SciELO - Scientific Electronic Library Online

 
vol.29 número3El uso de las tecnologías de la información y la comunicación para la educación en sexualidad índice de autoresíndice de materiabúsqueda de artículos
Home Pagelista alfabética de revistas  

Servicios Personalizados

Revista

Articulo

Indicadores

  • No hay articulos citadosCitado por SciELO

Links relacionados

  • No hay articulos similaresSimilares en SciELO

Compartir


Revista Cubana de Información en Ciencias de la Salud

versión On-line ISSN 2307-2113

Rev. cuba. inf. cienc. salud vol.29 no.3 La Habana jul.-set. 2018

 

ARTÍCULO ORIGINAL

 

A informação como recurso estratégico de prevenção em saúde do trabalhador e uma análise do Cerest de Marília no estado de São Paulo

 

La información como recurso estratégico de prevención en salud del trabajador y un análisis del Cerest de Marília en el estado de São Paulo

 

The information as a strategic resource for prevention in worker's health and an analysis of Cerest de Marília city in São Paulo state

 

 

Daniela Maria Maia Veríssimo,I Carlos Francisco Bitencourt Jorge,I Nastássia Satomi Uchiama Andrade,II Cristiano Marques da SilvaII Luciana Caluz Carvalho PereiraII

I Universidade Estadual Paulista de Sao Paulo. Faculdade Católica Paulista (FACAP). Centro de Referência em Saúde do Trabalhador (Cerest). Regional Marília, São Paulo, Brasil.
II Centro de Referência em Saúde do Trabalhador (Cerest). Regional Marília, São Paulo, Brasil.

 

 


RESUMO

Objetivo: o presente artigo tem como objetivo relatar a experiência do Centro de Referência em Saúde do Trabalhador (Cerest), regional da cidade de Marília, no estado de São Paulo, como mediador informacional no âmbito da saúde do trabalhador, mais especificamente na campanha "Não passe do limite! Abasteça só até o automático!", proposta do Governo do Estado de São Paulo.
Métodos: durante a realização da campanha, foi efetuada a mediação de informações laborais voltadas para a saúde dos trabalhadores dos postos de combustível e por meio desta ação levantaram-se os hábitos ocupacionais que fundamentassem a orientação aos profissionais em futuras ações preventivas no contexto da saúde dos trabalhadores.
Resultados: com o processo de mediação da informação alinhado à observação do processo laboral dos sujeitos que atuam nos postos de combustíveis foi possível caracterizar os riscos causados pelo benzeno à saúde desses trabalhadores diante das atividades desenvolvidas. Os resultados obtidos até o momento foram analisados à luz da literatura disponível que versa sobre saúde do trabalhador, mediação da informação e os riscos do benzeno. O processo de mediação informacional realizada por meio da execução da campanha, possibilitou além da orientação adequada sobre hábitos ocupacionais dos trabalhadores de postos de combustíveis, um maior conhecimento sobre a realidade apresentada pelas organizações e os sujeitos que as compõem. Como resultado de todo esse processo, o município de Marília, São Paulo, criou uma lei municipal com vistas à prevenção e controle da exposição dos trabalhadores dos postos de combustível ao risco químico do benzeno.
Conclusão: esse resultado demonstra que por meio da mediação da informação é possível desenvolver estratégias para a captura de novas informações e com isso, desenvolver ações que extrapolam as atividades de trabalho; afinal, graças ao processo de mediação informacional foi possível a construção de mecanismos legais capazes de proporcionar uma maior segurança aos trabalhadores dos postos de combustível, clientes e meio ambiente.

Palavras-chave: informação; mediação; saúde do trabalhador; benzeno; prevenção.


RESUMEN

Objetivo: el presente artículo tiene como objetivo relatar la experiencia del Centro de Referencia en Salud del Trabajador, regional de la ciudad de Marília, en el estado de São Paulo, como mediador informativo en el ámbito de la salud del trabajador, más específicamente en la campaña "¡No pase del límite! ¡Abastezca solo hasta el automático!", propuesta por el Gobierno del estado de São Paulo.
Métodos: durante la realización de la campaña se efectuó la mediación de informaciones laborales dirigidas a la salud de los trabajadores de los puestos de combustible y por medio de esta acción se levantaron los hábitos ocupacionales que fundamentaran la orientación a los profesionales en futuras acciones preventivas en el contexto de la salud de los trabajadores. Con el proceso de mediación de la información, junto a la observación del proceso laboral de los sujetos que actuaban en los puestos de combustibles, fue posible caracterizar los riesgos causados por el benceno a la salud de esos trabajadores ante las actividades desarrolladas. Los resultados obtenidos hasta el momento fueron analizados a la luz de la literatura disponible que versa sobre la salud del trabajador, la mediación de la información y los riesgos del benceno.
Resultados: el proceso de mediación informacional realizado por medio de la ejecución de la campaña posibilitó, además de la orientación adecuada sobre hábitos ocupacionales de los trabajadores de puestos de combustibles, un mayor conocimiento sobre la realidad presentada por las organizaciones y los sujetos que las componen. Como resultado de todo ese proceso, el município de Marília, São Paulo, creó una ley municipal con vistas a la prevención y control de la exposición de los trabajadores de los puestos de combustible al riesgo químico del benzeno.
Conclusión: este resultado demuestra que a través de la mediación informacional se pueden poner en práctica estrategias para el mejor desarrollo de las actividades laborales. Gracias al proceso de mediación informacional fue posible la construcción de mecanismos legales capaces de proporcionar una mayor seguridad a los trabajadores de los puestos de combustile, clientes y medio ambiente.

Palabras clave: información; mediación; salud del trabajador; benceno; prevención.


