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Ingeniería Energética

On-line version ISSN 1815-5901

Energética vol.40 no.2 La Habana May.-Aug. 2019

 

Aplicación de la computación

Modelagem do fenômeno de ionização do ar mediante impulsos através do método dos elementos finitos

Modeling of the air ionization phenomenon using impulses through the finite element method

Modelado del fenómeno de ionización del aire mediante impulsos a través del método de los elementos finitos

Erick Silva de Sá1 

Tarso Vilela Ferreira1  * 

Arthur Francisco Andrade2 

Gustavo Paiva Lopes3 

Gabriel Henrique de Faria3 

Gabriel Vidal Negreiros Bezerra4 

1 Universidade Federal de Sergipe, Sergipe, Brasil

2 Universidade Federal de Campina Grande, Paraíba, Brasil.

3 Universidade Federal de Itajubá, Minas Gerais, Brasil.

4 Instituto Federal de Ciência e Tecnologia da Bahia, Bahia, Brasil.

SUMÁRIO

Neste trabalho é proposta a modelagem dos fenômenos de ionização e desionização do ar, com ênfase em ondas padronizadas e não padronizadas causadas por descargas atmosféricas, em uma perspectiva macroscópica, utilizando software baseado no método dos elementos finitos. O objetivo principal objetivo da técnica de modelagem proposta é permitir simulações do processo disruptivo do ar, frente a ondas impulsivas, em escala macroscópica, o que é inovador dado que a a maioria dos modelos com este intuito está baseado em fenômenos microscópicos, na escala dos portadores de carga. Como estudo de caso, é empregada uma chave seccionadora classe 15 kV. A partir dessa análise, pretende-se identificar via simulação os valores mais prováveis de tensão que possam ocasionar a ruptura do meio dielétrico nesse equipamento, permitindo-se assim prever esses valores e realizar estudos, ainda na fase de projetos, nesse equipamento para que aumente a sua confiabilidade.

Palavras-chave: Ionização e desionização do ar; descargas atmosféricas padronizadas e não padronizadas; método dos elementos finitos

ABSTRACT

This paper proposes the modeling of ionization and air deionization phenomena, with emphasis on standardized and non-standardized atmospheric discharges, in a macroscopic perspective, using software based on the finite element method. The main objective of the proposed modeling technique is to allow simulations of air gaps breakdown due to impulsive waves, on a macroscopic scale, which is innovative since most of the models for this purpose are based on microscopic phenomena, on the electric charge carrier scale. As a case study, a class 15 kV disconnecting switch is used. From this analysis, it is intended to identify via simulation the most probable voltage values that can cause the rupture of the dielectric medium in this equipment, allowing to predict these values and to carry out studies, still in the phase of projects, in that equipment so that it increases reliability

Keywords: Phenomenon of ionization and air dezionization; standardized and non-standardized impulsive; finite element method

RESUMEN

En este trabajo se propone el modelado de los fenómenos de ionización y desionización del aire, con énfasis en ondas estandarizadas y no estandarizadas de descargas atmosféricas, en una perspectiva macroscópica, utilizando software (licencia Nº 1037910),basado en el método de los elementos finitos. El principal objetivo de la técnica de modelado propuesta es permitir simulaciones de ruptura de entrehierros debidos a ondas impulsivas, en una escala macroscópica, que es innovadora ya que la mayoría de los modelos para este propósito se basan en fenómenos microscópicos, en la escala del portador de carga eléctrica. Como estudio de caso, se emplea una llave seccionadora clase 15 kV. A partir de este análisis, se pretende identificar vía simulación los más probables valores de tensión que puedan ocasionar la ruptura del medio dieléctrico en ese equipo, permitiendo así prever esos valores y realizar estudios, aún en la fase de proyectos, en ese equipo para que aumente su fiabilidad.

Palabras clave: Ionización y desionización del aire; descargas atmosféricas estandarizadas y no estandarizadas; método de los elementos finitos

Introdução

Nos sistemas elétricos, os materiais isolantes são tão necessários e importantes quanto os materiais condutores. Especificamente na transmissão e distribuição de energia, os isolantes gasosos são os mais empregados.

