SciELO - Scientific Electronic Library Online

 
vol.28 issue4Nursing models integrated patient care nephrology in the Cuban contextNursing care interactions with patient in perioperative period author indexsubject indexarticles search
Home Pagealphabetic serial listing  

My SciELO

Services on Demand

Journal

Article

Indicators

  • Have no cited articlesCited by SciELO

Related links

  • Have no similar articlesSimilars in SciELO

Share


Revista Cubana de Enfermería

Print version ISSN 0864-0319

Rev Cubana Enfermer vol.28 no.4 Ciudad de la Habana Sept.-Dec. 2012

 

ARTÍCULO ORIGINAL

O significado do transplante de fígado para o paciente em lista de espera: abordagem fenomenológica

 

El significado del trasplante de hígado para el paciente en lista de espera: abordaje de la fenomenología

 

The meaning of the liver transplantation for the patient in the waiting list: phenomenology approach

 

 

Maria Isis Freire de AguiarI; Violante Augusta Batista BragaII

I Universidade Federal do Maranhão, Brasil.
II Universidade Federal do Ceará, Brasil.

 

 


RESUMO

O objetivo do transplante de fígado é aumentar a sobrevida de pacientes portadores de doenças hepáticas irreversíveis agudas e crônicas, além de proporcionar melhor qualidade de vida. Objetivou-se apreender o significado do transplante de fígado para o paciente em lista de espera. Pesquisa de abordagem qualitativa, com referencial teórico-metodológico na Teoria Humanística de Paterson e Zderad. Realizou-se entrevista com dezoito pacientes candidatos ao transplante de fígado em um Centro de referência no Ceará-Brasil. Os dados foram analisados com base no método de Bandin. Da categoria Significado do transplante, emergiram as subcategorias: Uma nova vida e Prolongamento da vida e melhoria da sua qualidade. Identificou-se o termo "nova vida" como a unidade de sentido de maior significância, seguida da necessidade de retornar suas atividades cotidianas e hábitos de vida relacionados à alimentação, educação, trabalho e lazer, resgatando a autonomia e dignidade. Buscar o sentido e o significado que os pacientes atribuem à experiência vivida neste período é de suma importância para o processo do cuidar.

Palavras-chave: transplante de fígado; lista de espera; enfermagem.


RESUMEN

El objetivo del trasplante de hígado es aumentar la supervivencia de los pacientes portadores de las enfermedades hepáticas irreversibles agudas y crónicas, además de proporcionar mejor calidad de vida. El objetivo fue aprehender el significado del trasplante de hígado para el paciente en lista de espera. La investigación de acercamiento cualitativo, con referencial teórico-metodológico en la Teoría Humanística de Paterson y Zderad. Fue hecha entrevista con dieciocho pacientes candidatos al trasplante de hígado en Centro de referencia en Ceará-Brasil. Los datos fueran analizados con base en lo referencial teórico de lo Proceso de Enfermería Fenomenológica. De la categoría Significado del trasplante, salió la subcategoría: Una nueva vida y Prolongación de la vida y mejora de su calidad. Fue identificado el término "nueva vida" como la unidad de sentido de significado más grande, acompañado de la necesidad de regresar sus actividades diarias y los hábitos de vida relacionaron al alimento, educación, trabajo y ocio, rescatando la autonomía y dignidad. Buscar el sentido y el significado que los pacientes atribuyen a la experiencia vivida en este periodo es muy importante para el proceso del cuidado.

Palabras clave: trasplante de hígado; lista de espera; enfermería.


ABSTRACT

The objective of the liver transplantation is to increase the survival of the carriers patients of the acute and chronic irreversible liver diseases, besides providing better life quality. The aim was to apprehend the meaning of the liver transplantation for the patient in the waiting list. Research of qualitative approach, with theoretical-methodological reference in the Paterson and Zderad's Humanistic Theory. Was done interview with eighteen candidates patient to the liver transplantation in the reference center in Ceará-Brazil. The data would be analyzed with base in the theoretical reference of the Phenomenological Nursing Process. Of the category Meant of the transplant, emerged the subcategory: A new life and Prolongation of the life and improvement of your quality. Was identified the term "new life" as the unit of sense of larger meaning, followed by the need to return his daily activities and life habits related to the feeding, education, work and leisure, ransoming the autonomy and dignity. To look for the sense and the meaning that the patients attribute to the experience lived in this period is very important for the care process.

Keywords: liver transplantation; waiting list; nursing.


