SciELO - Scientific Electronic Library Online

 
vol.58 issue3Classification of specials patients according their dentist attention requirementsShape of the dental arch in medicine students author indexsubject indexarticles search
Home Pagealphabetic serial listing  

My SciELO

Services on Demand

Journal

Article

Indicators

  • Have no cited articlesCited by SciELO

Related links

  • Have no similar articlesSimilars in SciELO

Share


Revista Cubana de Estomatología

Print version ISSN 0034-7507On-line version ISSN 1561-297X

Rev Cubana Estomatol vol.58 no.3 Ciudad de La Habana July.-Sept. 2021  Epub Aug 21, 2021

 

Artículo original

Prevalência da queilite actínica em agricultores de uma região do sertão brasileiro

Prevalencia de queilitis actínica en agricultores de una región del interior brasileño

Prevalence of actinic cheilitis in Brazilian semi-arid region farmers

Izabelly Germinia Gomes de Melo1 
http://orcid.org/0000-0003-1613-9691

Fernando Flávio Souza Vaz1 
http://orcid.org/0000-0001-6540-9294

Adriano Referino da Silva Sobrinho1 
http://orcid.org/0000-0002-4733-3430

Natália Gomes de Oliveira2 
http://orcid.org/0000-0001-6937-1537

Marianne de Vasconcelos Carvalho1  2  * 
http://orcid.org/0000-0002-6815-5696

Eduardo Sérgio Donato Duarte Filho1 
http://orcid.org/0000-0003-2598-1813

Stefânia Jeronimo Ferreira1  3 
http://orcid.org/0000-0001-6656-6435

1Universidade de Pernambuco, Curso de Bacharelado em Odontologia. Arcoverde, Brasil.

2Universidade de Pernambuco, Programa de Pós-Graduação em Odontologia. Camaragibe, Brasil.

3Universidade de Pernambuco, Programa de Pós-Graduação em Saúde e Desenvolvimento Socioambiental. Garanhuns, Brasil.

RESUMO

Introdução:

A queilite actínica é uma lesão inflamatória com potencial de transformação maligna e desenvolvimento associado à exposição solar excessiva.

Objetivo:

Avaliar a prevalência de queilite actínica em um grupo de agricultores, bem como a percepção e conhecimento desse grupo sobre a lesão.

Métodos:

O estudo observacional de levantamento epidemiológico envolveu uma população de agricultores de uma região do sertão brasileiro. A amostra foi obtida por acessibilidade a essa população, e alcançou-se o total de 219 agricultores. Além do exame físico intraoral, utilizou-se um questionário estruturado para coleta dos dados.

Resultados:

A queilite actínica foi diagnosticada em 30,6% dos agricultores examinados. A lesão foi encontrada com maior frequência no sexo masculino (86,6%), com mais de 60 anos (64,2%) e leucodermas (58,2%). A maioria dos indivíduos com queilite actínica se expunham à radiação solar por mais de 30 anos (65,7%), por mais de 6h por dia (73,1%) e não se protegiam adequadamente (94%). Sexo, idade, escolaridade, hábito de beber e tempo de exposição solar tiveram uma correlação estatisticamente significante com a presença da queilite actínica (p<0,05). Verificou-se que 76,1% dos participantes não notavam sinais e 61,2% não percebiam sintomas da lesão. O conhecimento sobre queilite actínica foi baixo para 97% dos indivíduos com lesão.

Conclusões:

Os resultados demonstraram alta prevalência de queilite actínica, além de uma baixa percepção e conhecimento sobre esta lesão, o que indica a necessidade de realização de ações de educação em saúde.

Palavras-chave: queilite; epidemiologia; agricultores; patologia bucal

RESUMEN

Introducción:

La queilitis actínica es una lesión inflamatoria con potencial de transformación maligna y desarrollo asociado con la exposición excesiva al sol.

Objetivo:

Evaluar la prevalencia de queilitis actínica en un grupo de agricultores brasileños y la percepción y conocimiento que estos tienen sobre la lesión.

