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Economía y Desarrollo

Print version ISSN ISSNOn-line version ISSN 0252-8584

Econ. y Desarrollo vol.154 no.1 La Habana Jan.-June 2015

 

ARTÍCULO ORIGINAL

 

A natureza e contradições da crise capitalista

 


Nature and Contradictions of the Capitalist Crisis

 

 

Paulo Nakatani I y Helder Gomes II

I Departamento de Economia e do Programa de Pós-Graduação em Política Social da UFES, Brasil

II Programa de Pós-Graduação em Política Social da UFES, Brasil.

 

 


RESUMEN

Neste artigo, vamos estudar o desenvolvimento do capital fictício e suas implicações dentro do sistema de crédito internacional. Pretendemos mostrar que a dominância da lógica do capital especulativo e parasitário conseguiu fazer com que a crise fosse praticamente solucionada para essa fração do capital, através da intervenção estatal. Mas, aguçou ainda mais as contradições apontando para um aprofundamento da crise ou estagnação econômica. Tratamos do papel do FED e do dólar no sistema e das enormes assimetrias criadas no interior do sistema capitalista mundial e as enormes transferências de valor e mais-valia da periferia para o centro do sistema.

PALABRAS CLAVE: capital especulativo, capital fictício, crise, parasitário.


ABSTRACT

The present article will study the fictitious capital, and its implications in the context of the international credit system. It is our will to demonstrate that the prevalence of the hot money, or parasitic capital, made possible to practically solve the crisis for this part of the capital, through the state's intervention. But, further sharpened the contradictions pointing to a deepening crisis or an economic stagnation. The article will study the role of the Fed and the dollar system and asymmetries created within the world capitalist system and the huge transfers of value and surplus value from the periphery to the center of the system.

KEYWORDS: hot money, fictitious capital, crisis, parasitic.


 

 

Introdução

A economia mundial passa por mais uma grande depressão. Momento que reafirma a necessidade de solução das contradições internas ao movimento do capital, numa dimensão muito mais profunda do que aquela dos ajustes requeridos periodicamente para solucionar as crises cíclicas tradicionais, de curta duração. As contradições que se explicitam na atualidade resultam da extrapolação da natureza mais elementar da acumulação capitalista (a busca incessante pela produção e pela apropriação diferenciada da riqueza real excedente). Elas estão fundadas na produção e na apropriação, em escala nunca vista, de riqueza fictícia de várias modalidades e no domínio da lógica do capital especulativo e parasitário sobre as demais formas funcionais do capital. Trata-se de um momento particular, em que o valor expresso ficticiamente nas formas mais sofisticadas de especulação, de apostas sobre posições no futuro, entra em contradição com o conjunto das relações sociais de produção do presente. Por isso, esta crise, pela sua extensão, profundidade e duraçãopode ser considerada como uma crise estrutural, cujas alternativas colocadas em prática indicam uma saída que poderá ser cada vez mais dolorosa para as classes trabalhadoras em escala mundial:

se puede afirmar que esta crisis es mucho más profunda que las seis crisis anteriores (desde 1974-1975). Es la crisis de la globalización actual y del neoliberalismo como su base teórica. Lo es también de las instituciones financieras internacionales, como el Fondo Monetario Internacional y el Banco Mundial, cuya responsabilidad teórica y práctica ha quedado como nunca en evidencia en este contexto (Caputo, 2012, p. 22).

Alguns autores têm afirmado que a crise, pela qual passa o capitalismo atualmente, não é somente uma crise econômica, é uma multiplicidade de crises "pois é financeira, econômica, alimentícia, energética, meio-ambiental. Trata-se de uma crise sistêmica do capitalismo [...] que questiona a ordem social da civilização contemporânea" (Gambina, 2012, p. 34). Antes mesmo do colapso do Lehman Brothers, em 2008, Samir Amin já defendia que o mundo capitalista havia entrado em um estágio de "senilidade". "Ora, esse envelhecimento implica a instalação do caos permanente no sistema que o conduzirá seja -no melhor dos casos- à sua superação através da abertura de um longo período de transição ao socialismo, ou bem -na pior das hipóteses- à catástrofe e ao suicídio da humanidade" (Amin, 2002, p. 101). Até o momento, como resultado do aprofundamento da crise, após 2002, o sistema mundial tem sido conduzido muito mais para a segunda opção do que para a primeira, sejam nas guerras inconclusas no Afeganistão e no Iraque, ou nas situações de graves conflitos nos países do norte da África (em particular na Líbia e no Egito) e no Oriente Médio (Síria, Líbano, etc.).

Além disso, a crise atual, em suas múltiplas dimensões está colocando também em xeque a teoria econômica ortodoxa dominante, cujas propostas estão produzindo um aprofundamento cada vez maior dela em alguns países, em especial em Portugal, Irlanda, Itália, Grécia e Espanha. As medidas impostas pela Troika (Comissão Europeia, Banco Central Europeu e Fundo Monetário Internacional) à esses países, ao contrário de encaminhar para uma solução dos seus problemas, aprofunda cada vez mais a crise, com taxas negativas de crescimento do PIB, aumento maciço do desemprego, do déficit público e da dívida soberana. Este questionamento não significa, entretanto, o fim do neoliberalismo e de sua ideologia dominante no sistema hoje, pois, apesar da profunda crise, são os capitalistas e seus intelectuais orgânicos que continuam comandando as instituições internacionais e estatais, propondo as formas políticas de intervenção pública.