 

 

INTRODUÇÃO

A realização dos transplantes hepáticos é um tema de interesse coletivo e de relevância social, traz a necessidade de ampliar os conhecimentos específicos dessa área para melhoria da prática profissional, notadamente da enfermagem. No entanto, durante a busca na literatura efetuada, percebeu-se uma lacuna com relação ao cuidado humano nessa temática.

As doenças hepáticas avançadas, ou em estágio terminal, são responsáveis por alterações em diversos sistemas orgânicos, incluindo complicações metabólicas, desnutrição, perda da massa e da função musculares, alterações respiratórias, encefalopatia e demais sintomas relacionados com a hepatopatia.1

A qualidade de vida desses pacientes varia de acordo com as mudanças em seu estado clínico, considerando que com a gravidade da hepatopatia, muitos pacientes perdem sua autonomia, apresentando manifestações como desconfortos abdominais, fadiga, insônia e mudanças de humor.2 A inclusão deles em uma lista de espera para a realização do transplante representa a possibilidade de viver e voltar a ter uma vida normal.

Nesse contexto, busca-se compreender melhor a vivência do paciente com doença hepática que será submetido ao transplante de fígado, conhecendo seu universo de significados, sentimentos, crenças, valores e atitudes, com o propósito de introduzir mudanças na prática de enfermagem que contribuam para a melhoria da assistência, favorecendo a qualidade de vida deste paciente. Objetivou-se apreender o significado do transplante de fígado para o paciente em lista de espera.

FUNDAMENTAÇÃO NA TEORIA HUMANÍSTICA DE PATERSON E ZDERAD

A Teoria Humanística, desenvolvida por Paterson e Zderad como pressuposto para a prática da enfermagem, abre espaço para reflexões no campo do cuidado, com possibilidade da utilização nos vários cenários de atuação em saúde. Permite lançar olhar diferenciado sob situações vivenciadas e experienciadas pelo paciente em processo de transplante de fígado, propondo um caminho para uma prática dialogada e de valorização do ser e de suas potencialidades.

O Processo da Enfermagem Fenomenológica é utilizado para nortear estudos que envolvem a apreensão do significado. "A teoria da prática da enfermagem humanística propõe a fenomenologia ou enfoque descritivo dos participantes na situação da enfermagem como método de estudo, interpretação e testemunho da natureza e significado dos eventos vividos".3

Neste contexto, a enfermagem tem na fenomenologia uma importante contribuição para o seu pensar e o seu fazer. O cuidar em enfermagem abriga amplo significado para os seres humanos, envolvendo o relacionamento e interação entre as pessoas, contribuindo para promoção de um cuidado holístico a partir das necessidades dos clientes.4


 

METODOLÓGIA

Estudo de abordagem qualitativa, trazendo para o interior da análise o objetivo e o subjetivo, os atores sociais, os fatos e seus significados.5 Utilizamos como referencial teórico-metodológico a Teoria Humanística de Paterson e Zderad.

A pesquisa teve como cenário o Ambulatório de um centro de transplante, instituição de referência nacional em transplantes de fígado no Ceará. Os sujeitos do estudo foram selecionados através de amostragem por conveniência, com as seguintes características: acima de 18 anos, de ambos os sexos, no período pré-operatório de transplante de fígado, inscritos no programa de transplante, de qualquer estado do Brasil, mas, que estivessem residindo em Fortaleza-Ceará. O número de sujeitos do estudo foi definido em 18 participantes, sendo concluída a coleta através da saturação dos dados.

A coleta de dados foi realizada no período entre agosto de 2006 a janeiro de 2007, sendo utilizados documentos do arquivo, prontuários dos pacientes e observação direta intensiva, que inclui duas técnicas: observação não-participante e entrevista semi-estruturada, a partir da seguinte questão norteadora: Qual o significado do transplante na sua vida? Registrou-se minuciosamente as informações obtidas, com anotações das observações em diário de campo e gravações de entrevistas.

Os dados foram analisados com base no Processo da Enfermagem Fenomenológica, utilizando quatro das cinco fases descritas por Paterson e Zderad : I) Preparação da enfermeira para vir-a-conhecer; II) A enfermeira conhece intuitivamente o outro; III) A enfermeira conhece cientificamente o outro; e IV) Síntese complementar das realidades conhecidas3. A Fase V, que abrange a sucessão do múltiplo à unidade paradoxal, não foi abordada nesta pesquisa.