Métodos:

Estudio observacional epidemiológico. Incluyó una población de agricultores de una región rural brasileña. La muestra, constituida por 219 agricultores, se obtuvo por accesibilidad a esta población. Además del examen físico intraoral, se utilizó un cuestionario estructurado para recopilar los datos.

Resultados:

Se diagnosticó queilitis actínica en el 30,6 % de los agricultores examinados. La lesión se encontró con mayor frecuencia en hombres (86,6 %), mayores de 60 años (64,2 %) y leucodermos (58,2 %). La mayoría de las personas con queilitis actínica estuvieron expuestas a la radiación solar durante más de 30 años (65,7 %), más de seis horas al día (73,1 %) que no se protegieron adecuadamente (94 %). El género, la edad, el nivel de educación, los hábitos de bebida y el tiempo de exposición al sol tuvieron una correlación estadísticamente significativa con la presencia de queilitis actínica (p < 0,05). Se encontró que el 76,1 % de los participantes no notó signos y el 61,2 % no percibió síntomas de la lesión. El conocimiento sobre la queilitis actínica fue bajo para el 97 % de las personas con lesiones.

Conclusión:

Los resultados mostraron una alta prevalencia de queilitis actínica, además de una baja percepción y conocimiento al respecto de esta lesión, lo que indica la necesidad de acciones de educación para la salud.

Palabras clave: queilitis; epidemiología; agricultores; lesión bucal

ABSTRACT

Introduction:

Actinic cheilitis is an inflammatory, potentially malignant lesion associated with excessive sun exposure.

Objective:

To evaluate the prevalence of actinic cheilitis in a group of farmers, as well as the perception and knowledge of that group about this lesion.

Methods:

The observational epidemiological study included Brazilian semi-arid region farmers. The sample was obtained for accessibility to this population and a total of 219 farmers was reached. A structured questionnaire was used to collect the data in addition to the intraoral physical examination.

Results:

Actinic cheilitis was diagnosed in 30.6% of the examined farmers. The lesion was found more frequently in males (86.6%), older than 60 years (64.2%), and leukoderma (58.2%). Most individuals with actinic cheilitis were exposed to solar radiation for more than 30 years (65.7%), for more than 6 hours a day (73.1%), and did not adequately protect themselves (94%). Sex, age, education level, drinking habits, and time of sun exposure had a statistically significant correlation with the presence of actinic cheilitis (p <0.05). It was found that 76.1% of the participants did not notice signs and 61.2% did not perceive symptoms of this injury. Knowledge about actinic cheilitis was low for 97% of individuals with the lesion.

Conclusions:

The results showed a high prevalence of actinic cheilitis, in addition to low perception and knowledge about it, which indicates the need for health education actions.

Keywords: Cheilitis; Epidemiology; Farmers; Oral Pathology

Introdução

A queilite actínica é caracterizada como uma lesão de natureza inflamatória que afeta o vermelhão do lábio inferior e classificada como potencialmente maligna, podendo transforma-se em carcinoma espinocelular.1 Possui evolução lenta associada a fatores como a exposição solar e o tabagismo. Esta condição frequentemente acomete indivíduos que se expõem à luz do sol excessivamente, como agricultores. A queilite actínica é mais frequente em indivíduos do sexo masculino, da quarta à oitava década de vida e de pele clara.2,3

Clinicamente, a queilite actínica é caracterizada como aguda e crônica. A aguda tem como sinais clínicos o eritema labial, o edema e formação de bolhas que se rompem e formam crostas, regredindo quando o agente etiológico é interrompido. Já a crônica, comum em indivíduos cronicamente expostos à radiação ultravioleta, é clinicamente caracterizada por atrofia da parte vermelha do lábio inferior com a perda de elasticidade; exibe placas esbranquiçadas que variam em espessura, possuem superfície áspera e escamosa e podem apresentar sobreposição irregular de áreas eritematosas, além de úlceras e fissuras. Um aspecto relevante é a perda da delimitação entre a semimucosa labial e a pele.4,5