Neste artigo, vamos estudar o desenvolvimento do capital fictício (Marques e Nakatani, 2009, 2013) e suas implicações dentro do sistema de crédito internacional. Pretendemos mostrar que a dominância do capital especulativo e parasitário, amplamente disseminada nas diversas formas de capital fictício, conseguiu fazer com que a crise fosse praticamente solucionada para essa fração do capital, através da intervenção estatal. Assim, a intervenção estatal na vulgarmente chamada "crise financeira", que detonou o sistema de crédito norte-americano, apesar dos enormes estragos que está produzindo por todo o planeta, já restaurou quase todos os estoques de riqueza fictícia aos níveis anteriores à 2007. Entretanto, deve-se ressaltar que essa recuperação dos estoques de capital fictício recoloca em outro patamar todo o potencial de uma nova crise que poderá ser ainda mais grave e profunda.

 

A superacumulação de capital, capital fictício e o capital speculativo parasitário
Antecedentes

Nos anos 1970, após a quebra unilateral do acordo de Bretton Woods, por parte dos Estados Unidos, o sistema de crédito internacional entrou em uma era de instabilidade e volatilidade crescentes. Esse movimento foi seguido pela crise da dívida, no início dos anos 1980, nos países cuja política de endividamento externo teve que submeter-se às regras do sistema de crédito internacional, abarrotado de dólares(1) em busca de aplicações. A política econômica do Governo Reagan produziu uma enorme massa de capital monetário decorrente do pagamento de juros sobre a dívida externa, que foram conduzidos para os bancos dos países desenvolvidos, aumentando ainda mais a massa de moeda disponível.

Uma parcela considerável desse gigantesco volume de dólares converteu-se em capital real, produzindo notável expansão da economia americana e dos "tigres e dragões asiáticos". Nos demais países subdesenvolvidos ocorreu o contrário: uma década de estagnação econômica, uma gigantesca punção sobre a riqueza produzida e o agravamento na distribuição de renda e da riqueza. Outra parcela dos dólares sobrantes acumulou-se na forma de novos empréstimos, de reservas dos Bancos Centrais de todos os países e em aplicações especulativas de todos os tipos. Esse processo foi extremamente facilitado pela desregulamentação dos mercados e pelo acelerado desenvolvimento dos meios de comunicação e das redes de computadores, que permitiu a interligação dos diferentes mercados em todo o mundo.

Na segunda metade dos anos oitenta começou a popularizar-se uma nova expressão por todo o mundo: a globalização. Essa palavra pretendeu, segundo os ideólogos do sistema, expressar a nova realidade mundial: o fim da história com a vitória final do capitalismo; o fim dos Estados nacionais com a supressão das fronteiras entre os países. Como política econômica, a globalização propôs e efetivou a abertura e a desregulamentação dos mercados (de bens, de serviços, de crédito e especulativos); a privatização das empresas estatais; o aprofundamento da internacionalização da economia com o aumento das vantagens para o ingresso de capitais estrangeiros; e a regulação econômica dirigida pelo mercado. A rigor, essa regulação é efetuada pelas grandes corporações monopolistas, comerciais, industriais e financeiras, que comandam todo o sistema mundial. Entretanto, a livre mobilidade da força de trabalho sempre foi impedida por vários meios. Barreiras de todo tipo foram construídas para impedir o acesso dos trabalhadores dos países pobres aos mercados de trabalho dos países desenvolvidos.

Entretanto, o comércio internacional depende fundamentalmente de um sofisticado sistema de financiamento. No momento em que os países subdesenvolvidos tiveram que produzir enormes superávits comerciais, para o pagamento de juros do endividamento externo, eles encontraram todo o apoio no sistema internacional de crédito para financiar suas exportações. Isso significa que esses países passaram a exportar e a receber dólares, mas, ao mesmo tempo, a maior parte desses dólares acumulados na forma de saldos comerciais passou a ser devolvida (na forma de juros e encargos da dívida)(2) sem qualquer contrapartida estrangeira. Dessa maneira, a riqueza produzida internamente, nas nações endividadas, passou a ser transferida na forma valor e na forma valor de uso para o centro do sistema(3); restava uma renda interna em busca de valores de uso que não mais existiam internamente e aceleraram o processo de crescimento da inflação até o estágio da hiperinflação.

A consequência no sistema internacional de crédito foi a aceleração dos movimentos internacionais do capital na forma de moeda, ou capital monetário, em busca contínua de valorização. A integração das bolsas de valores com os mercados de câmbio e com os fluxos de apostas sobre as cotações das moedas e das taxas de juros no futuro permitiu, inclusive, que os economistas defendessem a ideia da globalização. O volume de transações internacionais de crédito e com ações atingiu magnitudes elevadíssimas. Ao mesmo tempo, o mercado internacional de moedas e de derivativos(4) cresceu explosivamente desde a primeira metade dos anos 1990.(5) Essa tendência se manteve ao longo da década e avançou ainda mais na primeira década do século XXI, ainda que ao longo desses anos tenham ocorrido os ciclos de expansão e contração normais para o próprio sistema.(6)

 

O capital real, capital fictício e o capital especulativo parasitário

A acumulação de capital real se expressa, principalmente, através da ampliação das atividades produtivas, comerciais e de serviços não produtivos (bancos, aluguéis, etc.). O crescimento dos países desenvolvidos e dos asiáticos a partir dos anos 1980 realizou-se através de novos investimentos produtivos e do crescimento do comércio internacional. Eles exigiram quantidades crescentes de dinheiro e de capital monetário para o seu financiamento, que pode ser gerado no interior do próprio processo de reprodução ampliada do capital. Neste processo existem quantidades de dinheiro ociosas, valor acumulado do ponto de vista do capitalista industrial, comercial ou de outros possuidores de riqueza, que são canalizadas para o sistema de crédito e atendem às necessidades de reprodução desse capital.(7) O próprio crescimento do comércio internacional intrafirmas dispensa a necessidade do capital na forma de dinheiro na medida em que os créditos no interior das firmas podem ser cancelados entre si. O aumento do capital nas mais variadas moedas (dólar, libra, yen, euro), além das necessidades da reprodução ampliada, decorrente da superacumulação de capital, gerou volumes crescentes dessa modalidade de recursos disponíveis, tornando-a desnecessária à acumulação do capital produtivo. Dessa forma, o que aparece como falta de dinheiro no mercado, mais conhecido como insuficiência de liquidez, é o seu contrário, o excesso de capital na esfera do capital industrial, uma crise de superacumulação.