A organização foi fundamentada no método de análise de conteúdo proposto por Bardin6, obedecendo às seguintes etapas: Pré-análise _ leitura minuciosa das anotações em diário de campo, transcrição das respostas e seleção de dados relevantes; Exploração do material _ etapa de elaboração das unidades de codificação, agregação e escolha das categorias temáticas; e Interpretação dos resultados _ análise e discussão das categorias temáticas a partir da convergência das idéias e inferências sobre a experiência vivida, além de reflexões e confronto com a literatura pertinente.

Durante todo o desenvolvimento da investigação, foram respeitados os aspectos ético-legais da pesquisa envolvendo seres humanos preconizados pela Resolução 196/96 do Conselho Nacional de Saúde.7 O projeto foi enviado ao Comitê de Ética em Pesquisa - CEP do Hospital Universitário Walter Cantídio, da Universidade Federal do Ceará, aprovado sob o protocolo no 34/06. À Diretoria de Pesquisa da Instituição foi solicitada autorização para realização do estudo. Os sujeitos do estudo assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.

 

RESULTADOS

Fase I - A preparação para vir-a-conhecer os pacientes que aguardam um transplante

A primeira fase do Processo da Enfermagem Fenomenológica diz respeito à preparação da enfermeira para vir-a-conhecer. Nessa etapa, o auto-conhecimento é necessário, bem como estar receptiva para o desconhecido, disposta a ser surpreendida, a conhecer a vivência dos pacientes que aguardam por um transplante de fígado.

Nesse processo de preparação, várias obras tiveram significância no aprofundamento sobre nossa prática cotidiana, fazendo refletir sobre os conceitos de amor, ternura e o cuidado que dispensamos aos nossos pacientes, em consonância com os princípios e valores da enfermagem, entre os quais destacamos: O cuidado essencial humano8; Fenomenologia Heideggeriana e sua possibilidade na construção de estudos de enfermagem 9; A espera é que mata.10

As leituras e reflexões contribuíram para preparação ao campo de pesquisa, favorecendo maior segurança com vistas aos objetivos propostos e atitude de estar aberta aos novos conhecimentos e desafios.

Fase II - Conhecendo intuitivamente os pacientes candidatos ao transplante de fígado

Esta fase do Processo de Enfermagem Fenomenológica refere-se ao conhecimento intuitivo dos pacientes candidatos ao transplante de fígado. Nesta etapa, colheu-se dados objetivos e subjetivos, desde a nossa entrada no Ambulatório e participação nas reuniões de integração do paciente ao Serviço, até a realização das entrevistas, momentos da relação "Eu-Tu" vivenciados no campo da pesquisa.

O primeiro contato dos pacientes com o Serviço é realizado com a enfermeira, através de reunião para integração dos pacientes e seus acompanhantes, com o objetivo de promover interação e fornecer informações importantes sobre o processo de transplante. Os pacientes recebem informações sobre como funciona a lista de espera, o processo de doação de órgãos, as complicações mais comuns no pós-transplante, aspectos da convocação, as orientações de preparo para a cirurgia, além dos procedimentos realizados na internação.

O segundo encontro com a enfermeira é individual, onde é feito o histórico para identificação de problemas, diagnóstico e prescrição de enfermagem, além dos devidos encaminhamentos para os demais profissionais da equipe e de outras especialidades, como odontologia e ginecologia, quando necessário. Nesta oportunidade, o paciente autoriza a realização do transplante e assina um Termo de Consentimento Informado.

Na terceira consulta de enfermagem, são avaliadas as respostas dos clientes quanto ao estado de saúde e verificada a assimilação das informações repassadas, esclarecendo possíveis dúvidas. Após essa etapa, os clientes são levados a uma visita ao hospital para conhecerem a enfermaria onde ficarão internados e a Sala de Recuperação/Centro de Tratamento Intensivo.

Nesses encontros, buscou-se estabelecer contatos com os pacientes em diversos momentos. Observou-se a postura de cada participante, as atitudes, suas expressões verbais e não verbais, que exprimissem os sentimentos que estavam vivenciando com relação ao período de preparação para o transplante de fígado.

Fase III - Conhecendo cientificamente os pacientes candidatos ao transplante de fígado

Em consonância com as fases do Processo de Enfermagem Fenomenológica, esta é caracterizada pela relação "Eu-Isso", a partir da transcendência de si mesmo, recordando, refletindo e experimentando a relação "Eu-Tu" como "Isso". Esta fase implica no processo analítico, complementando o conhecimento intuitivo, trazendo para a interação subjetiva uma análise cientifica através da categorização, síntese e descrição dos fenômenos vivenciados na compreensão da experiência dos pacientes que esperam por um transplante de fígado.