Histologicamente, esta lesão pode apresentar alterações epiteliais como atrofia e diminuição da produção de queratina sendo comum a ocorrência de displasia, que pode variar de leve a severa. É encontrado infiltrado inflamatório no tecido conjuntivo, além de elastose solar, que é caracterizada pela degeneração das fibras colágenas que passam a exibir basofilia e aspecto amorfo.6

A biópsia é indicada de acordo com os aspectos clínicos da lesão e com a finalidade de monitorar o paciente.3,5 O tratamento é norteado pelo diagnóstico histológico que fornecerá o grau de severidade da lesão. O prognóstico é variável e depende de fatores como: grau de displasia, mudanças de hábitos, do autocuidado por parte do paciente e da proservação por parte do cirurgião dentista.5 Os profissionais de Odontologia, bem como outros profissionais de saúde, têm o dever de monitorar e tratar as lesões de queilite com o intuito de evitar a sua evolução.7,8,9).

Os cânceres de cavidade oral são considerados um importante problema de saúde pública.10 Grande parte dessas neoplasias decorrem de lesões potencialmente malignas de longa duração que evoluem pela falta de conhecimento sobre o assunto e fatores etiológicos associados. A queilite actínica está entre as lesões orais cancerizáveis mais comumente encontradas e sua prevalência na América do Sul é de 2,08%.11,12,13 Sendo assim, o diagnóstico destas lesões e intervenção precoces são essenciais. A literatura é unânime em afirmar que a exposição constante ao sol pode causar danos irrecuperáveis nos horários de maior incidência dos raios solares e sem a devida proteção.14,15,16,17,18

Diante do exposto, é justificável a realização de estudos de prevalência que comprovem os fatores de risco associados ao desenvolvimento da queilite actínica. Além disso, é necessário avaliar o conhecimento e a percepção dos indivíduos expostos aos fatores de risco sobre esta lesão. Sendo assim, o objetivo deste trabalho foi avaliar a prevalência da queilite actínica em agricultores do sertão pernambucano, analisar a percepção e o conhecimento destes sobre esta lesão, e identificar os fatores de risco associados ao seu desenvolvimento.

Métodos

O estudo classifica-se como uma pesquisa quantitativa, descritiva, observacional de levantamento epidemiológico. O presente estudo foi realizado nas áreas rural e urbana de um município do sertão brasileiro, tendo como população alvo os trabalhadores rurais, que foram recrutados com o auxílio de representantes da Associação Municipal dos Agricultores.

A pesquisa obteve uma amostra não probabilística por conveniência. Um total de 219 agricultores compôs a amostra da pesquisa. Foram incluídos na pesquisa indivíduos de ambos os sexos; com idade superior a 18 anos, alfabetizados ou não; agricultores que trabalham expostos ao sol; que no momento da pesquisa estivessem presentes na reunião da Associação de Agricultores ou nas feiras livres do município; e que aceitassem participar de todas as etapas da pesquisa. No total foram realizadas 12 ações em campo e indivíduos foram convencidos a participar, uma vez que era explicada a importância da pesquisa e a relevância do tema para aquele grupo de indivíduos. A amostra foi dividida em dois grupos: com e sem queilite actínica.

Um questionário elaborado pelos próprios pesquisadores, mas ainda não validado, foi aplicado previamente a uma palestra educativa sobre o tema e avaliou a percepção e o conhecimento dos participantes sobre a lesão. Para testar a eficiência da aplicabilidade do questionário, foi realizado um estudo piloto. Os participantes não alfabetizados eram auxiliados pelo pesquisador. A palestra era de fácil entendimento e abordou assuntos referentes à definição, causas, prevenção, características epidemiológicas, clínicas e complicações da queilite actínica.