ABSTRACT

Objective: this article describes the experience of the Reference Center in Worker Health, regional of Marília city, in the state of São Paulo, as an informative mediator in the field of worker's health, more specifically in the campaign "Do not pass of the limit! Supply only up to automatic!", a proposal from the Government of the State of São Paulo.
Methods: during the campaign mediation a labor information was carried out, aimed at the health of the workers of the fuel stations, and through this action the occupational habits were lifted that will base the orientation to the professionals in future preventive actions in the context of workers' health. With the mediation process of the information aligned to the observation of the labor process of the subjects that act in the fuel stations, it was possible to characterize the risks caused by benzene to the health of these workers before the activities developed. The results obtained so far were analyzed in the light of the available literature that deals with worker health, mediation of information and risks of benzene. as a result of all this process, the municipality of Marília created a municipal law with a view to the prevention and control of the exposure of the workers of the fuel stations to the chemical risk of benzene.
Results: the informational mediation process carried out through the execution of the campaign made possible, in addition to the adequate guidance on occupational habits of fuel station workers, a greater knowledge about the reality presented by the organizations and the subjects that compose them.
Conclusions: this result shows that through the informational mediation some strategies were put into practice for the best development of work activities. With the informational mediation process the construction of legal mechanisms was possible, able to provide security to the workers of jobs combustile, customers and environment.

Key words: information; mediation; worker's health; benzene; prevention.


 

 

INTRODUÇÃO

A Constituição Federal Brasileira refere-se à saúde como um direito universal e dever do Estado.1 Nesse sentido, o Sistema Único de Saúde (SUS) foi criado contemplando diretrizes políticas que garantam o acesso dos cidadãos às informações que promovam prevenção, cura e reabilitação da saúde, e nesse contexto está a atenção à saúde dos trabalhadores. Entre as estratégias para efetivação da atenção integral à saúde do trabalhador, destaca-se a RENAST (Rede Nacional de Atenção Integral à Saúde do Trabalhador), que busca a integração de uma rede de serviços do SUS que se dedique à assistência e à vigilância aos trabalhadores, agindo prioritariamente através da notificação de agravos à saúde relacionados ao trabalho.2

Os Centros de Referência em Saúde do Trabalhador compõem uma das estratégias para a efetivação da RENAST, constituindo-se como centro articulador e organizador de seu território de abrangência, das ações intra e intersetoriais em Saúde do Trabalhador, assumindo uma função de retaguarda técnica e executando a função de polo irradiador de informações, ações e ideias de vigilância em saúde, de caráter sanitário e fundamentado em dados epidemiológicos.3

As atividades do Centro de Referência em Saúde do Trabalhador (Cerest), regional da cidade de Marília, estado de São Paulo, acontecem norteadas pelos denominados eventos sentinela. Outra importante atividade realizada pelo Cerest consiste no registro de notificações quando existem ocorrências de agravos relacionados à saúde do trabalhador.

Nesse sentido, o Cerest, dentro de suas muitas funções, atua também como entidade responsável por catalisar e registrar dados relacionados aos trabalhadores, processar estes dados, transformando-os em informações que são analisadas e disseminadas por meio de ações preventivas e curativas; sendo assim é o órgão responsável pela mediação da informação voltada para a saúde do trabalhador.

INFORMAÇÃO EM SAÚDE

Compreendem-se os órgãos da saúde como organizações responsáveis por realizar ações, processos e atividades voltadas à saúde. Capra4 aponta organização como "[...] uma totalidade integrada através de diferentes níveis de relações, sua natureza é dinâmica e suas estruturas não são rígidas, mas flexíveis e estáveis. Ela resulta das interações e interdependência de suas partes".

Nesse sentido, Choo5 aponta a informação como componente intrínseco a todos os afazeres organizacionais. Considerando as definições de Capra4 e Choo5, Targino6 sinaliza a informação como componente essencial das organizações voltadas para a saúde, atribuindo à informação um papel fundamental para as tomadas de decisão dentro das políticas públicas em saúde, elevando assim a qualidade de vida da população. A autora ainda aponta a função macro da informação no contexto da saúde, destacando o seu papel enquanto componente estratégico, nesse contexto:

A função macro da informação em saúde é detectar problemas individuais e coletivos do quadro sanitário de uma população, oferecer elementos que subsidiem a análise rigorosa desse quadro e, então, apresentar alternativas para minimizar a situação encontrada. Para isto, em termos ideais, abrange tanto informações relativas ao binômio saúde x doença como as de natureza administrativa.6

Santos, Pereira e Silveira7 mencionam que "A informação em saúde consiste em identificar características individuais e coletivas da saúde de uma população". Nesse mesmo sentido as informações em saúde são utilizadas na detecção de problemas e tomadas de decisões além de possuírem função preventiva. Braga8 corrobora essa afirmação e menciona que a informação em saúde deve ser compreendida como "[ ...] um redutor de incertezas, um instrumento para detectar focos prioritários, levando a um planejamento responsável e à execução de ações que condicionem a realidade às transformações necessárias".

Partindo do pressuposto de que esses órgãos são multidisciplinares, formados por profissionais de várias especialidades, podemos afirmar que a construção de novas informações na área da saúde ocorre devido à intersecção de conhecimentos e ações desses profissionais que ao se relacionarem de maneira direta ou indireta com as informações, constroem novas informações no contexto da saúde.

Ferreira, Caldas, Santos, Ribeiro, Chaves9 reforçam a participação dos profissionais nesse processo e os destacam como principais recursos para a construção e gestão da informação em saúde (produção, manuseio, guarda e recuperação, uso e disseminação). As autoras ainda afirmam que a qualidade da informação construída está diretamente relacionada ao compromisso desses profissionais sobre os processos informacionais.

Dessa maneira, cada profissional contribui com os seus conhecimentos prévios devidos à sua formação profissional e experiência pessoal, o que faz com que a mesma informação seja interpretada de diferentes maneiras dentro das inúmeras possibilidades existentes e ao ser disseminada e discutida, resulta em novas informações que retornam à organização. Além das informações retroalimentarem a organização que a constrói, a democratização da informação subsidia as políticas, planejamentos e o processo decisório de organismos externos que proporcionam apoio a essas organizações.7,10

Em suma, podemos considerar como informação em saúde toda informação concebida dentro do ambiente da saúde. Essa informação é desenvolvida em múltiplos ambientes da saúde, dessa maneira, a informação pode ser concebida no ambiente interno das organizações responsáveis por proporcionar saúde à sociedade ou em ambientes externos. Sendo assim, essas organizações, por meio de ações e atividades, são responsáveis por proporcionar saúde à sociedade.