Sob condições normais de temperatura e pressão os gases são ótimos isolantes, por isso são comumente utilizados como meio de isolação dos equipamentos de um sistema elétrico. A maioria dos equipamentos elétricos utilizam o próprio ar como meio isolante. Em alguns casos, entretanto, outros gases como o nitrogênio (N2), dióxido de carbono (CO2), freon (CCl2F2) e o hexafluoreto de enxofre (SF6) são empregados. Quando submetido a campos elétricos com intensidade relativamente alta, o gás pode sofrer ionização, a qual é o resultado das colisões entre os portadores de cargas do meio, a saber, elétrons, partículas neutras e íons positivos [1]. Eventualmente, o processo de ionização será intenso o suficiente para formar uma descarga de alta corrente entre os eletrodos separados eletricamente pelo isolante gasoso. Considerando que os sistemas de distribuição de energia elétrica sofrem a ação de diversos tipos de surtos eletromagnéticos, de origem interna ou externa, esses estão susceptíveis ao fenômeno da descarga disruptiva (ou falha de isolamento) em seus equipamentos. As descargas podem ocasionar desde pequenos desligamentos locais a avarias irreparáveis nos dispositivos do sistema.

Entre os equipamentos de uma rede de média tensão, as chaves seccionadoras de 15 kV, possuem a menor suportabilidade dielétrica frente a ensaios de descargas que incidem diretamente sobre as linhas [2]. Quando há a incidência de um surto de tensão provocado por uma descarga atmosférica, a distribuição de campo elétrico resultante pode, a depender da geometria do equipamento, conter distorções que contribuirão para ocorrência de uma ruptura dielétrica [2]. Assim, nas diversas condições em que se faz necessária a utilização de um equipamento em tensões mais elevadas, um estudo rigoroso da estrutura do seu isolamento e da distribuição de campo elétrico deve ser realizado [1]. Diante desse contexto, este artigo tem como objetivo propor um modelo de simulação para os fenômenos de ionização e desionização do ar, em escala macroscópica, frente a uma distribuição de campo elétrico não uniforme, tomando como estudo de caso uma chave seccionadora de classe 15 kV.

Para tal são realizadas simulações em software baseado no Método dos Elementos Finitos (MEF), tomando como entrada ondas impulsivas de tensão padronizadas e não padronizadas. O impulso atmosférico padronizado é uma forma de onda definida por norma e representa o formato do surto de tensão causado pela incidência direta da descarga atmosférica na rede elétrica. Esta forma de onda é caracterizada por tempos de subida e descida pré-definidos de 1,2 µs e 50 µs, respectivamente. Entretanto, não há garantia de que todos os impulsos atmosféricos que efetivamente solicitarão o sistema possuirão comportamento semelhante ao impulso padronizado e, portanto, a análise da resposta dielétrica frente a sobretensões não padronizadas se faz necessária.

Como consequência, torna-se possível estimar antecipadamente, ainda em etapa de projeto, a suportabilidade dielétrica de equipamentos de alta tensão, consequentemente aumentando a eficiência e confiabilidade do sistema elétrico. Os sistemas elétricos de potência podem sofrer grandes distúrbios devido à ocorrência das descargas atmosféricas. Uma das consequências que esses fenômenos podem provocar são os desligamentos não programados, que além dos danos materiais, submetem as concessionárias que operam tais sistemas a penalizações e multas, além da degradação de sua imagem diante da opinião pública. As descargas atmosféricas (surtos de origem externa), relativamente à forma como incidem nos sistemas elétricos, podem ser classificadas como descargas diretas e descargas indiretas. As descargas diretas incidem de forma franca nas estruturas, equipamentos, cabos-guarda ou nos condutores de fase, causando sobretensões de elevadas amplitudes que podem ocasionar ruptura do meio dielétrico por meio de um arco elétrico [3]. Em contrapartida, as descargas indiretas atingem locais próximos à rede e induzem sobretensões que possuem amplitudes reduzidas se comparadas às das descargas diretas, contudo elas ocorrem com maior frequência e podem prejudicar gravemente a normalidade do sistema [3]. Em condição de ensaio, tem-se estabelecido em diversas normas [4, 5] como padrão para descargas atmosféricas, a forma impulsiva de tensão que possui 1,2 μs de tempo de frente e 50 μs de tempo de cauda. Uma representação gráfica desta onda impulsiva de tensão é apresentada na figura 1.

Fig. 1 Ilustração de uma forma de onda impulsiva [5]. 