Após o preenchimento do questionário e palestra educativa, os participantes foram submetidos ao exame nos espaços onde ocorreram as ações. Nas associações de agricultores, havia uma sala destinada ao exame, que era realizado com o auxílio de luz indireta; já nas feiras livres, montou-se uma estrutura em tenda para esta finalidade, sendo neste caso utilizada a luz direta. Cada ação tinha em média a presença de 8 examinadores, que previamente passavam por uma calibração. Os exames foram feitos de forma sistemática em boca e orofaringe, no entanto foram consideradas para a presente pesquisa, apenas alterações no vermelhão do lábio com diagnóstico clínico de queilite actínica. Quaisquer outras lesões da mucosa bucal detectadas foram conduzidas de acordo com a hipótese diagnóstica.

Em relação às alterações no vermelhão do lábio, os critérios diagnósticos foram definidos seguindo a classificação proposta por Silva et al14 (2006): ausência de manifestação; queilite actínica discreta (presença de descamação e edema leves); queilite actínica moderada (presença de eritema, fissuração, áreas vermelhas/brancas leves, junto com edema e descamação mais acentuados); queilite actínica intensa (além das características da leve e moderada, presença de erosão, crosta, áreas vermelhas/brancas mais acentuadas, leucoplasia e atrofia). As informações do exame foram registradas juntamente a outros dados importantes como questões socioeconômicas e hábitos de risco.

Depois de concluído o exame, os indivíduos que possuíam diagnóstico clínico de queilite foram orientados de acordo como grau de severidade da lesão e, quando necessário, submetidos à biópsia.

Os dados obtidos foram armazenados em planilhas do Microsoft excel e posteriormente transferidos para o software estatístico Sigmastat conjugado ao sigmaplot (versão 11.0), onde foram aplicados testes específicos. Inicialmente, foi realizada uma análise de frequência das variáveis mais significativas para o estudo. Posteriormente, foi aplicado um teste de regressão linear múltipla com o objetivo de verificar a contribuição das variáveis independentes de forma conjunta (sexo, cor da pele, idade, nível de escolaridade, hábito de fumar, hábito de beber, exposição solar em anos, exposição solar em horas por dia, proteção solar e antecedentes familiares) sob a variável dependente (presença ou ausência da queilite actínica). Simultaneamente, as variáveis independentes foram confrontadas individualmente com a variável dependente, a fim de verificar a presença de possíveis correlações estatísticas significantes. Os dados foram normalizados utilizando-se o teste de normalidade de Kolmogorov-Smirnov com correção de Lillefors. Para todos os testes utilizados foi considerado um nível de significância de 5%.

Uma análise de frequência foi realizada para a percepção e para o conhecimento. A percepção foi mensurada por meio de três perguntas que avaliaram os sinais e sintomas. Para os sinais, foi questionado se o entrevistado percebia alguma alteração no lábio; se sim como denominava essa alteração. Para os sintomas, os participantes foram questionados se sentiam: secura, dor, queimação, ou mais de uma resposta. Para análise do conhecimento sobre a queilite actínica, foram feitos quatro questionamentos, os indivíduos que obtiveram de 0 a 2 acertos foram considerados com um conhecimento baixo, e os que tiveram mais de 2 acertos com um conhecimento alto.

A pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade de Pernambuco (Número do Parecer: 2.265.018). Toda a investigação respeitou as declarações éticas para estudos com seres humanos (Declaração de Helsinki).

Resultados

Um total de 219 agricultores compôs a amostra da pesquisa, 63 (28,8%) eram do sexo feminino e 156 (71,2%) do sexo masculino. A idade média dos pacientes avaliados no estudo foi de 59 anos, variando de 24 a 86 anos. A queilite actínica foi detectada em 67 indivíduos (30,6% da amostra total), 62 (91,1%) apresentaram a forma leve da lesão e 5 (8,9%) a moderada. Não foi encontrado nenhum caso de queilite actínica severa.