O Cerest e suas relações com as informações em saúde

Segundo a Biblioteca Virtual em Saúde do Ministério da Saúde (BVSMS),11 o Centro de Referência em Saúde do Trabalhador (Cerest) é um local de atendimento especializado em Saúde do Trabalhador. Além de atender diretamente o trabalhador, serve como uma fonte geradora de conhecimento, ou seja, tem condição de indicar se as doenças ou os sintomas das pessoas atendidas estão relacionados com as suas atividades profissionais. Esses dados podem ser de extrema valia para serem utilizadas como diretrizes em negociações feitas pelos sindicatos e também para a formulação de políticas públicas.

O Cerest faz a prospecção e centralização das informações e, consequentemente, a geração de ações. Após a execução das ações, novas informações vão retroalimentar e servir como base na construção de novos conhecimentos que por sua vez serão transformadas em ações voltadas a saúde do trabalhador. Ainda segundo a BVMS,11 o Cerest possui as seguintes características: Unidade regional especializada no atendimento à saúde do trabalhador e está vinculado à Rede Nacional de Atenção Integral à Saúde do Trabalhador (Renast).

Observa-se que o Cerest regional Marília/SP está inserido na Renast, que por sua vez é responsável por integrar todas as informações de cerca de duzentos (200) Cerests no território nacional. Por meio da Renast é possível identificar problemas gerais ou localizados em estados ou regiões e propor ações com finalidade de minimizar riscos junto ao ambiente de trabalho.

A atuação do Cerest como mediador informacional em saúde do trabalhador

Partindo do pressuposto de que a informação possui o papel de intermediadora nas ações, Almeida Júnior12 destaca que a informação é um componente que nasce da intermediação entre o sujeito e os dados, sendo utilizada temporariamente como insumo nas ações do sujeito.Gomes e Varela13 complementam a ideia de Almeida Junior12 e apontam a mediação na área da saúde, pois para as autoras a mediação é um processo e ocorre por meio da "[...] inter-relação de dispositivos técnicos, humanos, ambientais e semiológicos que permitem o compartilhamento e a construção do conhecimento. Ao se discutir a mediação da informação, há de se considerar os vários mecanismos e estratégias de comunicação que visam atingir não apenas o receptor das informações, mas também desenvolver valores culturais, específicos, éticos e estéticos. A maneira como essa informação é oferecida e captada é de vital interesse para a socialização da informação médica".13

Ao relacionarmos a ideia de Almeida Junior12 e Gomes e Varela13 com o Cerest, enquanto organização, é possível identificar o Cerest como mediadora de informações do contexto da saúde do trabalhador. Peraya14 aponta que a ação comunicativa é parte do processo de mediação, afinal, enquanto processo pode favorecer o acesso e a apropriação da informação, mas para o seu desenvolvimento torna-se necessária a utilização de dispositivos de natureza técnica, semiológica e pragmática.

Nesse sentido o Cerest, por meio de um conjunto de ações, visa comunicar e, consequentemente, proporcionar informações do contexto da saúde dos trabalhadores através de eventos às empresas, ações voltadas à sociedade, entre outras. Durante essas ações, o Cerest e os trabalhadores recebem as informações, processam-nas e são capazes de transformá-las em novas ações e consequentemente modificam seus hábitos e o ambiente em que estão inseridos.

Destaca-se que, o Cerest de Marília/SP por meio de sua equipe multidisciplinar composta por 2 enfermeiras,1 engenheiro de segurança do trabalho, 3 fisioterapeutas, 1 fonoaudióloga, 2 médicos, 1 psicóloga, 1 terapeuta ocupacional, 1 técnico em segurança do trabalho, 1 técnica em enfermagem e 2 auxiliares de escrita constrói diversas ações e comunicações, onde cada profissional com suas competências e habilidades analisa e interpreta as situações e comunica a mesma informação sob a ótica de sua profissão, porém, sempre considerando o cenário dos trabalhadores.

O processo mencionado pela figura 1 representa o processo de emissor e receptor no processo de comunicação, porém, chama-se a atenção que "[...] somente pode ser compreendida se ambos dispuserem de um repertório comum de signos para que não sejam produzidas distorções. Obstáculos de codificação e decodificação também podem advir da instituição que transfere a informação. Há obstáculos de caráter técnico, provenientes das escolhas feitas no processo de representação e organização da informação; outros, de caráter sociopsicológico, provenientes das ações e interações entre usuários e especialistas e, finalmente, outros de caráter ideológico e político que permeiam os demais".13

Nesse momento podemos afirmar que a construção das informações voltadas para os trabalhadores parte de duas perspectivas: primeira, demandas dos governos nacional e estadual; e segunda, demandas regionais identificadas pelo próprio Cerest. Dessa maneira, a informação torna-se um recurso estratégico e passa a ser utilizada nas comunicações voltadas à saúde do trabalhador. Para tanto, torna-se necessário compreender as informações sobre o local e as atividades laborais dos trabalhadores, uma vez que devido a aspetos regionais, culturais, entre outros, podem existir diferenças. Nesse sentido, é sempre necessário prospectar, analisar, utilizar e gerenciar as informações, dados e a expertise de todos os profissionais atendidos pelo Cerest.

Entendendo a importância da informação no contexto da saúde, o Cerest, no primeiro semestre do ano de 2015, firmou uma parceria com o Grupo de Pesquisa, Informação, Conhecimento e Inteligência Organizacional (ICIO) da Universidade Estadual Paulista (Unesp), câmpus da cidade de Marília, no estado de São Paulo. O ICIO possui como missão: Desenvolver pesquisa básica e aplicada, atividades de ensino e extensão, objetivando contribuir para a construção e consolidação da área da Ciência da Informação.15

A parceria com o ICIO visa proporcionar uma maior valorização da informação nos ambientes de atuação do Cerest. Dessa maneira o ICIO por meio de suas atividades é responsável por proporcionar ferramentas e serviços informacionais permitindo assim que o Cerest faça um melhor uso da informação, em saúde.

CARACTERIZANDO O PROBLEMA

Na análise de riscos a que está exposta a população contida na área adscrita ao Cerest Regional Marília/SP, o risco químico sempre fora considerado, porém pouco contemplado nas fichas de notificação registradas; constata-se que o risco químico é um fator pouco contributivo —ou pouco notificado— para acidentes de trabalho.