A aceleração no processo de centralização do capital, desde os anos 1980, também reduziu relativamente a necessidade de novas fontes de financiamento e aumentou a quantidade de dinheiro disponível para o sistema de crédito internacional. Expandiram-se, então, as atividades dos administradores de fundos de investimentos, dos investidores institucionais, dos fundos de pensão, das seguradoras e dos detentores de grandes fortunas. Esse novo volume de dinheiro disponível adicionou-se aos eurodólares e petrodólares acumulados nas décadas anteriores. Esse conjunto excedente de fontes de financiamento produziu um crescimento sem precedentes de capital na forma dinheiro, descolado da acumulação real direta, que buscava valorizar-se em uma forma específica de desenvolvimento da lógica do capital a juros: o capital fictício.(8) Esta forma do capital tem como característica fundamental seu comportamento especulativo e como objetivo a obtenção de renda sem produção de riqueza material, o que a caracteriza como parasitária.

Essa massa excedente de capital, então, circulou pelo mundo em busca de toda forma de valorização. Esses recursos foram aplicados, fundamentalmente, em títulos públicos, títulos privados e em bolsas de valores, característicos do mercado de papéis que representam o capital fictício. Mas o crescimento da instabilidade do capitalismo mundial, em decorrência do aguçamento de suas contradições gerou, em seu interior, a busca de segurança (hedge) para o capital na forma dinheiro. Criaram-se, então, novos títulos que deram segurança aos aplicadores: os derivativos. Estes multiplicaram aceleradamente o capital fictício a partir de uma operação inicial, seja como fruto da acumulação produtiva real ou de uma aplicação fictícia em papéis.(9) Contraditoriamente, a busca de segurança aguçou ainda mais a instabilidade do sistema de crédito internacional e se refletiu na variação contínua das cotações dos papéis (ações, debêntures, derivativos, etc.) nas bolsas de mercadorias e de futuros, principalmente derivativos de juros e de câmbio.

 

A recomposição(10) do capital fictício após a crise de 2007

Como já destacamos, uma forma de capital fictício são os ativos bancários. Incluímos aqui, também, os ativos das instituições não bancárias compilados pelo Banco de Compensações Internacionais (BIS). Segundo os dados do BIS, os ativos totais dos bancos e instituições financeiras de 30 países,(11) entre eles as maiores economias do mundo, com exceção da China continental, atingiram um total de US$ 37,4 trilhões, em 2007. Em 2008, mesmo com o impacto da crise, esse montante caiu para US$ 35,3 trilhões. Uma redução de apenas 5,8 %, como pode ser visto na tabela 1. A continuidade da crise, principalmente seus impactos nos países da área do euro, gerou novas reduções nesse total, que caiu para US$ 33,6 trilhões, uma redução de 10,1 % em relação a 2007, mas ainda superior ao total de 2006, que era de US$ 29,5 trilhões. Praticamente todo esse montante gigantesco de capital bancário, segundo Marx, é capital fictício.(12)

Dessa forma, o impacto da crise na desvalorização dessa forma de capital foi ínfimo, tanto para o capital bancário como para o capital de instituições financeiras não bancárias, tanto em suas aplicações domésticas como internacionais. Para efeitos de comparação, em 2012 o PIB mundial estimado pelo Banco Mundial foi de US$ 71,6 trilhões.

Outra forma de capital fictício, segundo Marx, é constituída pelo que hoje é chamado de valor de mercado de uma companhia organizada sob a forma de sociedade anônima ou sociedade por ações. Esse valor de mercado é obtido pela multiplicação do preço das ações cotadas nas bolsas de valores pela quantidade emitida delas. Assim, na medida em que uma empresa consegue elevar seus lucros e os dividendos distribuídos, consequentemente, o preço das ações aumenta, ou seja, a cotação das ações na bolsa é determinada, em primeiro lugar, pela capitalização dos dividendos à taxa corrente de juros. Em segundo lugar, a especulação no mercado de ações acrescenta outros determinantes. Assim, a aposta que os dividendos possam ser maiores do que o esperado eleva o preço das ações e o aumento de seus preços conduz à aposta que os preços serão ainda maiores no futuro. Enfim, o preço de mercado deixa de representar o valor capital original, ou o preço nominal da ação e, da mesma forma, deixa de representar o valor patrimonial presente, inflando ficticiamente o capital. Esse processo é conhecido como bolha financeira. A prática amplamente generalizada nos anos 1990, da remuneração parcial dos administradores das corporações através das stockoptions inflou enormemente o valor de mercado dessas corporações, que utilizaram, inclusive, todas as formas possíveis de fraudes, falcatruas e crimes. O documentário "ENRON, os mais espertos da sala", de Alex Gibney, ilustra muito bem esse processo.

A magnitude dessa bolha pode ser observada na tabela 2,(13) elaborada a partir dos dados recolhidos e agregados pelo Banco Mundial. No período ascendente do ciclo, o valor de mercado das empresas subiu de US$ 43,3 trilhões para US$ 64,6 trilhões, entre 2005 e 2007, crescimento de 49,2 %. No mesmo período o PIB mundial a preços correntes passou de US$ 45,7 trilhões para US$ 55,8 trilhões, ou seja, cresceu muito menos (22,1 %) do que o capital fictício nas bolsas de valores (Banco Mundial, 2013). Esse comportamento dos valores de mercado em relação ao PIB mundial ocorreu da mesma forma nas várias regiões agregadas pelo Banco Mundial, quando fazemos a mesma comparação, ou seja, o valor de mercado cresceu mais do que o PIB no momento ascendente do ciclo e ainda não voltou ao mesmo patamar, superior ao PIB, após todos os anos que decorreram desde 2007.