A variável dependente “possuir ou não a lesão” foi correlacionada com as variáveis independentes. Somente a análise das variáveis de forma isolada foi considerada para o presente estudo. Na tabela 1 pode-se observar que o sexo, idade, escolaridade, hábito de beber e tempo de exposição solar tiveram uma correlação estatisticamente significante.

Na análise da percepção dos sinais e sintomas, verificou-se que dos 67 agricultores diagnosticados com queilite, 51 (76,1%) não percebiam nenhum sinal da doença, 13 (19,4%) percebiam descamação e 3 (4,5%) relataram úlceras recorrentes. Quanto aos sintomas, 41 (61,2%) não referiram nenhum incômodo, 11 (16,1%) sentiam secura, 1 (1,5%) relatou dor, 8 (11,9%) sentiam queimação, e 7 (10,4%) marcaram mais de uma resposta.

A análise do conhecimento sobre a lesão demonstrou resultados semelhantes para ambos os grupos (p>0,05). Para o grupo com queilite, 17 (25,4%) não tiveram nenhum acerto, 34 (50,7%) tiveram 1 acerto, 14 (20,9%) 2 acertos e 2 (3%) tiveram 3 acertos; e quando atribuído score, 65 (97%) tinham baixo conhecimento sobre o assunto, e apenas 2 (3%) alto conhecimento. Resultado semelhante foi encontrado para o grupo sem queilite: 147 (96,7%) tinham um baixo conhecimento e 5 (3,3) um alto conhecimento.

Tabela 1 Correlação estatística entre as variáveis e presença ou não de queilite actínica. Fonte: Elaboração própria, 2019 

Discussão

A presente pesquisa encontrou uma alta prevalência de queilite actínica no grupo de agricultores estudado. Na amostra avaliada, a maior parte dos trabalhadores rurais apresentou queilite actínica leve, corroborando os estudos de Barreto7) e Cintra et al.19 que encontraram resultados semelhantes. A prevalência da queilite actínica varia entre 11-60% na literatura, dependendo do grupo estudado.20

O perfil epidemiológico dos indivíduos com queilite actínica é unânime, e se assemelha àquele encontrado em portadores de carcinoma de células escamosas de lábio.20 Estas condições possuem como agravante a situação socioeconômica. Devido ao baixo nível de conhecimento sobre o assunto e a dificuldade para frequentar o consultório odontológico, estas alterações são diagnosticadas tardiamente.2,4,5,14,16,17,19,20 Isso mostra a importância da realização de pesquisas direcionadas a grupos de risco, que têm como finalidade conscientizá-los quanto à lesão, suas causas, consequências e prevenção.

Dos agricultores diagnosticados com a lesão, a maioria era do sexo masculino e leucodermas. Estes achados corroboram os estudos de Cremonesl et al.,1Dantas et al.21 e Sarmento et al.5 que tiveram mais de 70% de indivíduos do sexo masculino com queilite actínica e concordam com o estudo de Gheno et al.,22 que encontraram uma maior quantidade de brancos com queilite actínica. Mais da metade dos participantes diagnosticados tinham acima de 60 anos, confirmando os resultados de Cremonesl et al.1 onde uma maior prevalência foi encontrada na faixa etária de 61 a 70 anos. Quanto ao nível de escolaridade, grande parte tinha apenas ensino fundamental, o que coincide com a pesquisa de Gheno et al.,22 que demonstrou uma significativa associação entre a queilite actínica e o baixo nível de alfabetização.

A presença da queilite actínica teve uma correlação estatisticamente significativa com as variáveis sexo, idade e escolaridade. A maior frequência da lesão em indivíduos do sexo masculino é explicada pelo predomínio dos homens em atividades laborais expostas ao sol, como a agricultura. Além disso, os homens têm uma menor preocupação com os cuidados referentes à proteção solar, quando comparados às mulheres. Em relação à idade, os pacientes com mais de 60 anos, são mais acometidos. Uma justificativa é a cronicidade da queilite actínica cujo desenvolvimento necessita de anos de exposição solar. Já o baixo nível de escolaridade é um achado frequente entre os indivíduos que praticam atividades rurais, como a agricultura, em que a exposição solar que é o principal fator etiológico da queilite actínica está presente.