Levantando-se os dados de 2014 sobre a exposição ao risco químico, no banco de dados do SINAN (Sistema Nacional de Agravos de Notificação) e no banco de dados municipal, realizado a partir das informações contidas na FINAT (Ficha de Notificação de Acidente do Trabalhador), encontramos as seguintes informações contendo agravos: apenas24 (vinte e quatro) agravos registrados no SINAN como relacionados ao trabalho, tiveram como agente causador a exposição a produtos químicos, porém nenhum destes registros teve o benzeno como agente, sendo listados outros agentes químicos.

No banco de registros de agravos à saúde do trabalhador da cidade de Marília, estado de São Paulo – base de dados da FINAT - observa-se que das 2 050 (duas mil e cinquenta) ocorrências registradas envolvendo trabalhadores (entre acidentes e doenças ocupacionais) somente 50 (cinquenta) notificações de acidentes ocorreram quanto a problemas com produtos químicos. Desses 24 % foram acidentes com exposição a cimento, 16 % foram exposição a produtos de limpeza, 12 % de exposição a produtos químicos não especificados e apenas 4 % envolvem exposição à gasolina, mas não há referência sobre benzeno especificamente. Além de poucas notificações relacionadas ao risco químico, a identificação de uma exposição ao benzeno não existe.

Esses resultados possibilitam a identificação de dois alertas: o primeiro, é quanto à subnotificação de acidentes de trabalho e o segundo alerta, refere-se à dificuldade de identificação do benzeno como uma substância química presente no cotidiano. Ainda que subnotificado, o contato com esta substância é confirmadamente prejudicial à saúde e precisa ser objeto de vigilância constante, pois o benzeno é uma substância química denominada hidrocarboneto aromático de "[...] grande utilização na sociedade, para a qual, atualmente, não antevemos possibilidade de substituição. Essa substância está presente na indústria do petróleo e em seus derivados (naftas, gasolinas, solventes e outros), sendo matéria-prima básica importante na indústria química para fabricação de vários produtos como plásticos, resinas, fibras, detergentes, corantes, pesticidas, entre outros [...] O benzeno aparece ainda como constituinte da fumaça do cigarro, nas emissões veiculares, principalmente nos que usam combustíveis à base de petróleo e na combustão de outros compostos orgânicos. Por isso, ainda que a exposição ocupacional e industrial seja a mais significativa no momento, a preocupação com relação à exposição ambiental da população a essa substância já começa a surgir.16

Ele é um líquido, volátil, de odor agradável, altamente inflamável e tóxico, que em caso de contato pode ser absorvido pelo corpo, principalmente pela respiração e pelo contato com a pele.16 A principal via de absorção do benzeno é o sistema respiratório, por ser mais difícil evitar a aspiração do produto disperso no ar, do que controlar sua penetração através da pele ou ingestão.

Quando ocorre a absorção por respiração, a maior parte do benzeno é eliminado pela expiração e a quantidade absorvida pela corrente sanguínea é acumulada em tecidos com alto teor lipídico. Além da forma de exposição, a absorção varia entre 10 a 50 % dependendo da dose, do metabolismo ou da quantidade de gordura presente no organismo. A forma do produto também influencia; em sua forma inalterada, apenas 0,1 % é eliminado na urina; a porção de benzeno que permanece no organismo é transformada principalmente no fígado e medula óssea, sendo eliminada pela urina na forma de metabólitos.

Embora a principal via de entrada do produto químico no organismo seja o sistema respiratório, a absorção pela pele, permite que o benzeno passe à corrente sanguínea, provocando os mesmos danos que a inalação, embora sua absorção não exceda 1 % da quantidade que é absorvida pela respiração. Outro ponto que demanda atenção é que a absorção pela pele é mais rápida quando há ferimento ou quando estiver presente em uma mistura, como ocorre na composição da gasolina, por exemplo.

Independente da forma de contato com a substância, o risco à saúde deve ser considerado por se tratar de uma substância cancerígena.17 Há quadros clínicos resultantes da exposição aguda e crônica. O quadro clínico da exposição aguda acontece quando existem altas concentrações de benzeno, podendo provocar sintomas como: sonolência e excitação, vertigem, tremores, convulsões, cefaleia, náuseas, taquicardia, dificuldade respiratória, perda da consciência e até mesmo morte. O quadro resultante da exposição crônica traz complicações a médio e longo prazo relacionadas principalmente ao sistema hematopoiético.

Como complicações, podemos citar a leucopenia com neutropenia como a principal repercussão hematológica da hipoplasia secundária ao benzeno. O desenvolvimento da leucemia mielóide aguda também é frequentemente relacionada ao benzeno; além destas, outras formas de adoecimento onco-hematológico também estão associadas à exposição crônica a esta substância, porém em menor frequência.18

Do risco à ação

Diante dos riscos à saúde decorrentes do contato com o benzeno, o Governo do Estado de São Paulo, via Vigilância Sanitária do Estado, solicitou que fosse realizada a campanha "Não passe do limite! Abasteça só até o automático!", como um instrumento aplicado em várias regiões do Brasil, com o intuito de promover o abastecimento consciente dos veículos, nos Postos de Combustível.

O Cerest de Marília/SP recebeu da Vigilância Sanitária do Estado um documento contendo instruções para o desenvolvimento da campanha. As informações detalhadas desse documento foram primordiais, pois elas nortearam a compreensão e as ações do Cerest acerca da campanha. Esse documento apresentou o objetivo da campanha, formas para a orientação dos trabalhadores de Postos de Combustível sobre os danos provocados à saúde quando executam as suas atividades laborais. A campanha objetivou também informar a população sobre os danos provocados aos trabalhadores no momento do abastecimento, e também aos veículos e ao meio ambiente. Esses danos ocorrem nos processos comuns, na rotina diária dos trabalhadores dos postos de gasolina, porém foi dado maior enfoque aos abastecimentos que ultrapassam o travamento automático da bomba, o popular, "completar o tanque até a boca".19

Destaque-se que o documento apontou riscos à saúde do trabalhador no que tange à composição de hidrocarbonetos da gasolina. Dessa maneira, dentre os riscos da exposição aos vapores durante as atividades laborais estão o câncer, prejuízos à fertilidade, danos ao sistema nervoso central, fígado e sistema sanguíneo. Além disso, o documento ainda menciona as consequências da exposição em um tempo reduzido, como: dor de cabeça, tontura, irritação de vias respiratórias, olhos e pele.