Com a eclosão da crise, o valor de mercado das corporações nas bolsas de valores se desvalorizou em 46 %, caindo para US$ 34,9 trilhões de dólares. A partir daí, o montante foi crescendo gradativamente e atingiu US$ 53,2 trilhões em 2012, mas ainda muito abaixo do PIB mundial, que atingiu US$ 71,7 trilhões em 2012.

Por outro lado, o capital fictício na forma da dívida pública não sofreu nenhuma desvalorização com a crise, como pode ser observado na tabela 3. Os dados compilados pelo BIS referente à divida interna dos governos de trinta e cinco países mostram que a dívida cresceu continuamente entre 2005 e 2011, apresentando uma aceleração logo após 2008. Entretanto, os países europeus que mais estão sofrendo com a crise da dívida soberana mostraram um crescimento menos acelerado da dívida ou mesmo a queda no caso da Grécia. Os maiores devedores são os Estados Unidos, Japão, Itália, Alemanha e França. Os dois primeiros eram responsáveis por 60,9 % do total. A dívida do Japão, em 2012, chegou a US$ 14,6 trilhões ou 230 % do PIB, segundo o Der Spiegel (2013). Por seu lado, os Estados Unidos aumentaram sua dívida para US$ 16,1 trilhões no final do ano fiscal de 2012, segundo as informações do GAO.(14)

Enfim, os derivativos constituem uma forma de capital fictício, que não existia em um volume importante no tempo de Marx; ele se desenvolveu a partir das mudanças que ocorreram após o fim do sistema de taxas fixas de câmbio depois do acordo de Bretton Woods, em 1971, quando o presidente Richard Nixon decretou o fim da conversibilidade do dólar em ouro. Esse sistema, que dava alguma estabilidade ao conjunto de taxas de juros internacionais, mantinha igualmente essas taxas em níveis relativamente baixos e estáveis. Assim, durante o período de vigência desse acordo, o sistema de crédito mundial foi associado ao dólar, que assumiu o papel de dinheiro mundial, tendo sido ancorado ao ouro à razão de US$ 35,00 dólares por onça. Após o fim do acordo, o dólar foi desvinculado do ouro, mas continuou exercendo o papel de dinheiro mundial na forma de dinheiro fictício, mesmo que na aparência, nos manuais ortodoxos de economia e nos registros do sistema, o dólar tenha se convertido em papel moeda de curso forçado sem nenhum valor intrínseco.

A tabela 4 mostra os saldos dos derivativos registrados pelo BIS, o total passou de US$ 297,7 trilhões em 2005, para US$ 632,6 trilhões, em valores nocionais, em 2012. O total sofreu uma ligeira redução somente entre 2007 e 2008. Esse montante, em valores nocionais, não reflete exatamente o volume de negócios, pois são contratos futuros que podem conter contratos de opções, que podem ser exercidas ou não, contratos a termo e contratos de swaps. Além disso, os contratos de derivativos são saldados no vencimento apenas com a variação da taxa de juros, da taxa de câmbio ou dos preços das commodities,(15) quando a variação não tenha sido saldada no final de cada mês para evitar um saldo final muito elevado. Podemos observar que os derivativos de taxa de juros são os mais importantes, pois representam mais de 70 % do total, em contrapartida, os derivativos criados a partir dos preços das mercadorias, representam em média menos de 1 % do total.

A especulação cambial na esfera financeira é efetuada em um mercado específico, o mercado de moedas. Neste mercado são comprados e vendidos principalmente dólares, euros, yens e a libra esterlina. O objetivo é ganhar comprando nos mercados onde a moeda está mais barata e vender nos mercados onde está mais cara. Os economistas chamam isso de arbitragem. Outro objetivo é a aposta sobre as cotações das moedas no futuro, estas apostas são feitas através dos contratos de swaps cambiais. O volume de negócios global no mercado de câmbio não sofreu nenhum efeito grave da crise iniciada em 2007. A média diária de negócios, estimada sempre no mês de abril pelo BIS, que era de US$ 1,934 trilhão de dólares, em 2004, passou para US$ 3,324 trilhões, em 2007, para US$ 3,971 trilhões, em 2010 e para US$ 5,345 trilhões de dólares, em 2013 (BIS, 2013, p. 9). Deste total, 80 % foram em dois tipos de operações, US$ 2,046 trilhões em operações à vista e US$ 2,228 em swaps cambiais; os 20 % restante foram em outras operações. Considerando um mês com vinte dias úteis, o volume mensal de negócios nesse mercado seria de US$ 106,9 trilhões de dólares, muito mais do que todo o PIB mundial do ano de 2012.

Os dados apresentados nas tabelas 1 a 4 constituem formas de capital fictício que exigem remunerações sem participarem diretamente na produção de riqueza, com exceção da parcela do ativo bancário e das instituições financeiras que possam estar financiando capital produtivo. Neste ativo, pode estar a contrapartida de parte dos títulos das dívidas públicas que, atualmente, estão crescendo somente através de juros capitalizados em novas dívidas. As ações constituem duplicações do capital real acumulado nas corporações, entretanto em sua forma de capital fictício, serve para manter as apostas especulativas nas variações de preços. Assim, uma parte importante desse capital é remunerada sem nenhuma contribuição para a produção de riqueza. Por outro lado, como os ganhos e perdas das apostas ocorrem entre os especuladores no mercado essa parcela se constitui em transferências entre os próprios capitalistas e especuladores.