Entretanto, existem diversas formas impulsivas que podem ser associadas às descargas indiretas, e não existem referências normativas que preveem ensaios utilizando tensões impulsivas não padronizadas [6].

A formação da descarga disruptiva entre condutores isolados por um meio dielétrico é um fenômeno complexo e influenciado por diversos fatores, como o tipo do material isolante (sólido, líquido ou gasoso), a distribuição de campo elétrico, a polaridade da tensão, bem como a pressão, umidade e temperatura às quais o arranjo está submetido [2].

O fenômeno da descarga disruptiva é, por vezes, uma consequência do processo de ionização do meio, em que íons são formados e elétrons são liberados a partir da colisão entre os átomos neutros e elétrons livres presentes no gás. O deslocamento desses portadores de carga do ânodo para o cátodo respectivamente, gera uma alta corrente [1].

Diversas teorias propõem a explicação desse fenômeno. Duas das mais amplamente aceitas são os modelos de descarga de Townsend e de Streamer [7]. Towsend estudou o comportamento da corrente elétrica em um gás entre eletrodos de placas paralelas, com distribuição de campo elétrico uniforme, e apesar da sua grande contribuição para o entendimento do fenômeno, seu modelo não se adequou com precisão à boa parte dos dos casos práticos, como por exemplo, em grandes espaçamentos entre os eletrodos e em casos em que o campo elétrico não era uniforme, para esses casos, o modelo de Streamer foi mais preciso [6].

Quando o gás é submetido a um campo elétrico suficientemente elevado ocorrem dois fenômenos opostos. Além da ionização, acontece também o processo de desionização. Para condições atmosféricas padronizadas, o valor limite de campo elétrico para a ocorrência do processo de ionização do ar e possível ruptura da isolação é de 26 kV/cm [7]. No entanto dois fatores são preponderantes para que a ruptura da isolação ocorra: primeiro o campo elétrico deve exceder o valor crítico, o segundo fator é que para certo valor de campo elétrico, existe um valor de comprimento crítico. Se o comprimento é maior ou igual ao espaçamento entre os eletrodos, consequentemente há uma maior probabilidade de ruptura. Vários trabalhos apresentam modelos que se propõem a representar os processos de ionização e desionização em gases empregando o MEF [8-13]. Em tais modelos, os fenômenos são abordados microscopicamente, na escala dos portadores de carga, e diversos fatores, tais como os coeficientes de ionização, recombinação, anexação e fotoionização são simultaneamente considerados durante as simulações, o que eleva o esforço computacional a níveis pouco viáveis em aplicações de engenharia.

O modelo apresentado em [14] considera que o material ao redor de um eletrodo, quando exposto à alta tensão, se ioniza de forma gradativa em pequenas regiões elementares, que tendem a ionizar outras regiões elementares próximas, a depender do atendimento de determinados critérios relacionados com os valores de densidade crítica de corrente nas camadas. Caso o processo de ionização prossiga, o resultado é o crescimento de uma região de elevado campo elétrico, com formato semelhante à do próprio eletrodo. Neste trabalho optou-se por considerar-se apenas o impacto do campo elétrico na resistividade de regiões pontuais da simulação, partindo-se do modelo definido em [15]. As regiões mais próximas ao eletrodo entram no processo de ionização mais rápido que as camadas mais distantes. Cada região é independente tanto no início do processo de ionização quanto no de desionização. Na figura 2, pode-se observar a variação da resistividade no tempo durante os processos de ionização e desionização no ar.

Fig. 2 Curvas de resistividade durante o fenômeno de ionização e desionização do ar [15]

Se o valor do gradiente de ionização (ou campo crítico) do ar não for atingido, a resistividade permanece constante, conforme seu valor inicial. A partir do instante em que esse valor é alcançado ou excedido, a resistividade cai exponencialmente no tempo. No entanto, quando o valor de campo elétrico decai e se torna menor que o valor crítico, a resistividade inicia o processo contrário, e cresce até alcançar o valor inicial estabelecido.

O equacionamento que modela o fenômeno considera o gradiente de ionização do ar como um parâmetro de análise para o início do processo de ionização. Quando o campo crítico (Ec) atinge o valor de 26 kV/cm (estimativa conservadora) considera-se que o processo de ionização teve início.