Assim, o Governo do Estado de São Paulo convocou através do documento supracitado, os dispositivos de vigilância à saúde, onde estão inclusos os Centros de Referência em Saúde do Trabalhador, para o lançamento da campanha quanto ao abastecimento consciencioso, em 16 de março de 2015. As ações foram iniciadas com panfletagem, no estado de São Paulo, no dia 18 de março de 2015. Além dessa atividade foram sugeridas outras como a realização de reuniões com proprietários de postos de combustível e sindicato dos trabalhadores.

 

MÉTODOS

A partir da convocação do Governo do Estado, a equipe do Cerest de Marília/SP executou a primeira etapa metodológica da ação: um levantamento bibliográfico de materiais técnico-científicos a respeito do benzeno indexados em bases de dados na internet. Dentre os textos encontrados ressalta-se o Protocolo de Risco Químico do Ministério da Saúde,18 a Consolidação da Legislação sobre o Benzeno da Confederação Nacional da Indústria,20 o artigo Alternativas e processos de vigilância em saúde do trabalhador relacionados à exposição ao benzeno no Brasil de Machado, Costa, Cardoso, Arcuri,21 a apostila, Benzeno não é flor que se cheire, de Arcuri,22 e principalmente o artigo de D'Lascio,23 Sintomas relacionados à exposição ocupacional ao benzeno e hábitos ocupacionais em trabalhadores de postos de revenda de combustíveis a varejo na região sul de Santa Catarina.

Através dos textos foi possível um aprofundamento no estudo dos mecanismos de ação do benzeno e os efeitos produzidos pela sua grande dispersão no abastecimento além do limite, efeitos estes que atingem principalmente os trabalhadores. Determinou-se que a população do estudo seriam os trabalhadores dos postos de combustíveis da cidade de Marília/SP. Para compreender qual o tamanho da população de trabalhadores, ou seja, da amostra, buscou-se o cadastro do Sindicato dos Empregados em Postos de Combustíveis de Marília/SP e região (SINDIPETRO). Por meio desses dados, foi identificada a existência de cento e dezessete (117) postos de combustíveis cadastrados na região de Marília/SP, sendo que destes, cinquenta (50) postos são sindicalizados.

Dos cinquentas (50) postos sindicalizados foi definida uma amostra de onze (11) postos de combustíveis para a aplicação de um questionário, com o intuito de conhecer melhor os hábitos dos trabalhadores e torná-los agentes disseminadores de informações. Esses onze (11) postos representam 9,5% dos postos de gasolina da cidade de Marília e 22 % dos postos sindicalizados.

Dessa forma, o Cerest mediou informações sobre os riscos do benzeno; em contrapartida, esses entrevistados concederam informações sobre suas atividades e dificuldades em seus processos laborais. O questionário foi composto de quinze (15) perguntas com respostas fechadas entre "sim", "não" ou "não faz" (quando a ação não está prevista na função). Tal questionário foi construído usando como base o questionário contido no artigo de D'Alascio, Menegali, Bornelli, Magajewski.23 A equipe do Cerest visitou onze (11) postos de combustível de Marília/SP, obtendo assim quarenta (40) questionários preenchidos no total. Na chegada a cada posto, o representante do SINDIPETRO apresentava a equipe aos trabalhadores; porém, o ponto de partida da ação nos postos consistiu em uma conversa com o proprietário e/ou gerente do posto, com o intuito de sensibilizá-los a respeito da campanha.

Nesse momento, os responsáveis apontavam a realidade dos trabalhadores e também algumas dificuldades enquanto gestores. Esses gestores foram orientados quanto aos hábitos mais saudáveis a serem desenvolvidos no ambiente de trabalho de seus postos de combustível. Após essa atividade, realizava-se contato com os demais profissionais, permitindo que os trabalhadores configurassem a forma de como ocorriam as suas rotinas, concedendo nesse momento respostas ao questionário.

Durante o preenchimento do questionário, também foram esclarecidas dúvidas preventivas, assim como justificativas para a necessidade de mudança de hábitos laborais já instalados ou reforçar a manutenção de hábitos saudáveis existentes. No momento das visitas também foram distribuídos adesivos que eram colados no uniforme dos profissionais da campanha, além da fixação de cartazes nas bombas de combustível com o intuito de informar os clientes. Com a conclusão das entrevistas, os dados obtidos fundamentaram a divulgação de orientações quanto às condições de trabalho e hábitos laborais dos trabalhadores dos postos.

 

RESULTADOS

Após a aplicação do questionário para quarenta (40) trabalhadores dos onze (11) postos de combustível da cidade de Marília/SP, foi possível compreender a realidade e fatores de suas rotinas. Das quinzes (15) questões que compõe o questionário, quatro delas questionam o uso de equipamentos de segurança nas atividades laborais dos sujeitos. Dentre essas questões, os sujeitos foram questionados se na medição manual do tanque no subsolo utilizam máscara respiratória para vapores orgânicos, luvas e óculos. Sendo assim, identificou-se que 35 % dos respondentes afirmaram não realizar tal atividade, 45 % mencionaram que não utilizam os materiais de segurança mencionados (máscara de seguranças, luvas e óculos) e apenas 20 % dos sujeitos assinalaram que utilizam os instrumentos de segurança.

Os sujeitos foram questionados quanto à utilização dos materiais de segurança durante a coleta de amostra de combustível do caminhão-tanque. O resultado apontou que 40 % dos sujeitos não realizam a atividade questionada, 37,50 % não utilizam os materiais de segurança necessários e apenas 22,50 % fazem uso dos óculos, máscara e luvas. Resultado semelhante apresentou a questão referente ao desabastecimento do caminhão para o tanque, sendo assim o resultado aponta que 42,50 % dos sujeitos não realizam esta atividade, 37,50 % não utilizam os instrumentos de proteção e apenas 20 % utilizam os materiais de segurança.