 

Efeitos da especulação parasitária em escala mundial
Os impactos monetários da crise

Durante os períodos descendentes do ciclo econômico os governos costumam adotar medidas anticíclicas para estimular a produção e amenizar o desemprego. Nesse momento, uma parte do capital acumulado, aquela menos eficiente e menos produtiva, costuma ser desvalorizada e, no limite, destruída. A intervenção pública nesses momentos tem como objetivo evitar que toda essa parcela ineficiente seja destruída e que possa ser incorporada a outras frações mais avançadas do capital, em seus respectivos setores de atividade.

Entre 2007 e 2008, vimos que os estoques acumulados de capital na esfera financeira atingiram seus montantes mais elevados. Esse total, exigindo remunerações que a esfera produtiva não tinha mais condições de oferecer, conduziu a circulação do capital a romper o ciclo que acontecia através das contínuas metamorfoses entre mercadorias e dinheiro.

Como foi amplamente divulgada, em 2008, a principal medida anticrises tomada pelo governo dos Estados Unidos visou a salvação dos grandes bancos, seguradoras e outras instituições financeiras envolvidas na crise. Isso, sem contar grandes corporações industriais como a General Motors,(16) por exemplo. Podemos observar esse momento, entre 2007 e 2008, no gráfico 1.

De 2000 até 2007, o Federal Reserve System (FED), o Banco Central dos Estados Unidos, manteve um crescimento regular da base monetária em uma tendência praticamente linear. Assim a base monetária (linha pontilhada) foi expandida de US$ 585 bilhões de dólares em 2000, para US$ 825 bilhões em 2007, um crescimento de 41,0 %, ou 5,8 % na média anual. Mas, em 2008, a base monetária sofreu um aumento gigantesco indo para US$ 1 655 bilhões de dólares, um aumento de 100 %, em apenas um ano. Nos anos seguintes, o FED continuou com a mesma política de expansão da base, que foi aumentada para US$ 2 010 bilhões de dólares, em 2010, e US$ 2 615 bilhões de dólares, em junho de 2012.(17) Esse aumento da base monetária foi realizado através de três medidas monetárias anticrises, os "quantitative easing 1, 2 e 3" chamado de "afrouxamento monetário", o primeiro foi iniciado em 2008 e provocou o primeiro salto na base, o segundo começou em novembro de 2010 e o terceiro foi anunciado em setembro de 2012 e ainda continua em vigor. No primeiro, o FED comprou US$ 600 bilhões de dólares em derivativos imobiliários, no segundo, mais US$ 600 bilhões de dólares em títulos do Tesouro e no terceiro, começou comprando US$ 40 bilhões de dólares por mês e aumentou para US$ 85 bilhões de dólares a partir de dezembro de 2012, em títulos imobiliários ou garantidos por hipotecas. Ao mesmo tempo, o FED tem mantido a taxa interna básica de juros, a prime rate, entre zero e 0,25 % ao ano, desde o final de 2008, e o FED tem a intenção de mantê-la neste patamar até o ano de 2015.

A segunda linha do gráfico 1 (linha contínua), mostra o comportamento da variável chamada de M1, ou Meios de Pagamentos. Segundo os manuais de economia, essa é a medida da quantidade de moeda disponível na economia e é um múltiplo da base monetária. É, também, o resultado da criação secundária de moeda a partir da criação primária, ou da base monetária, efetuada pelo Banco Central. Assim, segundo os manuais de economia, tanto ortodoxos quanto heterodoxos, o comportamento apresentado por essa variável deveria ser impossível. Em 2000, o M1 atingia o montante de US$ 1 088 bilhões de dólares e chegou a US$ 1 375 bilhões, em 2007, um crescimento de 26,4 %, ou de 3,8 % na média anual. A partir de 2008, o M1 tem-se mantido sistematicamente abaixo da base monetária, quando deveria estar sempre acima, como podemos ver no gráfico 1. Além disso, pode-se observar "saltos" no crescimento da base monetária de um patamar a outro a cada pacote do "quatitative easing", mas seguido por uma criação secundária de moeda, numa tendência linear, abaixo da base. Devemos esclarecer que a diferença entre o M1 e a base monetária decorre da expansão interna do crédito ou empréstimos às famílias, empresas e governo, central ou subnacionais.

Antes de avançar ainda mais nessas observações sobre o dólar, apresentamos o gráfico 2, com as mesmas variáveis mostradas no gráfico 1. Este se refere aos países que constituem a área do Euro, uma parte dos países da União Europeia. Pode-se dizer que esse gráfico é uma versão "comportada" do mecanismo de criação primária e secundária de moeda descrita nos manuais de economia. Assim, o Banco Central Europeu (BCE) efetua a criação primária e os Bancos criadores de moeda a multiplicam dentro do sistema constituído pelos países que formam a "Comunidade do Euro". Mas, mesmo assim, essas informações estatísticas não são suficientes para permitir uma explicação dos mercados globais de moedas e dos fluxos de capitais entre os países.

Devemos, também, esclarecer aos leitores que há uma profunda diferença entre estes dois Bancos Centrais e suas políticas monetárias. O FED é uma instituição privada que recebeu uma função pública no início do século XX, e o BCE é uma instituição pública, criada pelos países que compõem a União Europeia, que tem o estatuto de um Banco Central independente. O FED costuma criar moeda através da compra de títulos da dívida do Tesouro dos Estados Unidos e revendê-los aos bancos, empresas, famílias e a outras esferas do governo no "open market", que é o equivalente ao Mercado Aberto do Brasil, ou recompra esses títulos e efetua pagamentos por conta do Tesouro. Assim, o financiamento do Tesouro dos Estados Unidos é feito diretamente pelo FED. O segundo, o BCE, cria moeda através da compra de títulos de dívida dos bancos privados, estes bancos compram os títulos de dívida dos Tesouros Nacionais tornando-se, assim, os responsáveis pelo financiamento do Tesouro dos países da Área do Euro e os Bancos Centrais de cada país perdeu a soberania para a execução de uma política monetária. Assim, o papel da taxa básica de juros também é totalmente distinto em cada um dos dois casos.

