importante na melhora do manejo desses pacientes.

 

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Recibido: 10 de agosto de 2010.
Aprobado: 30 de septiembre de 2010.

 

 

Dra. Maria Cássia Ferreira de Aguiar. Departamento de Clínica, Patologia e Cirurgia Odontológicas-Faculdade de Odontologia da UFMG. Belo Horizonte, MG-Brasil. E-mail: cassiafa@ufmg.br

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