A troca de óleo é uma atividade realizada por três quartos dos entrevistados, ou seja, 75 %; quando questionados quanto ao uso de luvas para a realização destes procedimentos, 30 % mencionam que não utilizam as luvas, enquanto que 45 % afirmam utilizá-las. O questionamento quanto às vestimentas utilizadas no trabalho foi tema de duas questões, sendo que em ambas não houve apontamentos para a não realização da ação.

Nesse sentido, os sujeitos foram questionados se realizam a troca de roupa quando se molham com combustível, 50 % mencionaram que sim, enquanto que o mesmo percentual sinalizou que não. Quando questionados sobre o local de lavagem das suas roupas de trabalho, 100 % afirmaram que lavam as roupas em casa.

Dentre os questionamentos realizados, oito (8) buscaram compreender o comportamento dos sujeitos em suas atividades laborais. Os sujeitos foram questionados sobre o hábito de cheirar a tampa antes de abastecer para saber se é álcool ou gasolina; o resultado apontou que 47,50 % dos sujeitos da pesquisa possuem este hábito, enquanto que 52,50 % não possuem.

A aproximação do rosto do bocal de abastecimento é um hábito realizado por apenas 15 % dos sujeitos, sendo que os outros 85 % não possuem tal hábito. Todos os sujeitos (100 %) afirmaram que ao abastecerem utilizam o bico automático. Em contrapartida, 90 % dos sujeitos, após o abastecimento, arredondam o valor da bomba e apenas 10 % não realizam tal procedimento. O uso de flanela ou estopa é apontado por 57,50 % dos sujeitos entrevistados enquanto que 42,50 % mencionam que não utilizam tais materiais para o abastecimento.

O hábito de aspirar combustível com mangueira é realizado por apenas 7,50 % dos sujeitos, enquanto que os demais (92,50 %) não possuem esse hábito. Outro hábito nocivo à saúde desses sujeitos consiste em lavar as mãos com gasolina. Apenas 5 % mencionaram que realizam esse procedimento, sendo que os demais, ou seja, 95 % não possuem esse hábito.

Duas outras questões buscaram compreender os hábitos dos clientes e das empresas que empregam esses trabalhadores. Quanto aos hábitos dos clientes, os sujeitos foram questionados se os mesmos solicitam o enchimento do tanque até a "boca". O resultado apresentou que 85 % dos clientes solicitam tal procedimento. A realização de exame sanguíneo, a pedido da empresa, com frequência (a cada 06 meses) foi foco do questionamento que buscou compreender o comportamento da empresa frente ao acompanhamento da saúde do trabalhador; destes, 62,50 % dos sujeitos mencionaram quem não realizam o exame, sendo assim, apenas 37,50 % realizam tal ação. Esses resultados demonstram a importância de uma discussão sobre os comportamentos e hábitos dos sujeitos que trabalham nos postos, consumidores e proprietários.

 

DISCUSSÃO

Nos resultados apresentados observou-se que é consenso entre os profissionais participantes da pesquisa o uso do "bico automático", porém, existe um hábito estabelecido pelos postos e/ou consumidores de solicitar que o profissional encha o tanque "até a boca". A justificativa para o hábito é a facilidade no momento da cobrança, o "arredondamento" do valor, facilitando o pagamento e o troco, ou ainda, para a realização de médias de consumo do carro.

Essa situação consiste em um hábito que pertence a cultura dos consumidores e dos profissionais dos postos de combustíveis. O desconhecimento dos prejuízos desse hábito pelos profissionais dos postos e consumidores os colocam em contato com o benzeno e automaticamente em risco.

Quanto aos hábitos positivos já instalados na rotina dos trabalhadores, responsáveis por colaborar para diminuição dos riscos à saúde, foi identificado que 95 % não utilizam gasolina para limpar as mãos; 90 % não aspiram combustível com a boca e 85 % não aproximam o rosto do bocal, no momento do abastecimento. Esses hábitos positivos demonstram a existência de uma mudança de cultura instalada nos postos por meio de seus profissionais, afinal, estes já foram hábitos frequentes na rotina desses trabalhadores.

Quanto aos hábitos que devem ser modificados para agir preventivamente sobre os riscos e adoecimentos relacionados à saúde dos trabalhadores, levantamos 3 (três) pontos críticos: 1) todos os trabalhadores lavam suas roupas de trabalho em casa, não ocorrendo a separação da roupa de trabalho das vestimentas dos demais familiares. Chama-se a atenção para esse hábito, uma vez que existe a contaminação em caso de lavagem dos uniformes de trabalho com roupas de outros integrantes da família; 2) chega a 62,5 % da amostra o número de profissionais que não realizam exames médicos periódicos, afirmando que só realizaram o exame admissional, apontando para o descumprimento da Norma Regulamentadora No. 07 do Ministério do Trabalho,24 legislação vigente, que prevê a realização de exames periódicos, uma vez que esses trabalhadores estão expostos a uma série de riscos; 3) o uso de pano, flanela ou estopa no abastecimento dos veículos foi apontado por 57,5 % dos entrevistados, sendo essa uma forma de contato do trabalhador com o combustível.

O questionário permitiu maior conhecimento sobre os hábitos dos trabalhadores, estabelecendo assim uma maior proximidade com a realidade laboral nos postos de combustível, trazendo com isso uma maior visibilidade para o fato de que os trabalhadores estão expostos ao contato e riscos provocados pelo benzeno. Com o conhecimento da realidade dos postos, por meio da ação desenvolvida pela equipe, o Cerest recebeu importantes informações para realizar orientações quanto a hábitos mais saudáveis a serem executados nas rotinas, assim como também foi possível conhecer os modos operatórios mais seguros, comunicados pelos próprios trabalhadores no momento das entrevistas.

As ações realizadas pelo Cerest, nessa primeira etapa da campanha, foram norteadas pela concepção veiculada na Política Nacional de Saúde do Trabalhador (PNST), a qual aponta que o objetivo das práticas em Saúde do Trabalhador consiste no fortalecimento da vigilância, especialmente por meio do trabalho intersetorial, sendo estas ações realizadas conjuntamente com as vigilâncias sanitárias (Municipal e Estadual) e os membros sindicais.