Após a realização dos encontros individuais, foi possível traçar a caracterização sociodemográfica e clínica dos pacientes que participaram do estudo.

Identificou-se o predomínio de pacientes do sexo masculino (15); com variação de faixa etária entre 21 a 68 anos, sendo a mais freqüente a partir de 50 anos (16); casados (15); com nível de escolaridade baixo, primeiro grau completo (10), até o segundo grau (seis) e nível superior (dois); evidenciando um perfil de baixa instrução, o que poderá influenciar na compreensão da doença e tratamento.

Quanto à atividade profissional, sete pacientes encontravam-se inativos devido ao quadro clínico da doença e 11 aposentados, apresentando uma diversidade de profissões. A renda familiar dos entrevistados foi predominante na faixa de dois a cinco salários mínimos (nove), seguidos de cinco pacientes com mais de cinco salários e quatro pacientes com um salário mínimo.

Em relação à procedência, verificou-se o maior fluxo de pacientes encaminhados do interior do Ceará (nove) e de estados da região Nordeste, Maranhão (três), Piauí (três) e Bahia (um); além de pacientes do Acre (um) e Brasília (um).

No que se refere à causa de indicação para o transplante de fígado, identificou-se o predomínio de pacientes portadores de cirrose por vírus C (seis) e alcoólica (cinco). Pesquisa indica que 70 a 80 % das doenças hepáticas terminais são causadas por consumo excessivo de álcool e por hepatites virais. Entre as causas virais, as hepatites pelo vírus B e C têm o maior impacto na saúde pública.11

O tempo de tratamento variou entre um e 12 anos, com tempo em lista de espera no mínimo de dois e máximo de 19 meses. Com relação à escala MELD, os pacientes variaram entre 13 e 29, com média de 19 pontos. A classificação MELD é usada como indicador geral da gravidade da insuficiência hepática, baseada em uma fórmula que tem como variáveis os níveis séricos de creatinina, bilirrubina total e a razão internacional normalizada (INR) para o tempo de protrombina.12

Após caracterização dos dados demográficos e clínicos, retornou-se ao diário de campo e ao conteúdo das entrevistas. Os depoimentos gravados durante as entrevistas foram transcritos na íntegra, pontuando momentos de silêncio, lágrimas, risos, sentimentos e reações expressadas durante o encontro. Desses, foram extraídas as falas mais significativas, realizando a aproximação dos dados obtidos com a literatura, buscando a cientificidade para apreensão do significado da vivência dos participantes. Desse processo analítico, foi selecionada a categoria Significado do transplante.

CATEGORIA: Significado do transplante

Nos diálogos, buscou-se apreender o significado do transplante de fígado através daqueles que vivenciam e experienciam a doença irreversível e a espera pelo procedimento. Ao estimular a verbalização do paciente sobre esta temática, observaram-se respostas comportamentais que expressam o quanto esta vivência é marcante e, muitas vezes, dolorosa para cada um deles. Identificaram-se reações tais como: manter-se de cabeça baixa; permanecer em silêncio por alguns instantes; suspiros; olhares pensativos; pausas ao verbalizarem seus depoimentos; entre outras.

Com base nas falas, foram identificadas duas subcategorias relacionadas com o significado do transplante para o paciente hepático: Uma nova vida e Prolongamento da vida e melhoria da sua qualidade.

Subcategoria: Uma nova vida

Nesta fase do processo analítico, buscou-se na fenomenologia o significado do transplante para os informantes, desvelado nos relatos:

O significado do transplante pra mim é eu ficar bom! Eu espero que fique bom, que continue trabalhando, porque tá doente é coisa ruim! É fraqueza nas pernas, é um coisa e outra, e a gente se preocupa muito. Pra mim, fazer o transplante e correr tudo em paz é mais outra vida pra gente [...]. (E-3)

No meu caso vai representar vida nova, porque, se eu não faça o transplante, aí a gente não tem esperança, né? Porque a doença só a proporção é piorar (E-4)

[...] Uma vida nova! Voltar à vida normal. Não que eu não possa fazer mais esforço, mas trabalho pesado eu acho que eu não posso mais não. (E-5)