 

A disseminação do dólar no sistema de credito mundial

A incongruência que encontramos nos dados mostrados no gráfico 1 pode ser explicada pela saída de dólares dos Estados Unidos para o resto do mundo. Mas, não dólares como dinheiro, mas como capital portador de juros na sua forma específica de capital fictício.(18) Assim, a monetização das dívidas pública e privada nos Estados Unidos, efetuada pelo FED, encontra como alternativa de valorização os países onde o capital especulativo e parasitário, registrado nos balanços de pagamentos como "Investimento em Carteira, ou Portfólio", encontram remunerações como dividendos, taxas de juros, ou ganhos de capital mais elevadas do que nos Estados Unidos. Mas, mesmo os "Investimentos Estrangeiros Diretos", considerados investimentos "bons" (sic), cujo critério de registro nos balanços de pagamentos é a aquisição de pelo menos 10 % das ações de uma empresa, não deixam de manter uma possibilidade especulativa e de curto prazo. A dimensão especulativa e parasitária desses recursos registrados nessas duas rubricas do balanço de pagamentos pode ser confrontada com a remessa de lucros, juros e ganhos de capital que cresceu aceleradamente após a crise chamada de financeira.

O gráfico 3 mostra o total acumulado, entre 2000 e 2012, no saldo do balanço de pagamento em conta corrente de alguns países selecionados. Como se pode ver, os países com os maiores saldos negativos são Estados Unidos, Espanha, Reino Unido, Itália, Grécia, Portugal e França. Este saldo, segundo os manuais de economia, representa o ingresso (saldo negativo) ou o envio (saldo positivo) de poupança ao exterior. Assim, durante esse período os Estados Unidos receberam um montante de US$ 7 116 bilhões de dólares do resto do mundo, a maior parte para financiar o déficit na balança de mercadorias. Somente três países, o Japão, a Alemanha e a China, foram responsáveis por US$ 5 929 bilhões ou 83,3 %, dos recursos para o financiamento desse déficit.(19) Se incluirmos os déficits dos demais países europeus o montante total chega a US$ 9 804 bilhões de dólares de saldo negativo na conta corrente do balanço de pagamentos. Esses números estão indicando uma gigantesca assimetria no sistema mundial.

Para esclarecer melhor o mecanismo básico de funcionamento desse sistema, temos que considerar que o dólar, junto com algumas moedas, está funcionando como o dinheiro mundial e por isso os Estados Unidos podem manter déficits recorrentes na balança comercial sem nenhum problema, enquanto o dólar continuar sendo aceito para a conclusão das transações internacionais. Assim, podemos dizer que os Estados Unidos importam mercadorias do resto do mundo e pagam com dinheiro fictício, que se converte em capital fictício no sistema internacional de crédito. O mesmo pode ser dito sobre o Euro e a Libra Esterlina, moedas que são amplamente negociadas no mercado mundial de câmbio e fazem parte das reservas internacionais dos diferentes países.

A contrapartida do déficit em conta corrente dos países desenvolvidos aparece, em parte, nos dados que podemos observar no gráfico 4. Os países que obtêm saldos positivos na balança comercial acumulam estes saldos em suas reservas, em dólares,(20) aqueles que não conseguem obter esses saldos positivos, têm que abrir mais a economia para atrair investimentos estrangeiros diretos ou em portfólio. A China é a campeã em reservas acumuladas, US$ 3 331 bilhões de dólares no final de 2012, com cerca de 60 % desse total em dólares, seguida pelo Japão, US$ 1 227 bilhões, Arábia Saudita, US$ 656 bilhões e Federação Russa, US$ 487 bilhões.

Essa enorme assimetria no sistema mundial vem se acumulando desde o início das políticas neoliberais de abertura e desregulamentação das economias nacionais, da privatização das empresas estatais e da redução do papel do Estado na regulação das atividades econômicas. Se antes desse período, os países deviam manter um montante de reservas para garantir as importações, após esse período os países acumulam reservas, principalmente os mais frágeis, quando podem, para enfrentarem ataques especulativos.

O Brasil, por exemplo, acumulou US$ 370 bilhões de dólares em reservas internacionais. Isso representa mais de 20 meses de importações, considerando a média mensal de 2012, que foi de US$ 18,6 bilhões. No passado, considerava-se aceitável dois ou três meses. Atualmente, em junho de 2013, o Brasil conta com um saldo de US$ 721,8 bilhões na conta de investimento estrangeiro direto e de US$ 558,7 bilhões de capital estrangeiro na conta de investimentos em carteira, esse saldo, em março de 2013 era de US$ 608,9 bilhões, uma redução de US$ 50,2 bilhões em apenas três meses (BCB, 2013). Assim, uma fuga da metade desse capital especulativo consumiria cerca de US$ 300 bilhões de dólares das reservas.

 

Considerações finais

Os resultados que pudemos observar até o momento mostra que a crise, iniciada em 2007, continua desenvolvendo as contradições internas à dinâmica do capital e pressionando a transferência de valor e mais valia dos países mais frágeis para os mais fortes dentro do sistema e dos trabalhadores para os capitalistas, entre os Estados Nacionais e entre as classes sociais.