  • Para valores de campo elétrico menores que o do gradiente de ionização do ar, ou seja, Ep < Ec: veja equação (1).

ρ=ρ0 (1)

em que Ep representa o valor do campo elétrico calculado no ponto e ρ0 a resistividade inicial do ar.

  • Para valores de campo elétrico maiores que o gradiente de ionização do ar, Ep > Ec , ocorre o início da representação do processo de ionização: veja equação (2)

ρ=ρ0(etτ1). (2)

em que t representa o instante em que se inicia o processo de ionização e τ1 a constante de tempo de ionização do ar.

  • Para a modelagem do processo de desionização foi considerada a equação (3):

ρ=ρi+(ρ0ρi)(1etτ2)(1EpEc)2. (3)

em que τ2 a constante de tempo de desionização do ar, ρi o valor da resistividade quando Ep= Ec , ou seja, durante o início do processo de decaimento do campo elétrico.

As simulações realizadas neste trabalho abordaram dois processos: ionização e desionização do ar, e para tal foram realizadas as adaptações ao equacionamento apresentado para as circunstâncias específicas do ar [15].

A norma ABNT NBR 6935 define um seccionador como um dispositivo mecânico de manobra, capaz de abrir e fechar o circuito quando uma corrente de “intensidade desprezível” é interrompida ou reestabelecida, ou quando não ocorre variação de tensão significativa através dos terminais de cada polo deste seccionador [16].

Na figura 3, é ilustrado um exemplo de chave seccionadora unipolar classe 15 kV, conhecida como chave tipo faca.

Fig. 3 (a) Chave seccionadora monopolar da classe 15kV [12]; (b) Chave seccionadora tipo MS, monopolar da classe 15kV [21]

Segundo [2], o ponto de maior ocorrência de descargas disruptivas nas chaves seccionadoras se localiza entre os eletrodos dos terminais de linha/carga e a base aterrada. Uma fotografia de tal ocorrência pode ser visualizada na figura 4.

Fig. 4 Região de maior ocorrência de descarga disruptiva na chave seccionadora [2]

A alta concentração de campo elétrico entre os terminais de carga/fonte e a base aterrada, pode ser visualizada na figura 5, em que os pontos com maior concentração de campo elétrico aparecem destacados na cor amarela.

Muitos problemas em engenharia podem ser descritos em termos de equações diferenciais parciais, como a equação de Poisson, equação de Laplace, equação de Helmholtz, Navier-Stokes, etc. No entanto, com exceção de alguns casos particulares, não é possível obter uma solução analítica exata para problemas descritos por equações diferenciais parciais [17]. Na medida em que a complexidade das equações torna a solução analítica impraticável, torna-se então necessário, o emprego de outros métodos, não analíticos, para obter a solução.

Os métodos numéricos têm sido os métodos mais utilizados, principalmente com o aumento da capacidade de processamento das máquinas computacionais e o desenvolvimento de softwares dedicados [18]. O Método dos Elementos Finitos (MEF) é um dos métodos numéricos mais empregados para solucionar problemas em engenharia, podendo ser utilizado em problemas que possuam geometrias nos domínios com uma, duas ou três dimensões (1D, 2D e 3D, respectivamente) [19].

Fig. 5 Plotagem 2D da concentração de campo elétrico na chave seccionadora. Cores mais claras indicam maior intensidade de campo. 

Alguns passos são necessários para a realização do MEF, os quais são descritos a seguir [20]:

  1. Discretização do problema;

  2. Escolha da função de interpolação;

  3. Definição das propriedades do elemento;

  4. Organização das propriedades dos elementos;

  5. Solução do sistema de equações;

  6. Interpretação dos resultados apresentados.

Há alguns anos, a solução de problemas a partir do MEF requeria o desenvolvimento de códigos computacionais dedicados. Contudo, existem softwares modernos que se propõem realizar análises baseadas no MEF e apresentam algumas vantagens, tais como a possibilidade da construção ou importação do modelo virtual do objeto a ser analisado e a geração de gráficos que facilitam a interpretação dos resultados, sem a necessidade do desenvolvimento direto de rotinas de solução.

Material e métodos

Inicialmente foi realizada a modelagem 3D da chave seccionalizadora empregada como estudo de caso, utilizando um software do tipo Computer Aided Design (CAD). Catálogos de empresas que fabricam chaves seccionadoras de média tensão foram utilizados como referência [21].