Eu considero, pra mim mesmo, uma nova vida! Porque do jeito que eu tô eu não posso comer pão, é tudo controlado, não posso trabalhar. E acredito que é uma nova vida, não vou mais viver assim. Porque eu vi outro que depois de um determinado tempo ele pode fazer quase tudo [...] como o começo de uma vida. (E-10)

É uma vida nova, né! Continuar a vida sem dores, continuar o trabalho, viver mais em casa, se Deus quiser. (E-13)

Subcategoria: Prolongamento da vida e melhoria da sua qualidade

Ao explorar o significado do transplante, surgiu mais uma unidade de sentido de grande relevância para os participantes do estudo, conforme falas abaixo:

O transplante, eu acredito que é um meio que vai prolongar meus dias de vida, vai me recuperar, fazendo com que eu volte a minha atividade normal. (E-1)

O significado é bom, porque todo mundo quer viver mais um pouquinho [...]. (E-6)

[...] é uma melhoria de mais tempo de vida, porque a tendência da cirrose é piorar né? Com o transplante, já tá sendo comprovado que teve sucesso né! (E-7)

O significado dele é vida. Eu penso assim, que vou viver mais, um pouco mais do que eu deveria viver. Se eu fizer, eu vou durar mais, pelo menos essa é a perspectiva de cada um que vai pra uma sala de cirurgia. (E-17)

O significado é o que eu queria receber [...] um fígado novo pra mim ... refazer a minha vida, ir me embora pra minha casa, passar uns tempos lá. (E-18)

 

DISCUSSÃO

A partir da análise dos relatos extraídos dos discursos, foi evidenciado o termo "nova vida" como a unidade de sentido de maior significância para os informantes. A enfermagem fenomenológica permitiu explorar esse significado através da compreensão do homem em sua totalidade existencial, pois as respostas são dadas por pessoas que vivenciam o fenômeno em uma dada sociedade histórica e culturalmente situada.3

A reação dos pacientes hepáticos diante da irreversibilidade da doença e das limitações impostas com o agravamento do quadro traz uma reflexão sobre a valorização da vida e a importância do transplante para manterem sua sobrevivência. Em pesquisa realizada com pacientes que aguardam por transplante de fígado, a autora relata que muitas manifestações da doença são decorrentes de sensações ou percepções individuais experienciadas apenas pelo informante, constituindo-se no seu universo particular de significados.10

Os pacientes frequentemente expressam o desejo de realizar o transplante para voltar a ter uma "vida normal", eliminando as manifestações objetivas e subjetivas descritas por eles e tantos transtornos ocasionados pela doença crônica, como as dores intensas e as limitações físicas, desvelando a necessidade sentida de retornar as suas atividades cotidianas e hábitos de vida relacionados à alimentação, educação, trabalho e lazer, resgatando, assim, sua autonomia e dignidade.

Nesse cenário, percebe-se a importância do cuidado na compreensão do ser humano, especialmente aos que vivenciam a espera pelo transplante, valorizando sua existência, numa atitude de dedicação ao outro, de desvelo e solicitude, participando dos seus sofrimentos e conquistas.8

O significado atribuído ao transplante foi desvelado não apenas como uma possibilidade de cura, mas, ainda como melhoria da qualidade de vida.

Os pacientes que aguardam por um transplante de fígado experimentam sofrimento relacionado aos efeitos físicos da doença e limitações nas atividades diárias, além do risco de morte. A melhoria da qualidade de vida no período pós-transplante deve ser um dos objetivos desse recurso terapêutico.13

A qualidade de vida relacionada à saúde pode ser definida como uma estimativa de auto-avaliação do paciente sobre suas dimensões físicas, funcionais, sociais e psicológicas da vida, servindo de meio para identificar como o paciente percebe o seu estado de saúde e aspectos da vida. Escores baixos dessa mensuração têm sido associados com aumento da utilização de recursos de saúde, aumento de custos, diminuição da satisfação do paciente, e falta de reinserção dos doentes com condições médicas crônicas de volta em suas funções diárias.14

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Esta seção corresponde à quarta fase do Processo de Enfermagem Fenomenológica, a Síntese Complementar das realidades conhecidas. Utilizou-se o Processo da Enfermagem Fenomenológica, que propiciou o desvelamento do significado do transplante para os pacientes que aguardam por um fígado como condição essencial de sua sobrevivência.