A enorme assimetria que observamos no sistema capitalista mundial não significa uma tendência à queda e nem ao colapso da economia dos Estados Unidos, pelo contrário, mostra a força da posição hegemônica conquistada e consolidada por esse país depois da Segunda Guerra Mundial. Não há, até o momento, nenhum sistema monetário que possa assumir o papel de substituto do dólar e nem uma tendência forte à uma nova regulação econômica que conduza à supressão dos capitais especulativos e parasitários denominados em dólar. Algumas tentativas de reorganização do sistema de pagamentos internacionais, por exemplo, os acordos que a China tem estabelecido com vários países para eliminar o dólar em suas transações bilaterais não são suficientes para isso. Sem considerar que os países que tem alguns trilhões de dólares em suas reservas, como China e Japão, encontram-se em uma armadilha, pois uma desvalorização, abrupta e acelerada, do dólar produziria uma brutal perda para eles.

Mais ainda, os Estados Unidos encontram-se em uma posição semelhante àquela do início e do final dos anos 1970, quando transferiu para o resto do mundo as perdas do fim da conversibilidade do dólar, em setembro de 1971, e obteve grandes benefícios com a política de elevação da taxa básica de juros no início dos anos 1980. Nas condições atuais, um pequeno aumento na taxa básica de juros dos Estados Unidos produziria rápida fuga de capitais, de todos os países em que o estoque de investimento em portfólio seja importante, e uma acelerada desvalorização cambial.(21)

Por outro lado, ao contrário do que seria de esperar, a crise não está se constituindo em um fator no qual as condições subjetivas de organização e de pressão por mudanças anticapitalistas estejam em pleno desenvolvimento. Mesmo que tenha havido um relativo ascenso das lutas sociais por todas as partes do mundo neste período de crise. É possível que parte dessas tendências políticas e de parte dos movimentos sociais seja devido à própria dificuldade de compreensão desses fenômenos contemporâneos do capital fictício, seja devido à alienação, ou seja devido à sistemática campanha realizada pelos intelectuais orgânicos da burguesia através dos seus meios e instrumentos de produção e difusão ideológica. Se isso for correto, seria necessário que se executasse um aprofundamento um detalhamento e o avanço nos estudos sobre o capital fictício, e o capital especulativo e parasitário e sua disseminação para camadas mais amplas da sociedade.

 

 


REFERENCIAS BIBLIOGRÁFICAS

 

 

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RECIBIDO: 12/9/2014

ACEPTADO: 20/10/2014

 

 



Paulo Nakatani Departamento de Economia e do Programa de Pós-Graduação em Política Social da UFES, Brasil. Correo electrónico: paulonakatani@gmail.com

Helder Gomes Programa de Pós-Graduação em Política Social da UFES, Brasil. Correo electrónico: helgomes@uol.com.br

 

 


NOTAS ACLARATORIAS

1. "De um modesto começo em 1964, com cerca de US$ 11 bilhões, o sistema tinha crescido para US$ 40 bilhões em 1969 -e isto em números conservadores. Digo números conservadores porque existem várias estimativas diferentes sobre o volume de eurodólares existente em 1969: os números oscilam entre US$ 40 bilhões e US$ 85 bilhões" (Wachtel, 1988, p. 98). Em seguida, com as crises do petróleo em 1973 e 1979, esse volume de moeda transformou-se preponderantemente em petrodólares, que cresceram aceleradamente. "Desde o primeiro aumento dos preços do petróleo em 1973 até o aumento de preços do fim da década, os excedentes da OPEP totalizaram US$ 357 bilhões" (Wachtel, 1988, p. 104).

2. Em dezembro de 1981, a dívida externa brasileira total, pública e privada, era de US$ 61,4 bilhões e em dezembro de 1995, essa dívida saltou para US$ 129,3 bilhões (Cerqueira, 1997, p. 144). O saldo acumulado da Balança Comercial, entre 1982 e 1995, foi de US$ 144,5 bilhões e o total de juros líquidos pagos foi de US$ 114,2, mais US$ 183,4 bilhões de amortizações (BCB, 2013). Assim, quase 80 % do saldo da balança comercial foi utilizado para o pagamento de juros da dívida externa e, apesar das amortizações no período corresponderem a quase três vezes o saldo inicial da dívida, o Brasil terminou o período com uma dívida que era cerca de duas vezes o montante inicial.

3. As exportações de mercadorias e serviços constituem-se na transferência de valores de uso para o exterior em troca de valor representado por dólares que, através das importações, poderiam repor os valores de uso internos. A devolução dos dólares obtidos com as exportações a título de juros, amortizações, lucros ou ganhos de capital impede que ocorra esse tipo de conversão e o resultado é a transferência da riqueza material produzida internamente sem nenhuma contrapartida.

4. São chamados derivativos os títulos de apostas especulativas (sobre cotações de moedas e taxas de juros no futuro) de alto risco que derivam de (ou são lastreados por) títulos primários tais como ações de empresas, títulos de dívida pública, etc.

5. "Nos últimos dez anos o volume de recursos (Bônus, Euronotas, Empréstimos bancários e Emissão de Ações) quadruplicou, passando de US$ 395 bilhões em 1987 para US$ 1 597 bilhões em 1996"; e "...o volume diário das transações no mercado de moedas aumentou de US$ 718 bilhões em 1989 para US$ 1 572 bilhões em 1995". No mercado de derivativos, "enquanto o valor total das transações aumentou de US$ 618 bilhões em 1986 para US$ 9 185 bilhões em 1995, o número de contratos negociados aumentou de 315 milhões para 1 210 milhões em 1995" (Gonçalves, 1997, pp. 314, 316, 318).

6. O mercado global de derivativos, segundo os montantes em valores nocionais, atingiu US$ 297,7 trilhões em dezembro de 2005, e chegou a US$ 414,3 trilhões um ano depois, atingindo US$ 632,6 trilhões, em 2012, segundo BIS (2012). Já o mercado internacional de moedas, que movimentava US$ 1,5 trilhão diários, em média, no mês de abril de 1998,

7. passou para US$ 5,3 trilhões diários em abril de 2013 (BIS, 2013).