Em seguida, o algoritmo e o equacionamento apresentados na seção 1.3, foram internalizados ao software. Para a realização das simulações o Comsol Multiphysics® (número de licença 1037910) foi utilizado, tendo sido empregado o módulo Electric currents. As constantes físicas necessárias à realização das simulações são apresentadas na tabela 1.

A forma de onda da tensão impulsiva foi empregada como sinal de entrada para o estudo. Como entradas da simulação, empregaram-se três tipos de formas de ondas impulsivas de tensão, caracterizadas na tabela 2.

Tabela 1 Constantes físicas dos materiais que compõem o modelo da chave. 

Material ɛr - Permissividade Relativa σ - Resistividade Elétrica (Ω*m)
Região onde não há possibilidade do Ar se ionizar (1) 1,00 1014
Porcelana (2) 5,3 1012
Ferro 109 10-7
Cobre 1011 6 x 10-7
Região onde há possibilidade do Ar se ionizar 1,00 Varia conforme o equacionamento do método.

Fonte: (1)[22](2)[23] e demais [24].

Tabela 2 Caracterização das formas de onda impulsiva padronizada e não padronizada. 

Formas de impulso Chave seccionadora 15 kV
Positivo
t1 (μs) t2 (μs) Valor de pico
1,2 50,0 109,2 kV
1,2 50,0 109,6 kV
5,0 50,0 120,0 kV

Com o intuito de reduzir-se o esforço computacional, é definida uma região limitada que no caso em questão é um cilindro que engloba a região destacada na figura 4, onde há maior probabilidade de descarga. Dentro da região cilíndrica definida o processo pontual de ionização ou desionização é efetivamente executado. Na sequência, após o processo de discretização dos elementos em geometrias tetraédricas, foi realizada a simulação para cálculo dos valores de campo elétrico no domínio. Durante a simulação, enquanto o valor do campo elétrico em um ponto da região de interesse é menor que o campo crítico, a resistividade do ar permanece constante. Quando a amplitude do campo elétrico alcança ou excede o valor crítico, a resistividade decai exponencialmente em função do tempo. Ao final, quando o valor do campo elétrico decai em relação ao gradiente de ionização, inicia-se o fenômeno de desionização do ar, em que a resistividade tende a crescer, podendo alcançar o seu valor inicial após algum tempo. Finalizada a simulação, os valores do módulo do campo elétrico ao longo do tempo nos pontos de interesse da simulação são exportados e empregados na geração de gráficos em função do tempo. Tais gráficos permitem uma pronta identificação da ruptura ou não do dielétrico por meio da observação da taxa de decaimento da condutividade do meio ao longo do tempo.

A validação da implementação pontual do modelo foi realizada mediante a comparação dos resultados simulados com resultados experimentais, obtidos em ensaios realizados no Laboratório de Alta Tensão da Universidade Federal de Itajubá, disponíveis em [2].

Resultados e discussões

O modelo da chave seccionadora empregada como estudo de caso é ilustrado na figura 3b. Na tabela 3, são apresentadas as especificações técnicas e geométricas da chave empregada.

Tabela 3 Características da chave seccionadora 

Tensões (kV) Corrente Nominal (A) Dimensões (mm)
Nom. Max NBI A B C D
13,8 15 95 200/630 305 270 580 186

Na figura 6, pode-se observar o modelo tridimensional virtual da chave empregada nas simulações, construído em ambiente computacional CAD. Algumas simplificações foram realizadas no desenho a fim de reduzir o esforço computacional necessário à convergência da simulação.

Fig. 6 Modelo tridimensional da chave faca implementado em plataforma CAD. 

Tendo em vista que o modelo se baseia em uma representação pontual do fenômeno de ionização, foi escolhido um ponto junto à região de maior probabilidade da ocorrência da raiz do arco elétrico (próximo ao parafuso de fixação do cabo em um dos lados da chave) para avaliação da taxa de decaimento da resistividade. Na figura 8ª, observam-se as características da forma de onda do impulso de tensão padrão 1,2/50 μs, que possui 109,6 kV de valor de crista. Segundo resultados de ensaios em laboratório, este valor de crista representa uma probabilidade de 50% de ocorrência da descarga disruptiva na chave de manobra. O comportamento da resistividade do ar segundo o modelo proposto é ilustrado na figura 8b (importante destacar que o eixo vertical do gráfico está em escala logaritmica).