Percebeu-se que o cotidiano dessas pessoas sofreu alterações significativas com o advento da doença, incluindo várias mudanças que interferem no padrão alimentar, no relacionamento familiar e nas atividades laborais e sociais. As transformações e limitações impostas pela condição crônica e pela necessidade de listagem para o transplante trazem a necessidade de adaptação, sendo fundamental o apoio da equipe multiprofissional, especialmente, do enfermeiro.

Este trabalho trouxe contribuições para a atuação da enfermagem no transplante de fígado no sentido de ampliar os conhecimentos na área e favorecer a compreensão da vivência do paciente candidato ao procedimento através do desvelamento da experiência vivida, favorecendo a busca por uma assistência mais humanizada e oferecer uma melhor qualidade do cuidado.

 

REFERÊNCIAS

1. Barcelos S, Dias AS, Forgiarini Junior LA, Monteiro MB. Transplante Hepático: repercussões na capacidade pulmonar, condição funcional e qualidade de vida. Arq Gastroenterol. 2008 jul;45(3):186-91.

2. Mucci S, Citero VA, Gonzalez AM, Marco MA, Nogueira-Martins LA. Adaptação cultural do Chronic Liver Disease Questionnaire (CLDQ) para população brasileira. Cad. Saúde Pública. 2010 jan;26(1):199-205.

3. Paterson JG, Zderad LT. Enfermería Humanística. México: Editorial Limusa; 1979.

4. Ciuffo LL, Rodrigues BMRD, Cunha JM. The nurse in sexual abuse child suspicion attention: a phenomenology approach. Online Braz J of Nurs. [periodical from Internet]. 2009; [Cited 2011 Mai 24]; 8(3). Available from: http://www.objnursing.uff.br/index.php/nursing/article/view/j.1676-4285.2009.2665/572.

5. Minayo MCS. O Desafio do Conhecimento: pesquisa qualitativa em saúde. 9 ed revista e aprimorada. São Paulo: Hucitec; 2006.

6. Bardin L. Análise de Conteúdo. 4 ed. Lisboa: Edições 70; 2009.

7. Ministério da Saúde (BR), Conselho Nacional de Saúde, Comitê Nacional de Ética em Pesquisa em Seres Humanos. Resolução no. 196 de 10 de outubro de 1996: diretrizes e normas regulamentadoras de pesquisas envolvendo seres humanos. Brasília (BR): O Conselho; 1996.

8. Boff L. O cuidado essencial: princípio de um novo ethos. Inclusão Social. 2005 out./mar.; 1(1):28-35.

9. Monteiro CFS, Paz EPA, Rocha SS, Sousa IEO. Fenomenologia heideggeriana e sua possibilidade na construção de estudos de enfermagem. Esc Anna Nery R Enferm. 2006 ago;10(2):297-300.

10. Gresta MM. A Espera é que mata _ a trajetória dos pacientes submetidos ao transplante hepático [dissertação]. Belo Horizonte: Escola de Enfermagem, Universidade Federal de Minas Gerais; 2000.

11. Silva AS, Santos LL, Passos ADC, Sankarankutty AK, Martinelli ALC, Castro e Silva O. Chronic liver disease prevention strategies and liver transplantation. Acta Cirúrgica Brasileira. 2006; 21(supl 1):79-84.

12. Hong SH, Kim JE, Cho ML, Heo YJ, Choi JH, Choi JH et al. Comparison of the Child-Turcotte-Pugh Classification and the Model for End-stage Liver Disease Score as Predictors of the Severity of the Systemic Inflammatory Response in Patients Undergoing Living-donor Liver Transplantation. J Korean Med Sci., 2011; 26:1333-38.

13. Aguiar MIF, Braga, VAB. Sentimentos e expectativas de pacientes candidatos ao transplante de fígado. Rev. Eletr. Enf. [periodical from Internet]. 2011; [Cited 2012 Abr 20]; 13(3):413-21. Available from: http://www.fen.ufg.br/revista/v13/n3/v13n3a06 .htm.

14. Saab S, Ng V, Landaverde C, Lee SJ, Comulada WS, Arevalo J et al. Development of a disease specific questionnaire to measure health related quality of life in liver transplant recipients. Liver Transplantation 2011;17(2):1-34.

 

 

Recibido: 13 de enero de 2012.
Aprobado: 14 de abril de 2012.

 

 

Correspondencia:

Maria Isis Freire de Aguiar. Universidade Federal do Maranhão, Brasil.
Fone: 55-98-81785905.

E mail: isis_aguiar@yahoo.com.br