No presente estudo, a cor da pele não esteve relacionada a uma maior frequência da queilite actínica (não houve diferença estatística significante). Possivelmente, isso ocorreu devido à grande quantidade de indivíduos feodermas em ambos os grupos, que se justifica pelo fato da pesquisa ter sido realizada no sertão nordestino, onde grande parte da população é parda e também pela exposição contínua ao sol dos agricultores entrevistados, fazendo com que alguns leucodermas fossem considerados feodermas.

Aproximadamente metade dos pacientes identificados com queilite actínica já foram ou ainda são fumantes. Mesmo encontrando uma frequência alta de fumantes e ex-fumantes, este evento não pareceu colaborar para o desenvolvimento da queilite actínica na amostra estudada (não houve diferença estatística significante). Os resultados do presente estudo corroboram os achados de Cintra et al.19 no qual 58,7% dos diagnosticados com queilite não fumavam. Independentemente dos resultados demonstrados, é importante ressaltar a ação sinérgica que esse hábito tem sob uma área da mucosa já agredida pela radiação solar.

Situação semelhante ao hábito tabagista, foi encontrada em relação ao hábito etilista, onde a maioria dos pacientes diagnosticados com lesão tinha ou ainda tem o hábito de beber. O estudo mostrou uma correlação estatisticamente significante entre a presença da lesão e este hábito. Este resultado contrasta os achados de Barreto7 que não mostrou nenhuma associação da presença da lesão com o consumo de álcool. No entanto, uma possível explicação seria que o hábito de beber está atrelado ao hábito de fumar. E a ação sinérgica do álcool, fumo e radiação pode aumentar a frequência da queilite actínica.

Quanto ao tempo de exposição solar em anos, a pesquisa mostrou que a maioria dos participantes se expunha há mais de 30 anos e tinha mais de 6 horas diárias de exposição. Foi observada uma correlação estatisticamente significante entre exposição solar e queilite actínica concordando com o estudo de Miranda et al.17 que também observou uma correlação positiva entre o tempo de exposição solar e a severidade da lesão ao estudar um grupo de indivíduos cortadores de cana. Isso condiz com o fato da queilite actínica ser uma lesão crônica que possui evolução lenta à exposição solar.1

Quase a totalidade dos pacientes com queilite actínica não se protegiam do sol ou não sabiam a proteção correta, o que é bastante preocupante e pode sugerir uma evolução da queilite leve para graus mais severos da lesão. Possíveis explicações para este resultado são: baixo nível de escolaridade, o baixo conhecimento dos entrevistados sobre a forma correta de prevenção e a dificuldade em adquirir o produto para proteção contra a radiação. Na correlação entre estas variáveis, houve uma tendência (p = 0,05) dos indivíduos que se protegem terem uma menor probabilidade de desenvolver queilite actínica, o que reitera a necessidade da proteção.

Na análise da percepção, a maioria dos participantes não percebia nenhum sinal da doença; e quanto aos sintomas, grande parte dos diagnosticados não referiram nenhum incômodo. Isso pode ser explicado pelo perfil da amostra ser predominantemente masculina e pela desatenção dos homens com a saúde, que pode ser influenciada pela ideologia de identidade masculina ligada ao papel de provedor, implicando negativamente no cuidado à própria saúde.23

Na análise do conhecimento, pode-se observar que ambos os grupos tiveram um baixo conhecimento sobre o assunto. Este achado pode ser reflexo do nível de escolaridade dos indivíduos que participaram da pesquisa e pode ter refletido na não utilização de proteção e na baixa percepção dos sinais e sintomas.