8. "Temos aí, primeiro, a parte do lucro, que não é despendida como rendimento, mas é destinada à acumulação, mas para a qual os capitalistas industriais não têm, no momento, emprego em seu próprio negócio... a parte que deve ser gasta como rendimento é consumida pouco a pouco, mas constitui, no entretempo, como depósito, capital de empréstimo com o banqueiro... com o desenvolvimento do sistema de crédito e de sua organização, até o aumento do rendimento, isto é, do consumo dos capitalistas industriais e comerciais, se exprime como acumulação de capital de empréstimo. E isso vale para todos os rendimentos, à medida que se consomem pouco a pouco, portanto para a renda fundiária, o salário em suas formas superiores, as receitas das classes improdutivas, etc." (Marx, 1986, p. 39).

9. Para Marx os títulos públicos e as ações negociadas na Bolsa representam formas específicas de capital fictício. Mas não é só isso, outros tipos de títulos também são capitais fictícios. "Mesmo lá onde o título de dívida -o título de valor- não representa, como no caso das dívidas públicas, um capital puramente ilusório, o valor-capital desse título é puramente ilusório" (Marx, 1986, p. 11). Entre 1980 e 1992 o estoque dos chamados "ativos financeiros" passou de US$ 10,7 trilhões para US$ 35,5 trilhões. A composição desses ativos, em 1991/1992, era a seguinte: divisas, 32 %, títulos internacionais, 4 %, títulos públicos, 25 %, títulos de empresas, 10 %, ações, 29 % (Chesnais, 1998, p. 27). Segundo dados do McKinsey Global Institute, divulgados em outubro de 2008, esse estoque de ativos financeiros atingiu US$ 117 trilhões em 2003, US$ 142 trilhões em 2005, US$ 167 trilhões em 2006, e US$ 196 trilhões em 2007 (McKinsey, 2008, p. 9).

10. "Com o desenvolvimento do capital portador de juros e do sistema de crédito, todo capital parece duplicar e às vezes triplicar pelo modo diverso em que o mesmo capital ou simplesmente o mesmo título de dívida aparece, em diferentes mãos, sob diversas formas. A maior parte desse capital é puramente fictícia" (Marx, 1986, p. 14).

11. Os dados das tabelas são apenas ilustrativos devido à variedade de fontes, formas de obtenção e de agregação. Por isso não devem ser considerados de forma absoluta e nem devem ser agregados.

12. Austrália, Alemanha, Noruega, Áustria, Grécia, Panamá, Bélgica, Hong Kong, SAR, Portugal, Brasil, Índia, Singapura, Canadá, Irlanda, Espanha, Chile, Itália, Suécia, Taipei, Japão, Suíça, Dinamarca, Luxemburgo, Turquia, Finlândia, México, Reino Unido, França, Holanda, Estados Unidos (BIS, 2012, p. A5).

13. "A maior parte do capital bancário é, portanto, puramente fictícia e consiste em títulos de dívidas (letras de câmbio), títulos de dívida pública (que representam capital passado) e ações (direitos sobre rendimento futuro). Não se deve esquecer que o valor monetário do capital que esses papéis nas caixas fortes do banqueiro representam -mesmo à medida que são direitos sobre rendimentos seguros (como no caso dos títulos da dívida pública) ou à medida que são títulos de propriedade de capital real (como no caso das ações)- é completamente fictício e que é regulado de modo a se desviar do valor do capital real que, pelo menos parcialmente, representam; ou onde representam mero direito a rendimento
e não capital, o direito ao mesmo rendimento se expressa num montante sempre variável de capital monetário fictício. Além disso, esse capital fictício do banqueiro, em grande parte, não representa seu próprio capital, mas o do público, que o deposita com ele, com ou sem juros" (Marx, 1986, p. 13).

14. Os dados da tabela foram obtidos pelo valor de mercado das empresas, em dólares correntes, no final do ano, nas respectivas bolsas de valores de cada um dos 113 países para os quais os dados estão disponíveis.

15. Desse total, US$ 11,3 trilhões está em poder do público, interno e externo, e US$ 4,8 trilhões em poder do próprio governo como a previdência social e o seguro saúde medicare.

16. Há uma longa lista que inclui as principais mercadorias transacionadas no mercado internacional como os minérios e metais, por exemplo, ferro ou cobre, os produtos agropecuários como soja, café ou algodão e carnes.

17. O Tesouro dos Estados Unidos aplicou US$ 50 bilhões de dólares em ações para salvar a General Motors, segundo a informação mais recente da Folha de São Paulo, perdeu US$ 11 bilhões em cinco anos (FSP, 2013).

18. Essas medidas monetárias devem estar provocando pesadelos nos economistas ortodoxos e monetaristas que são partidários da Teoria Quantitativa da Moeda. Segundo esta teoria, o nível geral de preços é determinado pela quantidade de moeda e a variação nos preços acompanha a variação na quantidade de moeda.

19. Uma questão teórica necessária para a fundamentação desse processo é a da conversão do dólar conversível em dinheiro mundial, no Acordo de Bretton Woods, e a sua continuidade, sem essa conversibilidade, como moeda puramente de curso forçado, como dinheiro fictício.

20. Naturalmente, existem inúmeras mediações e essa relação direta é apenas um artifício que utilizamos.

21. Esta é a situação em que se encontra o Brasil, como vimos. O mais grave é que os economistas ortodoxos do BCB estão tentando manter estável a taxa de câmbio através da criação fictícia de dólar. Estão oferecendo para venda dois bilhões de dólares semanais em swap cambial e mais um bilhão no mercado à vista, com cláusula de recompra, desde o final de agosto de 2013.

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