Também buscou-se identificar e dar visibilidade às atividades laborais que tragam risco à saúde dos trabalhadores, no território de Marília. A ação possibilitou, ainda que minimamente, o reconhecimento das necessidades, demandas e situação dos trabalhadores dos postos de combustível, promovendo intervenção no processo de trabalho, ações recomendadas pelo Ministério da Saúde.25 Percebeu-se também, a importância do trabalhador como ator central na compreensão dos processos e ambientes de trabalho; dessa maneira, esse sujeito torna-se fundamental na interpretação das relações entre trabalho, saúde, doença voltadas para a realização de ações preventivas e curativas.

 

CONSIDERAÇÕES PARCIAIS

A experiência do presente artigo destaca a atuação da equipe do Cerest de Marília como mediadora de informações preventivas na saúde do trabalhador. O Cerest possui como bases para construção de suas ações, as informações e diretrizes fixadas pelas legislações que compõem a Política Nacional de Saúde do Trabalhador (PNST). Os processos de construção de ações são pautadas por diversos vetores que agem na composição da experiência mencionada.

Um dos vetores ocorreu por meio da solicitação do Governo do Estado de São Paulo com a inserção da Campanha "Não passe do limite! Abasteça só até o automático"; outro vetor identificado foi a intersetorialidade, afinal, a campanha efetivou-se com a presença da equipe do Cerest, vigilâncias sanitárias (municipal e estadual) e sindicatos.

Com a efetivação da campanha ocorreu o processo de mediação da informação preventiva em saúde do trabalhador, pois a ação potencializou a efetividade da comunicação realizada aos trabalhadores. A partir desse momento também foi possível reconhecer e utilizar as informações capturadas nos postos sobre as atividades laborais dos trabalhadores. Esse processo resultou na construção de novas informações no contexto da saúde do trabalhador, retroalimentando assim todas as atividades do Cerest.

Essas são apenas as primeiras conclusões da presente experiência, pois a equipe do Cerest Marília/SP compreende sua atuação no que tange ao cuidado da saúde do indivíduo como algo além de construir um objeto e intervir sobre ele. Para o Cerest, a atitude de "[...] cuidar não pode ser apenas uma pequena e subordinada tarefa parcelar das práticas de saúde. A atitude 'cuidadora' precisa se expandir mesmo para a totalidade das reflexões e intervenções no campo da saúde".26 Esse é apenas o início de uma complexa prática em saúde, pois deve-se considerar a importância das atividades com o uso da informação sob o olhar preventivo no âmbito da saúde do trabalhador.

Novas informações foram construídas mediante a troca de informações (ações/comunicações) entre os trabalhadores e o Cerest. Isso resultou em uma maior visibilidade aos fatos ocorridos nos postos de combustível, gerando assim bases para negociações com proprietários, visando a uma maior segurança dos trabalhadores. Dessa forma, com base nas informações capturadas e construídas pelo processo de mediação informacional (Ação/Comunicação) realizada pela equipe do Cerest, em 14 de março de 2015, foi apresentado à Câmara Municipal de Marília o Projeto de Lei No. 28/2015, proibindo, no âmbito do Município de Marília, que os postos de combustível permitam preencher o tanque após o travamento automático da bomba de abastecimento.

Após apresentação do Projeto de Lei pelo Cerest, no dia 19 de maio de 2015, foi publicado no Diário Oficial de Marília a Lei 7 800/2015 que "proíbe, no âmbito do município de Marília, que os postos de combustíveis permitam preencher o tanque de combustível dos veículos, após o travamento automático da bomba de abastecimento".27

Segundo o Artigo 1º da Lei publicada, "Fica proibido no âmbito do Município de Marília, que todos os postos de combustíveis permitam preencher o tanque de combustível dos veículos após o travamento automático de segurança da bomba de abastecimento".27 Já o Artigo 2º determina punição para quem descumprir "O descumprimento do disposto na presente Lei implicará na imposição de multa no valor de R$ 1 000,00 (mil reais), aplicados em dobro no caso de reincidência".28 Os valores resultantes da multa serão recolhidos pelo Município e utilizados em campanhas de natureza preventiva na área de meio ambiente.

Sendo assim, o processo de mediação informacional e construção de novas informações realizadas pelo Cerest, por meio das ações de comunicações resultou na construção de um novo instrumento preventivo em formato de Projeto de Lei municipal. Esse resultado demonstra que por meio da mediação da informação é possível desenvolver estratégias para a captura de novas informações e com isso, desenvolver ações que extrapolam as atividades de trabalho; afinal, graças ao processo de mediação informacional foi possível a construção de mecanismos legais capazes de proporcionar uma maior segurança aos trabalhadores dos postos de combustível, clientes e meio ambiente.

Recomenda-se que outras pesquisas sejam realizadas nas múltiplas relações e atividades de mediação, monitoramento informacional e construção e gestão do conhecimento no contexto da saúde do trabalhador, visando comprovar a importância e potencialidade da informação e do conhecimento no ambiente explorado pelo presente trabalho.

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

1. do Brasil SF. Constituição da república federativa do Brasil. Brasília: Senado Federal, Centro Gráfico; 1988.

2. Lei nº 8.080, de 19 de setembro de 1990. Dispõe sobre as condições para a promoção, proteção e recuperação da saúde, a organização eo funcionamento dos serviços correspondentes e dá outras providências. Brasil: Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil; 1990.

3. Braga Júnior D. Rede Nacional de Atenção Integral à Saúde do Trabalhador-Manual de Gestão e Gerenciamento. São Paulo: Hemeroteca Sindical Brasileira; 2006.

4. Capra F. Ponto de Mutação, O. São Paulo: Editora Cultrix; 2002.

5. Choo CW. A organização do conhecimento: como as organizações usam a informação para criar significado, construir conhecimento e tomar decisões. Senac São Paulo; 2003.

6. Targino MG. Informação em Saúde: potencialidades e limitações. Inf Inf. 2009 [citado 17 de julio de 2018];14(1):52-81. Disponível em: http://www.uel.br/revistas/uel/index.php/informacao/article/view/1845

7. Santos TO, Pereira LP, Silveira DT. Implantação de sistemas informatizados na saúde: uma revisão sistemática. RECIIS. 2017[citado 17 de julio de 2018];11(3). Disponível em: http://hdl.handle.net/10183/178198

8. Braga ALS. O cotidiano da prática do enfermeiro de rede básica de saúde: reflexões/ações sobre a informação para a tomada de decisão [Tese]. Rio de Janeiro: Universidade Federal Fluminense - UFF; 2017.