O estudo apresentou, como principal limitação, uma baixa adesão da população estudada. Ainda assim, os resultados demonstraram uma alta prevalência da queilite actínica entre os agricultores da região estudada. Sendo esta lesão mais frequente no sexo masculino, em leucodermas, com idade acima de 60 anos, que se expunham ao sol por mais de 6 horas por dia há mais de 30 anos. Os fatores de risco encontrados foram hábito de beber e exposição solar, tanto por quantidade de anos e horas por dia. Os indivíduos diagnosticados com queilite actínica não percebiam os seus sinais e sintomas e apresentaram um baixo conhecimento sobre a lesão. Isto indica que ações continuadas de educação em saúde devem ser realizadas com foco neste grupo de risco, a fim de prevenir a queilite actínica e sua evolução para o câncer de lábio.

Financiamento

Houve financiamento do “Programa de Fortalecimento Acadêmico da Universidade de Pernambuco”.

Referências

1. Cremonesl AL, Quispe RA, Garcia AS, Santos PGS. Queilite actínica: um estudo retrospectivo das características clinicas e histopatológicas. Arq Med Hosp Fac Cienc Med Santa Casa São Paulo. 2017; 62(1):7-11. [ Links ]

2. Osorio CH, Palmas BF, Cartes-Velásquez R. Queilitis actínica: aspectos histológicos, clínicos y epidemiológicos. Rev Cubana Estomatol. 2016; 53(2): 45-55. [ Links ]

3. Mello FW, Melo G, Modolo f, Rivero ERC. Actinic cheilits and lip squamous cell carcinoma: Literature review and new data from Brazil. J Clin Exp Dent. 2019;11(1):62-9. [ Links ]

4. Lucena EES, Costa DCB, da Silveira EJD, Lima KC. Prevalence and factors associated to actinic cheilitis in beach workers. Oral Diseases. 2012; 18(1): 575-579. [ Links ]

5. Sarmento DJS, Miguel MCC, Queiroz LMG,Godoy GP,da Silveira EJD. Actinic cheilitis: clinicopathologic profile and association with degree of dysplasia. Int j dermatol. 2014;53(1): 466-72. [ Links ]

6. Arnaud RR, Soares MSM, de Paiva MAF, de Figueiredo CRLV, Santos MGC, Lira CC. Queilite actínica: avaliação histopatológica de 44 casos. Rev Odontol UNESP. 2014;43(6):384-9. [ Links ]

7. Barreto ACR. The clinical prevalence of actinic cheilitis among community health agents from the regional V subprefecture of Fortaleza. Rev Gaúch Odontol. 2017;65(2):128-33. [ Links ]

8. Rodríguez-Blanco I, Flórez A, Paredes-Suárez C, Rodríguez-Lojo R, Gonzáles-Vilas D, Ramírez-Santos A et al. Actinic Cheilits prevalence and risk factors: A cross-sectional, multicentre study in a population aged 45 years and over in North-west Spain. Acta Derm Venereol. 2018;98:970-4. [ Links ]

9. Santos RF, Oliveira RL, Gallottini M, Caliento R, Sarmento DJS. Prevalence of factors associated with actinic cheilits in extractive mining workers. Brazilian Dental Journal. 2018;29(2):214-21. [ Links ]

10. Instituto Nacional de Câncer. Estatísticas do câncer de boca [Acesso: 22/06/2018]. Disponível em: Disponível em: http://www.inca.gov.brLinks ]

11. Maia HCM, Pinto NAS, Pereira JS, Medeiros AMC, da Silveira EJD, Miguel MCC. Potentially malignant oral lesions: clinicopathological correlations. Rev Einstein. 2016;14(1):35-40. [ Links ]

12. Cartaxo AC, Silva DNA, Costa KCAD, Souza GCA, Martins ARLA. Conhecimento de trabalhadores rurais de um município do nordeste brasileiro acerca da prevenção e diagnóstico precoce do câncer de boca. Rev Ciênc Plur. 2017;3(1):51-62. [ Links ]

13. Mello FW, Miguel AFP, Dutra KL, Porporatti AL, Warnakulasuriya S, Guerra ENS et al. Prevalence of oral potentially malignant disorders: A systematic review and meta-analysis. J Oral Pathol Med. 2018;47:633-640. [ Links ]