Fig. 8 (a) Forma de onda de tensão padronizada de 1,2 μs /50 μs, 109,6 kV; (b) Comportamento da resistividade em função do tempo, com características de ruptura. 

O processo de ionização ocorre até o instante de 8,4 μs, com o decaimento da resistividade até aproximadamente 8,6 x 10-7Ω·m. A partir da alta taxa de decaimento da resistividade e da alta concentração de campo elétrico (26,07 kV/cm) no instante mencionado, considera-se que ocorreu a ruptura do ar para a simulação executada considerando U50%.

Na figura 9ª, é possível visualizar-se a forma de onda de um impulso de tensão padrão 1,2/50 μs, com 109,2 kV de valor de crista, sendo este o limiar de valor de amplitude na forma de onda padronizada, em que não ocorre a disrupção no processo de simulação. Como o modelo em desenvolvimento ainda não considera o caráter estocástico da formação das descargas, o limiar de tensão a partir do qual haverá a formação da descarga é um valor fixo.

Fig. 9 (a) Forma de onda de tensão padronizada de 1,2 μs /50 μs, 109,2 kV; (b) Comportamento da resistividade em função do tempo, sem características de ruptura. 

Na figura 9b, pode-se observar o comportamento da resistividade do ar, segundo modelo proposto, frente à aplicação do impulso caracterizado na figura 9a. Percebe-se que o processo de ionização ocorre até o instante de 8,3 μs, com o decaimento da resistividade até aproximadamente 3 x 10-6Ω·m. Mesmo apresentando uma alta taxa de decaimento da resistividade, o valor do campo elétrico (25,96 kV/cm) no instante posterior não foi suficiente para causar a completa ruptura do meio. Com isso o processo de modelagem da desionização reproduziu a regeneração da rigidez dielétrica do ar. O valor inicial da resistividade foi restabelecido próximo a 20 μs.

Na figura 10ª, podem-se observar as características da forma de onda de impulso não padronizado: 5 μs /50 μs, 120,0 kV de valor de crista, que também correspoonde a U50%. As características da forma de onda supracitada, probabilisticamente falando, causariam a ruptura do dielétrico em 50% dos seus testes, segundo os ensaios em laboratório.

Fig. 10 (a) Forma de onda de tensão padronizada de 1,2 μs /50 μs. (b) Comportamento da resistividade em função do tempo em que ocorreu a disrupção. 

O comportamento da resistividade segundo a perspectiva do modelo proposto, após a aplicação do impulso de tensão não padronizado, é ilustrado na figura 10b. Segundo o critério adotado, a ruptura aconteceu em aproximadamente 9,4 μs.

Conclusões

O método proposto permite simular com satisfatória aderência situações de disrupção (ou não disrupção) do meio dielétrico em geometrias com proporções consideráveis, e diante de campos elétricos não uniformes. Além disso, o método requer um esforço computacional menor do que os métodos que são elaborados com base na perspectiva microscópica.

O algoritmo aplicado foi capaz de representar, de forma determinística, uma alta taxa de decaimento da resistividade, diante do fenômeno da ionização, quando aplicado um impulso de tensão que, ensaiado em laboratório, resultou na disrupção do ar em 50% dos casos. Além disso, ele é capaz de caracterizar a regeneração do meio quando os valores de campo elétrico não atingem o gradiente de ionização, processo denominado desionização.

Os resultados simulados indicam valores de tensão disruptiva referentes a sinais impulsos que podem ser utilizados para estudos futuros com o objetivo de aprimorar o projeto de equipamentos de alta tensão, proporcionando uma maior confiabilidade aos sistemas elétricos.

Apesar dos resultados satisfatórios, o método não considera todos os efeitos físicos que compõem o fenômeno de disrupção do ar do ponto de vista das colisões das partículas. Devido a esta limitação e à não representação de outros mecanismos, o modelo não incorpora as características estocásticas do fenômeno real. Esta propriedade deverá der perseguida em trabalhos futuros os quais devem agregar exatidão e confiabilidade na estimativa das tensões disruptivas.

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Recibido: 01 de Noviembre de 2018; Aprobado: 01 de Enero de 2019

*Autor para la correspondencia. Email: tarso@dee.ufcg.edu.br

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