9. Ferreira J, Caldas D, Santos L, Ribeiro L, Chaves L. Aspectos da regulação em saúde na visão de equipes de saúde da família de um município de pequeno porte. Rev Bras Med Fam Comunid. 2017 [citado 17 de julio de 2018];11(38):1-12. Disponível em: https://www.rbmfc.org.br/rbmfc/article/view/1188

10. Pinheiro AL, Martins AF, Pinto IC, de Oliveira Silva D, Zacharias FC, Gomide MF. Utilização dos sistemas de informação: desafios para a gestão da saúde/The use of information systems: challenges for health management. Ciênc, Cuid Saúde. 2015 [citado 17 de julio de 2018];14(3):1307-14. Disponível em: https://www.10.4025/cienccuidsaude.v14i3.24356

11. Ministério da Saúde. Biblioteca Virtual em Saúde do Ministério da Saúde: Centro de Referência em Saúde do Trabalhador - Cerest. Brasília: Ministério da Saúde; 2007 [citado 17 de julio de 2018]. Disponível em: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/dicas/116cerest.html

12. Almeida Júnior OF. Mediação da informação e múltiplas linguagens. Tendências da Pesquisa Brasileira em Ciência da Informação. 2009 [citado 17 de julio de 2018];2(1): 89-103. Disponível em: http://www.brapci.inf.br/_repositorio/2010/01/pdf_9aa58ba510_0007871.pdf

13. Gomes HF, Varela AV. Mediação da informação na área da medicina: possibilidades de interlocução entre os saberes científico, profissional e sócio-cultural. Perspectivas em Ciência da Informação. 2016 [citado 17 de julio de 2018];31;21(1):3-22. Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/pci/v21n1/1413-9936-pci-21-01-00003.pdf

14. Peraya D. Médiation et médiatisation: le campus virtuel. Hermès, La Revue. 1999 [citado 17 de julio de 2018];(3):153-67. Disponível em: https://www.cairn.info/article.php?ID_ARTICLE=HERM_025_0153

15. ICIO - Grupo de Pesquisa, Informação, Conhecimento e Inteligência Organizacional. Missão, Marília: Universidade Estadual Paulista "Julio de Mesquita Filho" (UNESP); 2018 [citado 17 de julio de 2018]. Disponível em: http://gicio.valentim.pro.br/missao/

16. Yasuda N. Experiência do controle do uso de benzeno no Brasil. In: Gomez CM, Vasconcellos LCF. Controle Social na Saúde do Trabalhador. Rio de Janeiro: Cursos à distância relacionados a saúde pública; 2009. p. 155-67.

17. Arcuri ASA. Efeitos da exposição ao benzeno para a saúde. São Paulo: Fundacentro; 2012.

18. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde da Brasil. Departamento de Ações Programáticas Estratégicas. Risco químico: atenção à saúde dos trabalhadores expostos ao benzeno. Ministério da Saúde; 2006 [citado 17 de julio de 2018]. Disponível em: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/risco_saude_trabalhadores_expostos_benzeno.pdf

19. Secretaria de Saúde do Estado de São Paulo. Coordenadoria de Controle de Doenças Centro de Vigilância Sanitária. "Não passe do limite! Complete o tanque só até o automático". Secretaria da Saúde do Estado de São Paulo; 2015.

20. Confederação Nacional da Indústria. Consolidação da legislação sobre o benzeno. Brasília: CNI/SESI; 2012.

21. Machado JMH. Alternativas e processos de vigilância em saúde do trabalhador relacionados a exposição ao benzeno no Brasil. Ciência & Saúde Coletiva. 2003;8(4):913-21.

22. Machado JM, Costa DF, Cardoso LM, Arcuri A. Alternativas e processos de vigilância em saúde do trabalhador relacionados à exposição ao benzeno no Brasil. Ciência & Saúde Coletiva. 2003 [citado 17 de julio de 2018];8(4):913-21. Disponível em: https://www.scielosp.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1413-81232003000400014

23. Arcuri ASA. Benzeno não é Flor que se Cheire. São Paulo: Comissão Nacional Permanente do Benzeno; 2003.

24. D'Alascio RG, Menegali M, Bornelli AS, Magajewski F. Sintomas relacionados à exposição ocupacional ao benzeno e hábitos ocupacionais em trabalhadores de postos de revenda de combustíveis a varejo na região sul de Santa Catarina. Rev Bras Med Trab. 2014 [citado 17 de julio de 2018];12(1):21-9. Disponível em: http://www.anamt.org.br/site/upload_arquivos/revista_brasileira/

25. Brasil. Ministério do Trabalho. Portaria No. 3 214, de 8 de junho de 1978. Aprova as normas regulamentadoras -NR- do capítulo V, título II, da consolidação das leis do trabalho, relativas a Segurança e Medicina do trabalho. Brasília: Diário Oficial da União; 6 de julio de 1978.

26. Brasil. Ministério da Saúde. Portaria No. 1 823. Institui a Política Nacional de Saúde do Trabalhador e da Trabalhadora. Brasília: Diário Oficial da União; 22 de agosto de 2012.

27. Ayres JR. Sujeito, intersubjetividade e práticas de saúde. Rio de janeiro: Ciência & Saúde Coletiva. 2001 [citado 17 de julio de 2018]. Disponível em: https://www.scielosp.org/scielo.php?pid=S1413-81232001000100005&script=sci_arttext

28. Lei Municipal 7 800. Proíbe no âmbito do município de Marília, que os postos de combustíveis permitam preencher o tanque de combustível dos veículos, após o travamento automático da bomba de abastecimento. Brasil: Diário Oficial Municipal Marília; 20 de mayo de 2015.

 

 

Recibido: 29 de mayo de 2018.
Aprobado: 3 de agosto de 2018.

 

 

Creative Commons License Todo el contenido de esta revista, excepto dónde está identificado, está bajo una Licencia Creative Commons