14. Da Silva FD, Daniel FI, Grando LJ, Calvo MC, Rath IBS, Fabro SML. Estudo da prevalência de alterações lábias em pescadores da ilha de Santa Catarina. Rev odonto ciênc - fac. odonto/pucrs. 2006;21(51):37-42. [ Links ]

15. Neville BW, Damm DD, Allen CM, Chi A. Oral and Maxillofacial Pathology 4th ed. St. Louis, Missouri: Elsevier; 2016. [ Links ]

16. Dantas LRO, de Oliveira BRS, Nascimento GJF, de Carvalho CHP. Prevalência e fatores associados da queilite actínica em trabalhadores expostos a radiação solar. Temas em Saúde. 2017; 17(1): 231-44. [ Links ]

17. Miranda AM, Ferrari TM, Calandro TLL. Queilite actínica: Prevalência e aspectos clínicos encontrados em uma população rural do interior do brasil. Rev. Saúde pesquisa. 2011;4(1):67-72. [ Links ]

18. Dancyger A, Heard V, Huang B, Suley C, Tang D, Ariyawardana A. Malignant transformation of actinic cheilits: A systematic review of observational studies. J Invest Clin Dent. 2018;9:12343. [ Links ]

19. Cintra JS, Torres SCM, Silva MBF, Manhães Júnior LRC, da Silva Filho JP, Junqueira JLC. Queilite actínica: estudo epidemiológico entre trabalhadores rurais do município de piracaia - SP. Rev Assoc Paul Cir Dent. 2013; 67(2):118-21. [ Links ]

20. Freddo AL, Vogt BF, Torriani MA, Hosni ES. Vermilionectomy: a treatment alternative for actinic cheilitis. Rev Odonto Ciênc. 2009;24(3):319-22. [ Links ]

21. Martins-Filho PRS, Silva, LCF, Piva MR. The prevalence of actinic cheilitis in farmers in a semi-arid northeastern region of brazil. Int J Dermatol. 2011;50(9):1109-14. [ Links ]

22. Gheno JN, Martins MAT, Munerato MC, Hugo FN, Sant’ana Filho M, Weissheimer C, Carrard VC, Martins MD. Oral Mucosal lesions and their association whith sociodemographic, behavioral, and health status factors. Braz Oral Res. 2015;29(1):1-6. [ Links ]

23. Miranda SVC, Duraes OS, Vasconcelos LCF. A visão do homem trabalhador rual norte-mineiro sobre o cuidado em saúde no contexto da atenção primária à saúde. Ciência & Saúde Coletiva. 2020;25(4):1519-27. DOI: 10.1590/1413-81232020254.21602018 [ Links ]

Recibido: 01 de Mayo de 2020; Aprobado: 09 de Marzo de 2021

* mariannecarvalho@gmail.com

Nenhum conflito de interesse é declarado.

Izabelly Germinia Gomes de Melo: participou da concepção e desenho do estudo; elaboração dos instrumentos utilizados na pesquisa; coleta dos dados e redação final do artigo.

Fernando Flávio Souza Vaz: participou da coleta dos dados; e revisão do texto.

Adriano Referino da Silva Sobrinho: participou da coleta dos dados; e redação final do artigo. Natália Gomes de Oliveira: participou da redação final do artigo e tradução dos resumos.

Eduardo Sérgio Donato Duarte Filho: participou do processamento dos dados e análise estatística.

Marianne de Vasconcelos Carvalho: coorientou as fases de coleta de dados e a redação final do artigo, e aprovou a versão final a ser publicada.

Stefânia Jeronimo Ferreira: orientadora do trabalho, foi responsável pela concepção e desenho do estudo; e acompanhou todas as etapas desde a construção do projeto de pesquisa a redação final do artigo e aprovação da versão final para publicação.

Creative Commons License Este é um artigo publicado em acesso aberto sob uma licença Creative Commons